Finalmente Peirce, ainda Peirce!
Semiótica e filosofia – textos escolhidos
de Charles Sanders Peirce
Charles Sanders Peirce
Editora Cultrix, 1972
Por
Carlos
Vogt
Assim,
se a olharmos através do uso e da interpretação
que dela faz Granger, poderemos com maior segurança,
entender a natureza do conceito de língua que
aparece já em Saussure e em todo estruturalismo,
bem como num certo sentido, na lingüística
transformacional, onde tal conceito remete ao conjunto
de relações abstratas, cientificamente
objetivadas no interior do universo estruturado por
uma prática específica, ou seja, a da
lingüística. Nestes termos, o conceito
de língua é uma invenção
teórica, cuja realidade só é
concebível como objeto de estrutura. Abstratamente
definido, se tal conceito ganha em generalidade e
em eficacidade deve necessariamente perder em rigor
e em complexidade, segundo o ensinamento de Auguste
Comte. É por isso que a afoiteza com que muitos
vão à fonte, afoga ao invés de
matar a sede.
Tentar
transpor tal e qual o método, seja ele qual
for, com que a lingüística trabalha o
seu objeto, ainda que para áreas cuja contigüidade
com a língua pareça mais evidente, como
é o caso da literatura, é esquecer que
a atualização da linguagem se faz aí,
de modo intenso e sistemático pelo viés
das significações. É evidente
que se tomada como um instrumento para o tratamento
de uma experiência, a noção de
estrutura e, conseqüentemente, a noção
de língua evitarão mal-entendidos dessa
espécie e outros tais como o que leva, por
exemplo Roland Barthes, a reduzir o problema da moda
às descrições que os jornais
especializados fazem dela, para, não podendo
ampliar o método, reduzir o fenômeno.[24]
Na
linha das observações feitas acima sobre
a noção de língua, a noção
de sentido também será definida em termos
de estrutura, isto é, o sentido tal como a
língua não constituí um dado
de observação, mas um objeto da teoria,
uma construção do lingüista, um
objeto de estrutura, enfim. Deste modo, nossa observação
vai ao encontro do conceito de sentido estrutural,
conceito de natureza puramente formal e cuja objetivação
só pode dar-se no interior da codificação
da linguagem, entendida como estrutura. A fala abre-se,
no entanto, como um leque de possibilidades significativas,
numa cadeia de interpretantes, região onde
o acaso e as grutas escondem surpresas e passeiam
tentações.[25]
Na
medida em que o sentido não constitui um dado
de observação, pois que ele é
um abstrato, as teorias lingüísticas que
afirmam ou pressupõem necessariamente a hipótese
de que os enunciados de uma dada língua têm
valor semântico, não podem fazê-lo
senão pelo método da introspecção
artificial, através de uma experimentação
intelectual que parece contrariar de forma flagrante
algumas das exigências fixadas para a teoria,
como é o caso da previsibilidade e da adequação.
Refiro-me em particular a Chomsky e aos caminhos abertos
da lingüística pela Gramática Gerativa
Transformacional.[26]
Se
o sentido é uma nação estrutural,
nos termos de Granger e a partir de Peirce, ele constitui
um instrumento, uma noção operacional,
da mesma forma que a língua para Saussure é
um princípio de classificação
para os fatos da fala. Neste ponto, e como já
observei no artigo “A palavra envolvente”
a proposta de descrição semântica
feita por Oswald Ducrot aparece de modo realmente
interessante.[27]
Considerando
como dado de observação a significação,
o sentido aí aparece como uma noção
operatória, isto é, como um princípio
de explicação para os fatos de significação.
