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Resenhas

Em busca de Klingsor
Jorge Volpi

Meu Tio (Mon Oncle)
Dir. Jacques Tati.

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Meu Tio (Mon Oncle)
Direção: Jacques Tati.

por Sabine Righetti

Todas as vezes que a campainha da casa da família Arpel é apertada, o chafariz em formato de peixe, disposto no meio de um geométrico jardim, é acionado. A fonte é desligada de acordo com a importância da visita. Assim é moldada a vida do casal Arpel e seu filho único, o pequeno Gérard, personagens do filme Meu Tio (Mon Oncle), de Jacques Tati (1908 - 1982).

Tati estabelece em Meu Tio uma crítica ao culto à modernidade tecnológica já vigente na década de 50. O título faz referência ao único membro da família que não se encaixa nessa mentalidade corrente na família Arpel: o simpático tio Hulot, interpretado pelo próprio Tati. Hulot, solteirão e desempregado, passa a ser admirado por seu sobrinho Gérard justamente por estar fora dos padrões impostos pela sociedade. E isso provoca, no decorrer da trama, uma crise de ciúmes em Charles, pai de Gérard.

Tio Hulot faz o contraponto da casa moderna da família Arpel: ele vive numa confusa periferia em que a ordem é estabelecida pelos próprios moradores. Sempre que Hulot vai visitar a irmã, atravessa as ruínas de um muro que representa a ruptura da cidade tradicional com a cidade moderna. De um lado, uma família em que a formalidade era levada aos extremos e, consequentemente, a monotonia surgia. Do outro lado a alegria de viver, mesmo com dificuldades. A ordem contra a desordem, modernidade contra o tradicional. Ao mesmo tempo, Tati coloca em questão os novos conceitos estéticos emergentes na Europa da década de 50.

O filme vai além de mostrar o moderno e o não-moderno: satiriza a interferência provocada pelas inovações tecnológicas dentro de uma casa - levadas a um caso extremo - no cotidiano das pessoas. Na casa da família Arpel, a cozinha tem o que havia de mais moderno na época, o portão principal abre sozinho e o design dos móveis é arrojado - e desconfortável. "Tudo se comunica", retruca a sra. Arpel quando repreendida por uma visita que atenta ao fato da casa ser extremamente vazia.

É, na realidade, a própria casa que dita as regras da família. As lajotas indicam onde se deve pisar, a mesa com guarda-sol mostra onde se deve almoçar, e onde se deve tomar o café após o almoço. A casa vigia e parece ter olhos, arquitetonicamente desenhados por duas janelas redondas no quarto do casal Arpel.

O barulho do abre e fecha dos aparelhos "modernos" é tamanho que faz a casa parecer uma verdadeira fábrica, o que é explícito no clímax do filme, numa cena em que o próprio casal não consegue estabelecer uma conversa por causa dos ruídos dos equipamentos. A relação em família se torna fria - e vazia - como a própria casa onde moram.

A modernidade é admirada pela família Arpel também fora da casa. Charles, o sr. Arpel, é dono de uma fábrica de plásticos. Nela, fica também evidenciada outra crítica pronunciada por Jacques Tati: a da nova sociedade industrial. O trabalho maçante e repetitivo dos funcionários, que dão ênfase às atividades sob os olhos do patrão.

Meu Tio é um dos cinco longametragens dirigidos por Tati entre 1949 e 1974. Além dele, As Férias de Monsieur Hulot (Les Vacances de Monsieur Hulot) também tem o mesmo sr. Hulot como personagem.

Na época do seu lançamento, Meu Tio teve pouco público na França: oito milhões de espectadores, contra os 14 milhões de As Férias do sr. Hulot (1952) e 10 milhões de Carrossel da Esperança (1947). Depois que foi distribuído fora do país, além de cultuado pela crítica, se transformou no filme mais conhecido de Jacques Tati. O filme venceu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e o prêmio Especial do Júri no Festival de Cinema de Cannes, em 1958.

Com a modernidade sob questionamento e figuras estereotipadas, como o sr. Hulot, vigentes até hoje, Meu Tio é um dos poucos filmes que conseguem se manter atuais mesmo ao completar 45 anos. E assim continuará por muito tempo.

Atualizado em 10/07/03

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2003
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