A Conversação e Inimigo do Estado Ética
e Poder na Sociedade da Informação Cibercultura The
Hacker Ethic and the Spirit of the Information Age Envie
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Cibercultura por Mônica Macedo Um novo iluminismo Pierre Lévy é um otimista, como ele mesmo faz questão de dizer, com todas as letras, logo no início de Cibercultura: "me consideram geralmente um otimista; têm razão". Por vezes beirando as raias da ingenuidade - como quando afirma que mesmo o leitor inexperiente pode, "em poucas horas", aprender a navegar na Web com relativa autonomia (p. 99) - ou da irresponsabilidade - quando diz que nenhum governo ou empresa previu o desenvolvimento das tecnologias informáticas e da Internet, resultante do espírito de visionários movidos pela "efervescência de movimentos sociais e de práticas de base" (p. 29) - tal otimismo pode ser compreendido, considerando os interlocutores a quem ele tenta dar respostas. Pois não se trata aqui de avaliar os efeitos da exclusão do mundo da cibercultura. Eles existem, diz, mas a Internet tampouco é a promessa de solução mágica de todos os problemas culturais e sociais do planeta. O intelorável seria negar o crescimento da cibercultura e seu caráter vanguardista, fruto de um "movimento internacional de jovens ávidos por experimentar novas formas de comunicação". É nesse movimento, e não no comércio eletrônico, nos "portais" criados por provedores de acesso e conteúdo, nos mecanismos de regulação da Internet, que está a essência da cibercultura para o autor. Quanto mais pessoas tiverem acesso à Internet (ao ciberespaço), mais se desenvolverão novas formas de "sociabilidade", maior será o grau de apropriação das informações por diferentes atores, que poderão modificá-las segundo seus próprios valores (culturais, estéticos), difundindo-as por sua vez de uma nova maneira. Por isso, para Lévy, o fato de o ciberespaço mundializar o consumo (de produtos e de informação) não é sinônimo de dominação. Pelo contrário, a característica principal desse novo meio de comunicação é que quanto mais universal, menos "totalizante" (ou totalitário). Daí a cibercultura ser herdeira da filosofia iluminista do século XVIII, pois incentiva o debate e a argumentação, retomando e aprofundando os antigos ideais de "emancipação e exaltação do humano" (p.256). O ciberespaço é universal pelo fato de se basear na escrita, suporte fundamental de registro e difusão do saber, que permitiu, a seu tempo, a generalização e universalização da ciência e da religião. Nesse sentido, ele se opõe ao rádio e à televisão, meios orais, em que a informação é volátil, e que não permitem, ao contrário do primeiro, uma "real" reciprocidade entre seus participantes. Além disso, prossegue, o ciberespaço é "não totalizante" porque nele o saber se constrói pela interação entre os participantes. Tal deslumbramento, e as contradições que dele necessariamente emanam, quase nos impedem de ver algumas proposições interessantes que, no entanto, o texto de Lévy oferece. Como, por exemplo, no capítulo III, o entendimento da noção de "virtual" não como aquilo que se opõe ao "real", mas ao "atual". O virtual é, portanto, o que existe potencialmente, como uma informação que se encontra em alguma parte da rede (fisicamente estocada num servidor), podendo ser recuperada de qualquer ponto e a qualquer momento, ainda que num dado instante não faça parte do repertório do leitor. "Virtual" e "atual" são, pois, dois modos diferentes do "real". Mais adiante, também, a noção de que são os "dispositivos informacionais e comunicacionais" (mundos virtuais, informação em fluxo, comunicação todos a todos), e não a simples mistura de texto, imagens e sons (multimídia), os verdadeiros suportes das mudanças culturais trazidas pela internet. Ou seja, não é tanto a representação da informação, mas o modo de relação entre as pessoas que impulsiona as transformações. O que não impede Lévy de atribuir papel central à idéia (interessante, mesmo que duvidosa) de que a hipertextualização de documentos conduz à mistura e à indissociação das funções de leitor e autor. "Tudo se passa como se o autor de um hipertexto constituísse uma matriz de textos potenciais (grifo do autor), sendo o papel dos navegadores o de realizar alguns desses textos, fazendo funcionar, cada um à sua maneira, a combinação entre os nós" (p.69). De fato, diferentemente do papel, o texto digital permite passar de um documento a outro, de uma linguagem a outra, de um autor a outro, de maneira muito rápida, quase automática, dependendo da situação. Os percursos de leitura tornam-se, portanto, ainda menos previsíveis que no papel. Pelo menos potencialmente. Resta confirmar se o suporte digital incentiva realmente uma leitura não linear. O fato de hoje os leitores reproduzirem os esquemas "tradicionais" de leitura, imitando os processos com os quais estão acostumados, que conhecem melhor e que, portanto, lhes dão mais segurança, não é motivo para excluir a primeira hipótese. Afinal, apenas com o tempo se poderá avaliar que novos hábitos de leitura foram criados com o hipertexto digital. Não se deve menosprezar, contudo, os resultados das pesquisas que vêm sendo realizadas por psicólogos, lingüistas, informatas, comunicólogos, e que apontam muito freqüentemente a dificuldade dos leitores em lidar com hipertextos. Para Lévy, no entanto, nada disto parece preocupar. A tendência é clara e nitidamente favorável à participação ampla e coletiva na construção de um novo mundo, de uma "comunidade mundial". Será?
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