Trabalhando sobre dois componentes, o lingüístico
(CL) e o retórico (CR), esta proposta de descrição
semântica atribui ao primeiro componente a tarefa
de determinar o sentido de enunciado (E), em termos,
por exemplo de posição (P) e pressuposição
(PP), enquanto que o componente retórico tem
como atribuição interpretar o resultado
da análise feita pelo componente lingüístico,
levando agora em conta os fatores relativos à
situação (S) ou, se se quiser, às
condições de tal enunciado. O objetivo
desta descrição é, não
a atribuição de um valor semântico
ao enunciado, mas a determinação da
significação da enunciação,
entendida como ato de fala.[28]
Tomemos
um exemplo, a título de esclarecimento. Seja
o enunciado:
1)
Ele ainda mora na casa
Dita
por um locutor A, numa situação específica
em que A é o dono que a quer livre do inquilino
(Ele) há muito tempo, mas que não consegue
o seu intento. O enunciado 1) é pronunciado
por A para um interlocutor B, ambos se encontrando
num contexto social em que A deve ser, por força
das circunstâncias, educado e não dar
vazão a todo seu desespero de proprietário.
B que no entanto está a par de todas as tentativas
frustradas de A para despejar o inquilino, interpreta
o enunciado 1) como significando:
1’)
Ele nunca vai sair da casa
A
tarefa da descrição semântica
é então explicar como, a partir do sentido
literal ou estrutural, nos termos de Granger, se produziu
a significação 1’) que é
no caso um subentendido (SE) de 1).
Em
linhas gerais, o processo para a determinação
de 1’) é o seguinte:
a)
submetido ao tratamento do CL o enunciado
1)
receberá uma representação
analítica de seu sentido em termos, por exemplo,
de posto e pressuposto,[29] e
b)
o sentido literal assim representado será,
por sua vez, submetido ao trabalho do CR, juntamente
com os dados de situação em que tal
enunciado ocorre, para que se obtenha a significação
1’).
O
CR deve, portanto, na concepção de Ducrot,
ter dupla atribuição: de um lado, deve
preencher as variáveis de tipo referencial
e intencional e, de outro, deve estabelecer as leis
capazes de explicar, dada a situação,
como a partir do sentido literal estabelecido pelo
CL, produziu-se tal ou tal significação.
No
caso específico de 1) o locutor B, que ouve
A, raciocina a partir do fato de A ter dito tal enunciado
numa situação específica, de
tal forma que B interpreta 1) como sendo mais forte
do que literalmente é. Assim, o que intervém
no CR, para a produção de 1’)
é uma lei de discurso bastante conhecida das
retóricas clássicas: a (litote) ou eufemismo.
O
esquema abaixo pode representar mais suscintamente
tal processo de descrição semântica:
E:
1) Ele ainda mora na casa
Não
se trata aqui de discutir os méritos de tal
forma de descrição semântica,
que é, no entanto, bastante eficaz. O que nos
interessa é fazer ver o quanto esta proposta,
no que concerne em particular o CR, desenvolve-se
como não podia deixar de ser, uma vez que se
propõe estabelecer sistematicamente a significação
de um ato de fala, na linha do que Peirce chama de
terceiro ramo da semiótica, ou seja, o da retórica
pura, cujo objetivo, como já observamos
anteriormente em citação do próprio
autor, “é o de determinar as leis em
obediência às quais, em toda inteligência
científica, um signo dá surgimento a
outro e, especialmente, um pensamento provoca outro”.
Trata-se,
neste sentido, como observa Granger, “dos encadeamentos
interpretativos com o signo originário e de
suas ligações mútuas”.
Estas ligações não relevam da
estrutura do “objeto” que é signo;
elas fazem intervir uma experiência exterior
à linguagem, o que manifesta claramente o uso
do termo “retórico para designar suas
leis”.[30]
Por
outro lado, a preocupação com a lógica
que os trabalhos de Ducrot revelam podem perfeitamente
reencontrar o segundo ramo da semiótica de
Peirce, assim como sua preocupação com
os gramáticos medievais marcaria o encontro
de sua atividade com o primeiro ramo da semiótica
peirceana, ou seja, o da gramática pura ou
especulativa. [31]
Isto
não quer dizer que haja necessariamente uma
influência direta do lógico e filósofo
americano sobre os trabalhos do lingüista francês.
