http://www.comciencia.br/reportagens/2005/11/06.shtml
Autor: Sabine
Righetti | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Urânio brasileiro é estratégico Em outubro deste ano, o prêmio Nobel da paz foi destinado ao diplomata egípcio Mohammed ElBaradei, diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA, sigla em inglês), criada em 1957. Ele é responsável por tornar cada vez mais difícil o acesso à bomba atômica. Diante de tal fato, e de uma demanda mundial de energia cada vez maior - o que abre possibilidades para a energia nuclear, um personagem volta a chamar atenção: o urânio. Descoberto no século XVIII e isolado pela primeira vez no século seguinte, esse metal radioativo tem retomado a sua importância e, de acordo com especialistas, já há um "renascimento da industria do urânio". O Brasil, dono da sexta reserva de urânio no mundo pode ter um papel estratégico nesse mercado. De acordo com Alcídio Abraão, pesquisador emérito do Instituto de Pesquisa em Energia Nuclear (IPEN) e um dos criadores do insituto, existe uma idéia disseminada sobre os possíveis danos causados pelo urânio por causa de tragédias como as bombas de Hiroshima e Nagasaki, atiradas pelos Estados Unidos em 1945, e de acidentes como o de Chernobyl (Ucrânia), de 1986, onde uma explosão em um reator matou pelo menos 30 mil pessoas e deixou 3 milhões feridas. "O urânio é muito menos radioativo do que o rádio, por exemplo, mas causa mais temor porque está associado com a produção de bombas nucleares", afirma Abraão. O rádio é retirado das usinas durante o processamento do urânio e depositado em lagoas de rejeito. Só então o concentrado de urânio (urânio bruto), chamado de yellowcake, é levado para enriquecimento. Para Abraão, o risco de poluição ambiental em áreas de exploração do urânio é muito baixa, devido à segurança proporcionada pela tecnologia atual. Mesmo com segurança, sobram motivos para a preocupação com o metal. O engenheiro químico Horst Richard Fernandes, do Departamento de Proteção Radiológica Ambiental, da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), explica que o urânio e seus compostos são altamente tóxicos, tanto pela atividade química quanto pela radioatividade. "Do ponto de vista da radioatividade, há risco de desenvolvimento de câncer em indivíduos expostos mesmo a baixas doses de radiação ionizantes", conta. Existem dois grandes problemas que podem ser destacados na exploração de urânio: a possibilidade de contaminação interna - mais grave, ocorre pela inalação de particulados contendo urânio e do gás radioativo radônio (que é um produto do decaimento radioativo do urânio) - e a contaminação externa, que acontece pela deposição do urânio e seus produtos na pele e cabelo dos trabalhadores. O câncer de pulmão, de pele e do sistema gastro-intestinal são os mais comuns. Por causa dessas e de outras preocupações, e diante da volta dos olhares para as usinas nucleares como a solução para suprir a demanda de energia, o Greenpeace lançou, em abril deste ano, um relatório sobres os riscos dos reatores nucleares. A ONG concluiu, dentre outros, que todos os reatores em operação possuem falhas inerentes muito graves, que não podem ser eliminadas com atualizações tecnológicas no sistema de segurança. De acordo com o documento, um acidente de grande porte num reator de "água leve" (tecnologia usada na maioria dos reatores em operação) pode causar um vazamento de radioatividade centenas de vezes maior que o de Chernobyl, resultando em mais de um milhão de mortes por câncer e na remoção de pessoas em grandes áreas (até 100 mil km²). O Greenpeace é contra o funcionamento das usinas Angra 1 e Angra 2 e contra a construção da Angra 3, que denomina de "aventura nuclear brasileira". Uma das principais críticas do relatório é a vulnerabilidade das usinas em casos de atos de terrorismo ou guerra. Os impactos radiológicos no meio ambiente destacados pelo Greenpeace resultam em aumento das concentrações de poluentes no ar, na água e nos solos. "A água e o ar são considerados meios primários de transporte. Já o solo é meio integrador (ou acumulador), assim como os sedimentos", explica Fernandes. A partir desses compartimentos, os radionuclídeos chegam ao homem por inalação, consumo de água, ingestão de produtos agro-pecuários e