Atlas
Lingüístico do Brasil (Projeto ALiB)
Suzana
Cardoso
Jacyra Mota
O
Projeto ALiB - Empreendimento de grande amplitude, de caráter
nacional, em desenvolvimento, o Projeto Atlas Lingüístico
do Brasil (Projeto ALiB) tem por meta a realização
de um atlas geral no Brasil no que diz respeito à língua
portuguesa. Desejo que permeia a atividade dialetal no Brasil, pelo
menos desde 1952, ganha corpo nesse final/começo de milênio,
a partir de iniciativa de um grupo de pesquisadores do Instituto
de Letras. Mais uma vez a UFBA assume atitude pioneira ao empreender
a concretização dessa proposta que se realiza como
projeto conjunto que envolve mais quatro Universidades - Universidade
Federal do Ceará, Universidade Federal de Juiz de Fora, Universidade
Federal de Rio Grande do Sul e Universidade Estadual de Londrina,
às quais vêm-se filiando outras instituições
universitárias brasileiras.
A retomada da idéia de realização de um atlas
lingüístico nacional foi aprovada, em novembro de 1996,
por ocasião da realização em Salvador, sob
os auspícios do Instituto de Letras da UFBA, do Seminário
Caminhos e Perspectivas para a Geolingüística no
Brasil, realizado com a participação de pesquisadores
da área de diferentes regiões brasileiras e com o
assessoramento do Prof. Michel Contini, da Universidade de Grenoble.
Coordenação
- O Projeto ALiB é coordenado por um Comitê Nacional
constituído por um Diretor Presidente - Suzana Alice Marcelino
Cardoso (UFBA) -, um Diretor Executivo - Jacyra Andrade Mota (UFBA),
e quatro Diretores Científicos - Maria do Socorro Silva Aragão
(UFPB/UFC), Mário Roberto Lobuglio Zágari (UFJF),
Vanderci de Andrade Aguilera (UEL) e Walter Koch (UFRS), indicados
pela coletividade reunida no citado Seminário e com o seguinte
critério na sua composição: contempla a representação
de autores dos cinco atlas lingüísticos regionais brasileiros
publicados - Atlas Prévio dos Falares Baianos, Esboço
de um atlas lingüístico de Minas Gerais, Atlas lingüístico
da Paraíba, Atlas lingüístico de Sergipe, Atlas
lingüístico do Paraná - e de um representante
dos atlas em andamento.
Objetivos
- O Projeto ALiB fundamenta-se nos princípios gerais da Geolingüística
contemporânea, priorizando a variação espacial
ou diatópica e atento às implicações
de natureza social de que não se pode, no estudo da língua,
deixar de considerar, com objetivos bem definidos e assim consubstanciados:
1. Descrever a realidade lingüística do Brasil,
no que tange à língua portuguesa, com enfoque prioritário
na identificação das diferenças diatópicas
(fônicas, morfossintáticas, léxico-semânticas
e prosódicas) consideradas na perspectiva da Geolingüística.
2. Oferecer aos estudiosos da língua portuguesa (lingüistas,
lexicólogos, etimólogos, filólogos, etc.),
aos pesquisadores de áreas afins (história, antropologia,
sociologia, etc.) e aos pedagogos (gramáticos, autores de
livros-texto, professores) subsídios para o aprimoramento
do ensino/aprendizagem e para uma melhor interpretação
do caráter multidialetal do Brasil.
3. Estabelecer isoglossas com vistas a traçar a divisão
dialetal do Brasil, tornando evidentes as diferenças regionais
através de resultados cartografados em mapas lingüísticos
e de estudos interpretativos de fenômenos considerados.
4. Examinar os dados coletados na perspectiva de sua interface
com outros ramos do conhecimento - história, sociologia,
antropologia, etc. - de modo a poder contribuir para fundamentar
e definir posições teóricas sobre a natureza
da implantação e desenvolvimento da língua
portuguesa no Brasil.
5. Oferecer aos interessados nos estudos lingüísticos
um considerável volume de dados que permita aos lexicógrafos
aprimorarem os dicionários, ampliando o campo de informações;
aos gramáticos atualizarem as informações com
base na realidade documentada pela pesquisa empírica; aos
autores de livros didáticos adequarem a sua produção
à realidade cultural de cada região; aos professores
aprofundar o conhecimento da realidade lingüística,
refletindo sobre as variantes de que se reveste a língua
portuguesa no Brasil e, conseqüentemente, encontrando meios
de, sem desprestigiar os seus dialetos de origem, levar os estudantes
ao domínio de uma variante tida como culta.
6. Contribuir para o entendimento da língua portuguesa
no Brasil como instrumento social de comunicação diversificado,
possuidor de várias normas de uso mas dotado de uma unidade
sistêmica.
Aspectos
metodológicos - Com tal concepção, buscou-se
o caminho de uma metodologia que permitisse alcançar o alvo
colimado, para o conhecimento da qual se destacam: a rede de pontos,
o perfil dos informantes, os questionários lingüísticos
e a realização de inquéritos lingüísticos
experimentais.