Não importa. O acaso no discurso é tão
significativo quanto a intenção. Vale
dizer que o trabalho de Ducrot, revelador de preocupações
que a lingüística não pode mais
postergar ? ou seja, a preocupação com
o mais que a frase ? encontra em alguns pontos a sua
atualidade, por coincidência ou não (pouco
importa) num discurso de fins do século XIX
e começos do século XX.
Importante
é notar ainda que a proposta de descrição
semântica, tal como ela aparece em Ducrot, na
medida em que busca estabelecer as significações
dos atos de enunciação, admite explicitamente
a possibilidade de objetivar, cientificamente falando,
aquilo que Granger chama de resíduo da estruturação.
Desta forma, a prática que aí se encontra
busca intencionalmente o desvio, sem contudo, a ilusão
de que seja definitivamente possível amarrá-lo
aos nós da estrutura. Ao contrário,
quanto mais se estende o campo do estruturável,
mais é intensa a imagem do residual. Sala dos
espelhos que multiplica ao infinito, torce e deforma
o objeto, cuja realidade é explicativa, mas
jamais totalizante do real. Assim apresentada, a lingüística
de Ducrot, pode, sem abuso de confiança, ser
apontada como uma lingüística do desvio,
no sentido em que este termo foi aqui utilizado.
Nesse
momento, é também possível entender
o papel da lógica, situando-a conforme faz
Peirce, como um dos ramos da semiótica, na
descrição das línguas naturais:
ela não é determinante do funcionamento
das línguas naturais, vale dizer, não
tem nenhum papel normativo em relação
a elas; ao contrário, o seu valor é
explicativo e determinador de desvios. Além
disso, é impossível conceber a natureza
da linguagem lógica sem a totalidade desta
experiência que se chama linguagem natural.
E é desta forma que ela aparece nos trabalhos
de Ducrot e na maior parte da lingüística
que hoje se pratica.[32]
Procurando
estabelecer a natureza do que ele chama de significação
implícita, Ducrot recorre à célebre
fórmula de Hjelmslev, utilizada com fidelidade
por Barthes, sobre a linguagem conotativa, para diferencialmente
atingir o seu propósito”.[33]
De
um lado, tal distinção nos permite recolocar,
de modo mais claro, a observação que
acima fizemos sobre o problema da objetivação
das significações na lingüística
de Ducrot, sobretudo se levarmos em conta a distinção
que o autor faz entre os fatos de significação
implícita e aqueles que, resultantes de procedimentos
estilísticos, são passíveis de
uma codificação de segundo grau, de
que trata a retórica conotativa.
Definida
a conotação como a constituição
de uma segunda linguagem, ao nível da expressão
do sistema denotado, segundo o esquema abaixo transcrito,
Mais
uma vez encontramos a anterioridade fecunda de sugestões,
do trabalho de Peirce sobre o signo. Assim, no artigo
“A classificação dos signos”,
no parágrafo 2 “Os signos e seus objetos”,
Peirce, insistindo sobre a diversidade necessária
entre o signo e aquilo que ele representa - o seu
objeto - faz a seguinte observação:
“Para
que algo seja um signo deve ‘representar’,
(...), algo diverso que é chamado seu ‘objeto’
embora a condição de que um signo deva
ser diverso de seu objeto seja talvez arbitrária,
pois se insistirmos a respeito desse ponto, deveremos,
pelo menos, introduzir uma exceção para
o caso de um signo que parte de um signo.” [34]
Um
dos exemplos que Peirce dá para tal exceção
é o seguinte: um ator que, desempenhando um
papel num drama histórico, portasse como “propriedade”
teatral a relíquia mesma que poderia ser representada
por um sucedâneo, conseguiria um grande efeito
sobre o público. Suponhamos que tal relíquia
fosse a coroa de espinhos do martírio de Cristo,
se é que tanto se pode supor. O efeito então
conseguido decorre, em última análise,
do elemento de conotação que se constitui
sobre o “objeto” denotado: é a
própria cristandade glorificada na ideologia
do sofrimento que se faz presente, da mesma forma
que, como observa Ducrot [35] o emprego de uma palavra
italiana por Stendhal introduz no texto “toda
a complexidade de sentimentos e emoções
que ele liga à Itália: o que é,
deste ponto de vista, significante, não é
mais a simples forma material da palavra, mas o fato
de ter empregado a palavra (tomada globalmente, como
um complexo comportando ao mesmo tempo significante
e significado)”.