ingestão de itens da biota aquática (como peixes). De acordo com o pesquisador da CNEN, uma instalação nuclear só tem autorização de entrar em operação quando todas as vias de exposição foram devidamente quantificadas. "O operador é obrigado a conduzir um programa de monitoramento ambiental e de efluentes", explica. Preocupante, como todo minério Devido aos riscos à saúde principalmente do mineiro, minas de urânio no mundo inteiro tem no aumento da ventilação das galerias (ocasionando uma renovação de ar mais efetiva) uma maneira de reduzir esses riscos "a níveis aceitáveis". Mas a ventilação das minas não é uma preocupação universal, já que ainda não existe um sistema único de normas de radioproteção (proteção do homem contra os efeitos indesejáveis das radiações ionizantes). "A tendência mundial é de que todos os países adotem um único sistema nas suas legislações nacionais, contribuindo para a sua credibilidade e aceitação pública", explica Fernandes. A própria IAEA, que recebeu o Nobel da paz, reúne diferentes países (Estados Membros) que discutem constantemente as mais recentes informações sobre segurança, entre vários outros temas. "Tais discussões acabam levando a publicação de guias de segurança, recomendações e demais documentos técnicos", informa Fernandes. O Brasil é integrante da IEAE e, de acordo com especialistas, tem total condição de estar atualizado com os mais recentes aspectos e requisitos de segurança. No país, a CNEN é a responsável pela normatização e a fiscalização do cumprimento dessas normas, que estão disponíveis no seu site. Cabe a INB (Indústrias Nucleares Brasileiras) - empresa de economia mista subordinada à CNEN e ao MCT - a exploração do urânio, desde a mineração e o beneficiamento primário até a produção e montagem dos elementos combustíveis que acionam os reatores de usinas nucleares. Para Abraão, do IPEN, a exploração realizada no Brasil é segura. O pesquisador cita como exemplo de segurança em matéria de extração de urânio no Brasil, as usinas de Poços de Caldas (MG), atualmente paradas pois a quantidade de urânio está muito baixa. Lá, nunca houve nenhum tipo de acidente. Além de Minas Gerais, as principais regiões do Brasil onde há ocorrência de urânio são Bahia, Ceará e Paraná. Atualmente, as explorações se concentram em Itataia (Ceará) e em Caetité (Bahia). De acordo com Fernandes, um dos principais motivos para a retomada da indústria do urânio foi a diminuição dos estoques do metal na ex-União Soviética, quando o mundo se voltou novamente para o suprimento primário (representado pela mineração e beneficiamento de urânio). Para o pesquisador, o Brasil, que possui cerca de 300 mil toneladas de urânio, precisa compatibilizar de forma precisa os aspectos de produção com os de segurança, o que leva a necessidade de capacitação de pessoal, tanto no setor de produção quanto no setor de segurança. Polêmico enriquecimento O urânio na natureza é constituído por 3 isótopos radioativos com as porcentagens: 99,27% de urânio-238, 0,72% de urânio-235 e 0,0055% de urânio-234. Enriquecer o urânio é extrair átomos ou isótopos de urânio-238 da amostra, que correspondem a sua composição marjoritária, de forma a aumentar a porcentagem do urânio-235. Esse processo é realizado nas usinas de enriquecimento, por meio de ultracentrífugas. O urânio em armamentos nucleares, conforme informa Luiz Paulo Gerlado, da Unisantos, contém geralmente 85% ou mais do isótopo 235. A polêmica sobre o enriquecimento do urânio está diretamente ligada à produção de bomba atômica, tanto que, em 2004, o Brasil recebeu, depois de um longo processo de negociação, auditores da IEAE para inspeção das usinas nacionais. De acordo com Abraão, o IPEN já chegou a receber visitas de políticos desconfiados das atividades do Instituto. "Sabemos que a bomba atômica não afeta apenas o local atingido, mas o mundo todo. Por isso, países como Israel possuem a bomba, mas não a utilizam", conta. E garante: "O Brasil não tem interesse nenhum em produzir a bomba atômica. Se fizermos, precisamos de um foguete para lançá-la. E vamos lançar em quem?", conclui.
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Atualizado em 10/11/2005 | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
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