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O setor espacial brasileiro
José Monserrat Filho

Objetivos científicos no espaço
Dr. Luiz Gylvan Meira Filho

O Brasil na Estação Espacial
Marcos César Pontes

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Objetivos científicos no espaço

O Dr. Luiz Gylvan Meira Filho, presidente da Agência Espacial Brasileira, é engenheiro eletrônico, formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA/CTA), e Doutor em Astrogeofísica pela Universidade do Colorado (EUA). Nesta entrevista, ele fala da importância da participação do Brasil nos projetos espaciais, do retorno dos investimentos em tecnologia espacial e das expectativas em torno do projeto da Estação Espacial Internacional.

Com Ciência - Que atividades os tripulantes da Estação Espacial Internacional (ISS, em inglês) irão desempenhar lá?
Dr. Luiz Gylvan Meira Filho -
Além do pilotar a nave espacial que vai chegar até a ISS, a tripulação vai realizar experimentos científicos e tecnológicos nas áreas de biotecnologia, biologia gravitacional (a influência da ausência de gravidade na biologia do ser humano), experimentos de Física, comportamento dos fluídos na ausência de gravidade, Física de Baixa Temperatura, combustão e confecção de novos materiais.

Com Ciência - Que tipos de experimentos científicos são feitos no espaço que não podem ser feitos na Terra?
Dr. Gylvan -
Certos fenômenos físicos se comportam de modo completamente diferente na ausência de gravidade. Por exemplo, certos cristais se formam de maneira diferente em um ambiente de microgravidade. Isso abre certas perspectivas, principalmente na área médica, como os cristais de proteínas para o desenvolvimento de vacinas. No caso da Astronomia há a vantagem de se estar fora da atmosfera e poder visualizar os astros de maneira mais nítida. Além disso, os tripulantes podem obter imagens diferentes das conseguidas por satélites, por serem selecionadas por pessoas e não por máquinas.

Com Ciência - Já há algum resultado desse tipo de pesquisa que faça parte do cotidiano das pessoas?
Dr. Gylvan -
Na parte da observação da Terra, as observações que se faz do que está acontecendo na Amazônia são um bom exemplo da aplicação desses conhecimentos. Há diversos materiais que já foram desenvolvidos graças a esses experimentos e que afetam a vida das pessoas, por exemplo, crescimento de cristais em ambiente de microgravidade e sua aplicação no desenvolvimento de medicamentos.

Com Ciência - Qual a vantagem de se enviar seres humanos a uma estação espacial? O que eles podem fazer lá que não poderia ser feito por máquinas?
Dr. Gylvan -
Embora hoje tenhamos computadores avançados, o cérebro humano é ainda, felizmente, completamente insubstituível na capacidade de julgamento, de pensamento racional. Há filmes de ficção científica, como 2001: Uma Odisséia no Espaço, de Arthur Clark, em que um computador criou vida, mas isso só acontece em ficção científica; na realidade os computadores são incapazes de fazer julgamento. A maravilhosa capacidade do cérebro humano de selecionar informações e fazer julgamentos não pode ser feito por máquinas.

Com Ciência - Qual a vantagem de se enviar seres humanos para Marte? O que eles poderiam fazer lá que não poderia ser feito por máquinas?
Dr. Gylvan -
Conhece-se muito pouco do que existe em Marte. Muitas análises sobre esse planeta são impossíveis de serem feitas por máquinas. Pode-se programar um daqueles robozinhos para colher amostras, trazer para a Terra e, dependendo dos resultados dos materiais, pode-se fazer outras análises. Por outro lado, se houver um ser humano em Marte, ele fará imediatamente essas análises. Marte é um mundo novo cheio de surpresas, desconhecido. Por isso, deve haver um homem que decida na hora o que deverá ser feito.

Com Ciência - De 1969 a 1972 foram feitas seis viagens tripuladas à Lua. Porque nenhuma outra foi realizada desde 1972?
Dr. Gylvan
- Aquela época correspondeu a um ciclo de exploração. A tecnologia foi desenvolvida, o investimento foi realizado e, por isso, não havia sentido em realizar apenas uma viagem. Além disso, para analisar todas as informações colhidas nessas viagens levou-se muito tempo. As pesquisas não pararam, foi apenas um período de avaliação e reflexão para planejar a nova série de experimentos. Há um objetivo mais ambicioso de ir a Marte, mas dentro do mesmo programa. Com a construção de foguetes que podem ir a Marte, também haverá viagens à Lua.