Suponhamos,
ao contrário, que um determinado autor pretenda
atingir, no caso ainda da relíquia, o efeito
contrário; que será, ainda que comicamente,
sempre um grande efeito, e substitua a coroa de espinhos
por uma peça do vestuário feminino,
e a faça aparecer no momento de maior ansiedade
e “fervor” religioso, num processo de
envolvimento das personagens e do leitor que ele soube
desenvolver como preparação desse momento.
O efeito, por exemplo, a hipocrisia religiosa, não
é contrário em virtude de não
estar lá o instrumento mesmo do martírio
de Cristo, poderoso bálsamo para as mazelas
do corpo e da alma, mas porque o seu sucedâneo
remete de forma violenta e definitiva para um outro
sistema conotativo, que oferece como resposta ao fervor
da espera a consumação do pecado. Tal
é o procedimento estilístico que se
pode, por exemplo, verificar no uso da ironia moralizante
com que Eça de Queirós distingue a hipocrisia
religiosa em A relíquia.
3.
Tal é a obra de Peirce. Complexa e
rica de sugestões, de difícil leitura,
às vezes, de profundidade e rigor, sempre.
Nosso
intuito não foi em nenhum momento pretender
esgotar numa panorâmica, se tal se pudesse fazer,
a intensidade com que sua obra resiste ao tempo e
influencia as mais recentes atitudes diante do pensamento
científico. Se conseguirmos passar ao possível
leitor deste escrito a curiosidade autêntica
pelo autor, então nosso objetivo estará
satisfeito.
Nesse
sentido, como disse no início deste trabalho,
é louvável o esforço dos tradutores
e dos editores para colocar alguns textos significativos
do autor americano ao alcance do leitor de língua
portuguesa.
É
sempre triste que coisas como esta cheguem aqui como
visitantes convidados, além disso, com atrasos
sintomáticos.
Quanto
à edição brasileira, ainda uma
palavra, a título de sugestão. Há
irregularidades sistemáticas na publicação,
sobretudo no que concerne ás citações.
Aponto aqui algumas, com o propósito de chamar
a atenção dos interessados para uma
virtual nova edição do livro.
Em
primeiro lugar, as notas de rodapé ao longo
do livro são indicadas de forma diversificada:
ora com números em alguns artigos, ora com
asteriscos em outros. Acontece que na edição
americana os editores tiveram o cuidado de distinguir
as notas do próprio autor com números,
reservando outros índices, como o asterisco,
para as suas próprias notas. Na edição
brasileira, o leitor fica sem esta distinção.
Em
segundo lugar, há no artigo “Classificação
dos signos” omissão de todas as notas
dos editores dos Collected Papers, enquanto
em outros artigos elas aparecem indistintamente .
Em
terceiro lugar, o problema da remetência de
um artigo para outro está também muito
maltratado na edição da Cultrix. Assim,
à página 50, no artigo “Como tornar
claras as nossas idéias”, Peirce refere-se
ao artigo anterior (Cf. “... tal como descrito
em meu trabalho anterior...”). Acontece que
nos Collected Papers, o anterior é
o artigo “A fixação das crenças”
que na edição brasileira segue o artigo
“Como tornar claras as nossas idéias”.
À página 163 no artigo “Dedução,
indução e hipótese”, o
autor refere-se a trabalhos anteriomente publicados
e os editores americanos remetem em nota de rodapé
ao artigo “A fixação das crenças”,
nota também omitida na edição
brasileira.
