Português e Esperanto-Inglês: Carlos Vogt
Novas práticas melhoram ensino da língua escrita
A História do Português Brasileiro
Lei proíbe uso de estrangeirismos
A língua na TV
Línguas são assunto de Estado
Os empréstimos no léxico do futebol
A origem e o destino das línguas
A globalização da língua:
Aldo Rebelo
A polêmica sobre os "estrangeirismos" e o papel dos ligüistas:
Kanavillil Rajagopalan
Línguas Crioulas:
Hildo Honório do Couto
Norma e prescrição lingüística:
Maria Helena de Moura Neves
A originalidade das línguas indígenas no Brasil:
Aryon D. Rodrigues
Os estudos sobre linguagem: uma história das idéias:
Eduardo Guimarães
A lingüística no Brasil:
Paulino Vandresen
Inteligência, linguagem e mente humana:
Ulisses Capozoli
Desenvolvimento da linguagem e processo de subjetivação:
Cláudia Lemos
Atlas Lingüístico do Brasil:
Suzana Cardoso e Jacyra Mota
Jornalismo e questões de linguagem:
Graziela Kronka
Poema
Bibliografia
Créditos

 

 

A língua na mídia

Falar e escrever a lígua portuguesa de acordo com a norma culta não é algo que se aprende apenas nas salas de aula. Além dos tradicionais programas educativos, que reproduzem as salas de aula no espaço da televisão, existem outras iniciativas, no rádio e na televisão, que procuram ensinar gramática dando exemplos cotidianos de violações usuais da norma culta. Músicas, poesias, artigos da imprensa, filmes publicitários são mostrados e comentados em seus "erros", licenças poéticas, neologismos, regionalismos e variações em geral do padrão da língua. Programas deste tipo não são novos, e partem da idéia que o brasileiro fala e escreve mal.

Na TV Cultura, Pasquale questiona o abuso de estrangeirismos

O mais popular e conhecido desses programas é o Nossa Lígua Portuguesa, comandado pelo professor de português Pasquale Cipro Neto, produzido pela TV Cultura de São Paulo e retransmitido pelas TVs Educativas de todo o país. Pasquale viu sua fama e a de seu programa irem além do estado de São Paulo - e dos leitores da Folha de São Paulo, jornal onde tem sua coluna - depois de virar o principal personagem de um comercial da rede de fast food MacDonald's. Na propaganda, Pasquale corrigia o português de clientes da lanchonete, do mesmo modo como faz em seu programa de televisão.

No canal educativo Futura, o guitarrista do grupo Titãs e escritor de romances policiais, Tony Bellotto, apresenta um programa semelhante. Através da exibição de videoclips e com o apoio de entrevistas, Afinando a Língua, é um programa que usa letras de músicas para falar sobre a língua portuguesa.

As rádios Jovem Pan AM e Eldorado AM também veiculam diariamente programas no mesmo estilo, em horários espalhados em sua programação diária. SOS Língua Portuguesa, da Jovem Pan, é comandado pelo professor Odilon Soares Leme. O editor do jornal Estado de São Paulo e autor do Manual de Redação do Estadão, Eduardo Martins, comanda desde 1977, o programa De Palavra em Palavra, pela rádio Eldorado.

Programas desse tipo, no entanto, costumam ser o horror dos lingüistas. Segundo eles, as tentativas de se "corrigir" o falar popular vêm da concepção de que ele é uma corrupção de um falar "culto", mais eficiente e melhor organizado. Dizem os lingüistas, que todas as variedades da língua tem uma gramática articulada e consistente.

Como meio de comunicação de alcance nacional, a televisão, mesmo quando não procurou exercer essa função educativa e normativa, introduziu novos elementos, bastante importantes, no falar nacional. Segundo a lingüista Telma Domingues da Silva, antes do rádio e da TV, não se falava em língua oral culta nos estudos lingüisticos. "A língua oral era então somente objeto de descrição lingüística, ou seja, a lingüística não é normativa como a gramática, não vai dizer o que está certo ou errado. A própria descrição lingüística porém, voltando-se para as diferenças de fala enquanto digamos, 'dialetos socialmente diferenciáveis', vai, em um segundo momento, distinguir também na língua oral padrões mais ou menos próximos aos padrões normativos da escrita. Esse movimento metodológico nos estudos lingüísticos acompanha, vamos dizer, a difusão dos meios eletrônicos de comunicação, tornando-se, nesse sentido, um instrumento de tratamento dessa formalização do oral através da mídia. Estaria sendo buscado assim, a imagem de uma língua oral culta, conceito que se produziu a partir de alguns dos estudos lingüísticos".

Tendo em perspectiva principalmente o telejornalismo, a pesquisadora afirma que a televisão inscreve a sua enunciação no imaginário, que é marcada por um jogo entre familiaridade e intimidade. "A presença (imagem) do locutor diariamente produz familiaridade e a presença da televisão como eletrodoméstico produz intimidade", explica. "Daí a mídia procurar por uma imagem 'mais coloquial' da língua, como parte dessa familiaridade e intimidade, que ela busca produzir na sua enunciação para o público brasileiro".

O texto produzido para ser lido pelo locutor jornalístico é diferente da linguagem escrita, é um texto para ser falado. Segundo ela, tem-se "a imagem da língua oral em jogo". Ao mesmo tempo que a enunciação deve parecer coloquial, informal, deve ser também correta, formando uma oralidade culta. "A imagem do que é correto e do que não é resulta pois de uma diferença entre a fala de alguém que foi escolarizado e de alguém que não o foi".

Segundo lingüistas e pesquisadores da comunicação, a influência da imprensa televisiva teria sido tão grande que, ao ser vista pela imprensa escrita como um concorrente, fez com que os jornais e revistas procurassem aproximar-se dos efeitos da televisão. Daí surgiriam o aumento do uso de fotos (maiores, em maior quantidade, e até coloridas), o uso de gráficos explicativos e, principalmente, a tentativa de adotar uma linguagem escrita mais simples, aproximando-se do coloquial, por parte da imprensa escrita.

Recentemente, outro efeito dos meios de comunicação tem sido ampliado, devido ao efeito da globalização. O maior contato com produtos culturais de outros países, principalmente através da televisão a cabo e da Internet, tem introduzido uma familiaridade dos falantes do português com palavras estrangeiras. O espaço enunciativo do português estaria, com isso, incorporando os estrangeirismos.

Para o professor do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp, Eduardo Guimarães, a globalização seria a ampliação do espaço enunciativo de línguas "não-só-nacionais", ou seja, "línguas oficiais que não são somente línguas de uma nação". Línguas como o francês, o alemão e, principalmente o inglês, teriam seu espaço enunciativo ampliado. "E não se trata do inglês simplesmente. É o inglês enquanto língua, primeiramente, dos Estados Unidos. A língua está marcada por uma geografia hierarquizada", afirma.

No contexto da América Latina, para Guimarães, seria preciso, além de desenvolver uma reflexão política sobre as línguas, produzir um conhecimento que considere a pluralidade das línguas do continente. Essa pluralidade não se restringe apenas ao português e ao espanhol, mas incorpora também a memória das línguas indígenas, das línguas africanas e de outras, ainda faladas ou presentes no imaginário.

"É preciso estabelecer um cotejo de forças que trabalhe a pluralidade das línguas e não a extensão de uma língua como língua franca para o mundo", afirma Guimarães. "É preciso fazer com que o que é posto como espaço agregado ao centro, pela globalização como nova forma de dominação, seja ele próprio parte que enuncia e significa".

Atualizado em 10/08/2001

http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

© 2001
SBPC/Labjor
Brasil