Com Ciência - Qual o retorno para o Brasil em termos de transferência de tecnologia, com a participação brasileira na ISS, já que a Embraer contrata terceiros para construir o hardware que o Brasil tem que fornecer?
Dr. Gylvan
- A Embraer contrata terceiros por questão de bom senso econômico. Muitos equipamentos que possuímos, como os computadores, mesmo que sejam de uma empresa norte-americana, possui peças que são feitas em outros países. Os aviões da Embraer, uma indústria nacional, trazem, também, diversos componentes que são fabricados em outros países. Isso não torna esses aviões menos brasileiros. O importante é a capacidade que o Brasil tem de projetar, fazer funcionar e garantir que funcione e não, especificamente, fabricar todas as peças do equipamento. Ao fazer isso, ela estará gerando empregos e mão-de-obra qulaificada.

Com Ciência - Qual a importância para o Brasil da participação da iniciativa privada em projetos espaciais?
Dr. Gylvan
- A empresa privada absorve a tecnologia desenvolvida nos institutos de pesquisa e a emprega em muitas coisas e até mesmo em produtos de consumo. Um exemplo notável no CTA é de uma tecnologia desenvolvida para o VLS - nosso foguete lançador de satélite -, que está sendo aplicada na área médica para construir equipamentos eletrônicos para a medicina.

Com Ciência - Quais os benefícios e a importância para o Brasil de enviarmos um astronauta à Estação Espacial?
Dr. Gylvan
- Há vários aspectos. Um deles é que ninguém sabe o que será encontrado nessas explorações espaciais. O Brasil, ao participar desse projeto, garante os ganhos que se terá em termos de conhecimento e de tecnologia.

Com Ciência - Como o Brasil vem preparando recursos humanos (formação de pesquisadores e profissionais) na área de tecnologias espaciais?
Dr. Gylvan
- O Brasil tem grandes escolas de engenharia, como o Instituto Tecnológico de Aeronáutica, o Instituto Militar de Engenharia, a Universidade de São Paulo, a Universidade de Campinas e a Universidade Federal de Santa Catarina, que são os melhores departamentos de engenharia do Brasil. A Agência Espacial Brasileira tem fornecido recursos para incentivar essas boas escolas de engenharia a formarem os engenheiros que, futuramente, irão trabalhar na área espacial.

Com Ciência - Qual a importância econômica do investimento brasileiro em tecnologias espaciais?
Dr. Gylvan
- De todas as tecnologias de ponta, a espacial é a que, historicamente, tem rendido maior benefício econômico. O investimento na área espacial traz benefícios de duas formas. Os benefícios diretos, ligados à geração de novos produtos, e os chamados indiretos, que são os ganhos advindos da capacitação industrial.

Com Ciência - Qual é a visão da AEB sobre as notícias que foram veiculadas recentemente sobre o aumento do orçamento projetado para a participação brasileira na ISS?
Dr. Gylvan
- Não houve aumento do orçamento projetado. Saíram notícias na Gazeta Mercantil de que alguns fabricantes estavam estimando que fazer os aparelhos que o Brasil vai construir custaria mais caro que o originalmente previsto. Eu falei pessoalmente com a diretoria da Embraer e eles disseram que isso não é verdade e que é um pouco de propaganda de fornecedores, que nem foram contratados ainda, que gostariam de ser contratados e que ficam colocando essas notícias no jornal, para ver se a Embraer paga mais para eles. Aliás, eu acho lamentável que a imprensa pegue essas fofocas e as divulgue. A estimativa feita pela NASA é de que a ordem de grandeza desses custos é de US$ 120 milhões. É isso.

Com Ciência - Além da Estação Espacial, quais os projetos espaciais mais importantes dos quais o Brasil participa?
Dr. Gylvan
- Com certeza, em termos de visibilidade, o desenvolvimento do Veículo Lançador de Satélite Nacional - o VLS-1 - é o aspecto mais importante do programa espacial brasileiro, não só pelo porte, mas pelo significado, pois apenas nove países do mundo já conseguiram colocar um satélite em órbita da Terra e o Brasil será o décimo. O grande satélite chinês e brasileiro, um satélite enorme, de uma tonelada e meia, e que está tirando fotos da Terra, é um grande orgulho da capacidade da engenharia brasileira. Esse satélite tem a mesma qualidade dos satélites norte-americanos e isso não é um feito pequeno para um país em desenvolvimento como o Brasil. De modo diferente, o Centro de Lançamento de Alcântara tem um potencial de primeira linha no cenário internacional, inclusive com a possibilidade de uso para fins comerciais.

Com Ciência - Qual a visão da Agência Espacial Brasileira a respeito da posição contrária da SBPC em relação ao acordo Brasil-Estados Unidos para a Base de Alcântara?
Dr. Gylvan
- A SBPC disse que gostaria de participar mais do debate sobre a política espacial brasileira, incluindo o uso comercial de Alcântara. O governo está completamente de acordo e está sendo organizado um debate no dia 16 de fevereiro em Brasília, atendendo a essa solicitação. Nessa ocasião haverá um debate sobre os vários aspectos do programa espacial brasileiro. É evidente que em um programa tão abrangente existam opiniões diferentes.

Atualizado em 10/02/01

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