Finalmente,
para terminar esta lista cujo caráter não
é de nenhum modo exaustivo, mas que se propõe
simplesmente sugerir uma revisão cuidadosa
e necessária da edição brasileira,
não se entendem quais os critérios que
levaram os editores a omitir a separação
titulada dos parágrafos em alguns artigos e
mantê-la em outros. É verdade que muitos
títulos são atribuídos pelos
editores americanos, mas isso não vem ao caso
porque bastaria atribuir-lhes, o que é feito
nos Collected Papers em nota de introdução,
quando tal ocorresse, um índice qualquer que
diferenciasse os títulos dados pelo próprio
autor. Além disso, há na edição
dos Collected Papers uma numeração
dos parágrafos que percorre cada livro o que
torna o sistema de referências internas muito
mais simples e eficiente.
Paramos
aqui. Fica a certeza de que, em qualquer hipótese,
sejam quais forem os pressupostos teóricos
e filosóficos de quem o lê, a obra de
Peirce tem o vigor capaz de suportar tanto os mistificadores
da ciência como os da filosofia. Porque não
se trata de buscar aí a verdade definitiva
nem o credo dos idólatras da superstição.
Aos que o fizerem, certamente encontrarão a
resposta desalentadora de um pensador consciente de
que o único fim concebível é
o da substituição do provisório
pelo provisório:
“Minha
obra não transmite regras impositivas. Como
um tratado de matemática, sugere certas idéias
e fornece algumas razões para considerá-las
verdadeiras; se o leitor as aceitar, será porque
teve boas razões, e a responsabilidade é
dele. O homem é, essencialmente, um animal
social: ser social, entretanto, é uma coisa,
e ser gregário é outra; declino do papel
do guia de rebanho. Minha obra destina-se a pessoas
que desejam perquirir; os que desejam a filosofia
mastigada podem buscar outro rumo, há botequins
filosóficos em todas as esquinas, graças
a Deus.”[36]
Eis
a resposta.
_______________________________
[1]
- A propósito do aparecimento, em edição
brasileira, de alguns textos do autor: Semiótica
e filosofia - Textos escolhidos de Charles Sanders
Peirce. Introdução, seleção
e tradução de Octanny Silveira da Mota
e Leônidas Hegenberg. São Paulo, Ed.
Cultrix, 1972. 164 p.
[2]
- James, William. Pragmatism: a new name for some
old ways of thinking, together with four related essays
selected from the meaning of truth. New York, Longmans,
Green, 1907. p. 46.
[3]
- Pragmatism and abduction, Collected Papers,
v. 5, bk. 1, lecture 7, p. 121.
[4]
- Stroh, Guy W. A filosofia americana: uma introdução
(de Edwards a Dewey). Trad. de Jamir Martins. São
Paulo, Editora Cultrix, 1972. p. 120.
[5]
- Cf. Popper, Karl R. The logic of scientific
discovery. New York, Basic Books, Inc., 1961.
p. 27: “É evidente que de um ponto de
vista lógico, nada nos justifica inferir proposições
universais a partir de proposições singulares,
por mais numerosas que elas sejam; porque toda conclusão
tirada desta maneira poderá sempre se revelar
falsa: pouco importa o número de cisnes brancos
que possam ter observado, isto não justifica
a conclusão de que todos os cisnes são
brancos”.
[6]
- Id. Ibid. p. 33.
[7]
- Ruwet, Nivolas: Introduction à la grammaire
génerative. 2. ed. Paris, Plon, 1968. p. 13.
Cf. Também Chomsky, Noam. Current issues in
linguistic theory. Haia, Mouton, p. 105, citado por
Ruwet, op. cit.: “Os dados de observação
são interessantes na medida em que têm
uma incidência sobre a escolha entre teorias
rivais”. Ver ainda a Introdução
do n. 16 da revista Langages: “Psycho-linguistique
et grammaire generative”, em que Jacques Mehler
observa com pertinência a natureza abductiva
do modelo gerativo transformacional. Diz ele: “...o
lingüista, na realidade, não faz senão
apresentar uma formalização do processo
da abdução (o que a língua natural
é o que ela não é) e de maneira
pela qual as leis universais de abdução
são incorporadas em qualquer uma das numerosas
línguas naturais de que são capazes
os indivíduos humanos”. P. 11.