Rede
de pontos - Para recobrir todo o país estabeleceu-se
uma rede constituída de 250 localidades, distribuídas
por todo o território nacional, levando-se em consideração
a extensão de cada região, os aspectos demográficos,
culturais , históricos e a natureza do processo de povoamento
da área. Diferente do que tem sido feito tradicionalmente
em trabalhos de natureza dialetal, não se consideram prioritários
critérios como antigüidade e grau de isolamento com
relação a centros mais desenvolvidos na região,
incluindo-se, assim, cidades de grande e médio porte e, inclusive,
todas as capitais, à exceção apenas de Brasília
(Distrito Federal) - em vista da data de sua criação
- e Palmas, capital do recém-criado Estado de Tocantins,
cidade ainda em formação, sem habitantes nela nascidos.
Foram, ainda, consideradas questões referentes aos limites
internos e internacionais e analisados os pontos sugeridos por Antenor
Nascentes em Bases para a elaboração do Atlas Lingüístico
do Brasil (Rio de Janeiro: MEC, Casa de Rui Barbosa, v. I, 1958),
os quais, reconhecida a pertinência, foram mantidos.
Informantes
- O perfil dos informantes procura atender a questões espaciais,
por isso são filhos da localidade pesquisada e de pais também
da área, mas também inclui o controle de variáveis
sociais tais como idade, sexo e escolaridade. O número total
atinge a casa dos 1104 informantes, distribuídos eqüitativamente
por duas faixas etárias - 18 a 30 anos e 50 a 65 anos - e
contemplando os dois sexos. Nas capitais de Estado são acrescentados
mais quatro informantes de nível universitário, observadas
as mesmas correlações de sexo e faixa etária.
Quanto à escolaridade, devem ser alfabetizados, tendo cursado,
no máximo, até a quarta série do ensino básico,
salvo o que já se disse de referência às capitais,
e possuidores de uma profissão definida, que não requeira
grande mobilidade e que se encontre inserida no contexto social
local. Na impossibilidade de se documentarem três diferentes
faixas etárias, o que acarretaria um aumento de custos, optou-se
pelo registro de informantes de faixas mais distanciadas. Tal opção
procura atender às possibilidades de melhor confronto entre
usos por diferentes faixas etárias e, também, propiciar
a análise da variação e da mudança lingüísticas.
Como se vê desse breve perfil, há o interesse de buscarem-se
as relações língua-fatores sociais como forma
de responder-se a questões geolingüísticas da
realidade atual.
Questionário
- De referência ao questionário lingüístico,
deliberou-se pela aplicação de três tipos de
questionário direcionados, especificamente, cada um deles,
para os aspectos: (a) fonético-fonológico - 159 perguntas,
às quais se juntam 11 questões de prosódia;
(b) semântico-lexical - 202 perguntas; e (c) morfossintático
- 49 perguntas.
A esses três tipos de questionários, acrescentam-se:
questões de pragmática (04), temas para discursos
semidirigidos - relato pessoal, comentário, descrição
e relato não pessoal -, perguntas de metalingüística
(06) e um texto para leitura - a "Parábola dos sete
vimes".
Dos questionários, publicou-se uma primeira versão,
em 1998, a fim de atender a solicitações de pesquisadores
interessados em conhecer e testar esse instrumento da metodologia
do ALiB e propiciar as aplicações de caráter
experimental previstas e realizadas em diferentes pontos do país.
A partir do que revelaram esses inquéritos procedeu-se a
uma análise crítica e à reformulação
dos questionários com vistas à elaboração
da versão final a ser aplicada em todo o território
nacional. Essa versão foi recentemente (2001) publicada pela
Universidade Estadual de Londrina.
Apresentação
dos dados lingüísticos - Do ponto de vista da apresentação
de dados lingüísticos pretende o ALiB inserir-se entre
os atlas mais modernos, fornecendo, como os chamados atlas de 2a.
geração, além das cartas lingüísticas
propriamente ditas, estudos interpretativos sobre alguns dos aspectos
cartografados. E, seguindo a tendência contemporânea,
acrescentar aos dados cartografados informações de
natureza acústica que permitam o acesso direto à voz
do próprio informante em sincronização com
a indicação do ponto onde ele se situa, ou de exibição,
via Internet, de cartas e localização de pontos
de inquérito e respectivas ocorrências registradas,
como nos denominados atlas de terceira geração.
Etapa
em que se encontra o Projeto - Decorridos quase cinco anos do
início das gestões para a retomada da idéia
de realização de um atlas lingüístico
geral do Brasil no que se refere à língua portuguesa,
o Projeto ALiB considera cumprido o cronograma traçado no
que compete ao estabelecimento das bases metodológicas e
à realização de inquéritos experimentais
em diferentes áreas do país. A previsão, que
se espera também ver cumprida, é de que, iniciados
os inquéritos definitivos em setembro de 2001, se possam
ter os primeiros resultados nacionais em 2005.
Suzana
Cardoso e Jacyra Mota são lingüistas e professoras da
Universidade Federal da Bahia
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