[8]
- Peirce, Charles Sanders: Semiótica e
filosofia -Textos escolhidos… São
Paulo, Cultrix, 1972. p. 67-8. Collected Papers, v.
5, bk. 2, paper 5, p. 268.
[9]
- Russell, Bertrand. An inquiry into meaning and
Truth. 7 ed. London, George Alken and Unwin Ltd.,
1966. p. 22.
[10]
- Peirce, Charles Sanders: Semiótica e
filosofia -Textos escolhidos... cit. P. 94; Collected
Papers, v. 2, bk 2, chap. 2, p. 195.
[11]
- Id. ibid. p. 93; id. ibid. p. 134.
[12]
- Id. idib. p. 93-4; id. ibid. p. 134 e seg.
[13]
- Id. idib. p. 105 e seg.; id. ibid. p. 146 e seg.
[14]
- Granger, Gilles Gaston. Objet, structure et significations.
In. Revue Internationale de Philosophie,
n. 73-74, fascículo 3-4, p. 251-90, 1965.
[15]
- Granger chama de experiência “um momento
vivido como totalidade, por um indivíduo, ou
indivíduos que formam uma coletividade”.
E esclarece: “Totalidade não deve ser
aqui entendida no sentido místico; o caráter
de totalidade de uma experiência não
se erige de modo algum num absoluto; é simplesmente
um certo fechamento, circunstancial e relativo, comportando
horizontes, primeiros planos, lacunas. Fechamento,
no entanto, radicalmente diferente do que busca a
estruturação: sem horizontes, completamente
dominado, claro e distinto. Toda prática poderia
ser descrita como uma tentativa para transformar a
unidade da experiência em unidade de uma estrutura,
mas esta tentativa comporta sempre um resíduo”.
Op. Cit. P. 258. Compare-se com o que Peirce chama
de experiência: “A consciência da
ação de um novo sentimento, a destruir
o sentimento anterior, é aquilo a que denomino
experiência. De modo geral, experiência
é o que, ao longo da vida, me compeliu a pensar”.
Semiótica e filosofia -Textos escolhidos...
cit. P. 138; “ Collected Papers, v. 8, bk. 2,
p. 221.
[16]
- Cf. Granger. op. cit., p. 254: “Todas as propriedades
logicamente conhecíveis do objeto são
desdobradas como relações com outros
objetos no interior de uma estrutura, onde este objeto
não é senão o nó de uma
rede”.
[17]
- Cf. Granger. op. cit., p. 253: “Propomos chamar
significações este aspecto da prática
que não recebe estruturação manifesta,
mas que é o avesso inseparável de toda
atividade apreendida na sua integridade”.
Cf. também: L’explication dans les sciences
sociales. P. 42. Inform. Sci. Soc. v. 10, n. 2, p.
31-44 : “(...) a noção de superestrutura
aparecerá primeiro, com um sentido relativo,
como toda estruturação que pressupõe
uma outra, depois, com um sentido absoluto, como organização
das ‘significações’ que
o pensamento abstrato não consegue reduzir;
mas esta incapacidade, se nós a postulamos
como constitutiva e simétrica por assim dizer,
da irredutibilidade do vivido sensível, ela
não define de modo algum de uma vez por todas
os limites do estruturável por modelos, cujas
flutuações dependem dos progressos da
prática humana”.
Comp. com a indeterminação produzida,
completamente, segundo Peirce, pela lei, relativamente
à natureza: “Experimente verificar qualquer
lei da natureza e descobrirá que quanto mais
precisas forem suas observações, tanto
mais certo que demonstrem irregulares desvios da lei”.
Peirce, Charles Sanders, Collectec Papers, v. 6, liv.
1, cap. 2, p. 36-7.
[18]
- Cf., por exemplo, Colim, Armand. Essai d’une
philosophie du style. Paris, 1968, principalmente
a segunda parte ? Style et structure de langage ?
onde, aliás, o artigo “Objet, structures
et significations” é retomado com modificações
e desenvolvimento.
[19]
- Collected Papers, v. 2, liv. 1, p. 51; cit. por
Granger. op. cit. p. 260.
Um dos exemplars de Peirce Collected Papers, v. 2,
§; Semiótica e filosofia -Textos escolhidos...cit.
p. 119, é o seguinte: “(...) um ébrio
é apresentado para mostrar por contraste a
excelência da sociedade...”, ao que Granger
observa: “O representamen é
o homem bêbado, a idéia ou objeto é
a excelência da sobriedade; o interpretante
pode ser constituído por outras representações
da embriaguez, associadas às da sobriedade,
representações encadeadas numa seqüência
infinita e que remetem todas à idéia
ou objeto
primitivo”. Essai d’une philosophie
du style. cit. p. 114.
[20]
- Granger. op.cit. e também “Objet, structures
et signification”, p. 260.
[21]
- Les embrayeurs, les catégories et le verbe
russe. Essais de linguistique génerale.
Paris, Minuit, 1963. cap. 9, p. 176-96.
[22]
-Quanto à função da língua
natural, concebida essencialmente como comunicação,
não concordo inteiramente. Acredito, a partir
dos trabalhos da filosofia analítica de Oxford,
dos trabalhos de Oswald Ducrot, que a linguagem se
define igualmente por outras funções
específicas tão importantes quanto a
função comunicativa. Cf. esse propósito
meus livros, publicados posteriormente à publicação
original desta resenha, O intervalo semântico
– contribuição para uma semântica
argumentativa, São Paulo: ed. Ática,
1977 e Linguagem, pragmática e ideologia,
2ª ed., São Paulo: Ed. Hucitec, 1989.
[23]
- Granger. art. cit. p. 266.
[24]
- Ver, neste sentido, as críticas de Cesare
Segre à semiologia de Barthes, em: “Verso
una crítica semiológica. I segni e la
critica. Einaudi, 1969.
[25]
- Cf. Granger. art. cit. p. 273: “O sentido
que pode ser dito ‘literal’ ou estrutura
da mensagem é assim recebido pela remetência
normal que se efetua das marcas que têm valor
na língua ou ‘objeto’ do esquema
de Peirce. Mas a utilização feita pelo
locutor na sua fala dos elementos redundantes não
pode ser diretamente e totalmente decifrada, pois
que ele não se apóia em nenhuma regra
explícita, uma vez que não existe uma
supralíngua...” O uso é, no entanto,
aprendido primeiramente como possibilidade de significação,
uma vez que a distribuição, o arranjo
dessas marcas virtuais, ainda vazias para o receptor,
é percebida globalmente como significativa.
Uma espécie e crivo flexível, lacunar
e deformável se constitui, tanto mais é
o receptor sensível e o locutor tiver “estilo”.
[26]
- Ver, neste sentido, meu artigo “A palavra
envolvente”, publicado em Linguagem, pragmática
e ideologia, pp. 7-42.
[27]
- Ver Ducrot, Oswald. Dire et ne pas dire - Principes
de sémantique linguistique. Paris, Hermann,
Col. Savoir, 1972.
[28]
- Para um estudo mais preciso dos atos de linguagem,
ver, além do livro de Ducrot, citado acima,
Austin, J. L. Quand dire c’est faire.
Paris, Seuil, 1970, Todorov, T. et alii: L’enonciation.
Langages, Paris, Didier - Larousse, v. 17, março
de 1970.
[29]
- A distinção entre posto e pressuposto
pode ser sistematicamente verificada numa dada língua,
o que evidentemente garante a sua validade descritiva.
Assim, quando submetemos um enunciado ? o enunciado
1), por exemplo ? a modificações como
as operadas pela negação e pela interrogação,
verificamos que apenas aquilo que é posto sofre
tal modificação, enquanto que o pressuposto
permanece inalterado. Da mesma forma, a coordenação
e a subordinação que logicamente encadeiam
tal enunciado à continuidade do discurso, concernem
sempre o posto e nunca o pressuposto.
A posição de um enunciado é,
portanto, relativa ao conteúdo informacional
que este enunciado veicula, enquanto que a pressuposição
dispõe as condições para que
tal conteúdo se atualize. Evidentemente, haverá
casos em que os critérios apontados para a
distinção desses dois elementos semânticos
deixarão entrever desvios, que no entanto podem
ser recuperados como índices sistemáticos
de um funcionamento específico da linguagem,
ou, mais precisamente, da função polêmica
da linguagem a que me refiro em “A palavra envolvente”.
Quanto à natureza da pressuposição
lingüística, as posições
são divergentes: desde Frege, passando pelos
trabalhos dos filósofos de Oxford até
mais recentemente Fillmore, tem-se sustentado a definição
dos pressupostos como condição de emprego.
Ducrot, em Dire et ne pas dire, além de discutir
essas opiniões propõe que a pressuposição
seja entendida como um ato específico de linguagem
- o ato de pressupor - cuja função é
dispor certas condições de continuidade
do discurso.
[30]
- Granger. art. cit., p. 263. Na seqüência
desta observação, Granger oscila entre
o termo “retórico” e o termo “pragmático”
no sentido de Morris-Carnap. O que importa, no entanto,
reter é que, seguindo o pensamento do autor,
“pelo jogo dos interpretantes ? que varia evidentemente
e um para outro receptor ? significações
indefinidas são associadas ao sentido determinado
do ‘objeto’, que é, no caso uma
estrutura canônica imposta pela língua
à experiência”.
[31]
- Mais de uma vez, em cursos, Ducrot manifestou seu
interesse por gramáticos como Pierre d’Espagne
e Occam, fato também manifesto não só
em conversas pessoais com o autor, como também
em sua obra, como é o caso de Dire et ne
pas dire.
[32]
- Cf., por exemplo, Weinreich, Uriel. On the semantic
structure of language, p. 148-9. In: Universals of
language. 2.ed. Greenberg, Joseph H. ed. Cambridge
? London, M.I.T. Press, 1966, p. 142-216, quando defende
a investigação do discurso em seus aspectos
lógicos, desde que, entre outras condições,
seja satisfeita a de que não haja aí
nenhuma espécie de normativismo. Diz ele: “O
lingüista descritivo não tem nenhum interesse
em tornar o uso da linguagem ‘mais lógico’
do que ele é - ao contrário, ele deve
explicar, se possível por que ele não
é, com efeito, mais lógico”.
[33]
- A noção de significação
implícita não pode ser reduzida a nenhuma
forma de codificação, ainda que segunda,
sob pena de tornar-se explícita e perder assim
a propriedade que permite, por exemplo, ao locutor,
dizer sem assumir a responsabilidade de ter dito.
Deste modo, a significação implícita
não poderia ser tratada como um fenômeno
de conotação, no sentido em que a retórica,
como codificação das manobras estilísticas,
trata do problema. Cf. Ducrot, Oswald. Dire et ne
pas dire. cit. p. 16 e seg. Barthes, Roland. Élements
de sémiologie. Ed. Avec Le degré
zéro de l’ecriture. Paris, Conthier,
1965. p. 163 e seg.
[34]
- Semiótica e filosofia -Textos escolhidos...
cit. p. 95, Collected Papers, v. 2, bk. 2, chap. 2,
p. 136.
[35]
- Dire et ne pas dire. cit. p. 16-7.
[36]
- A respeito do autor. Semiótica e filosofia
-Textos escolhidos... cit. p. 46.
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