Atividades
econômicas não podem ameaçar a biodiversidade
Incentivar
atividades econômicas compatíveis com os objetivos
das unidades de conservação, restringindo aquelas
que representam ameaça à biodiversidade, ao mesmo
tempo que se permite a sobrevivência dos moradores locais,
talvez seja a meta ideal a ser perseguida pelos órgãos
responsáveis pela administração desses lugares.
O projeto "Utilização Sustentável dos
Recursos Pesqueiros e Ordenamento do Turismo no Entorno da Estação
Ecológica dos Tupiniquins" tenta seguir nessa linha,
com propostas de proteção à biodiversidade
marinha e desenvolvimento de alternativas sustentáveis, principalmente
aos pescadores artesanais e tradicionais que vivem nos arredores
da estação.
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Projeto
ouviu população tradicional da Ilha do
Cardoso
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Formulado
pelo Centro de Estudos Ecológicos Gaia Ambiental, em parceria
com o Ibama, o Parque Estadual da Ilha do Cardoso e o Núcleo
de Pesquisas do Litoral Sul, do Instituto de Pesca, o projeto será
encaminhado no mês de setembro ao Projeto de Conservação
e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica
Brasileira (Probio) e ao Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA).
Caso seja aprovado, ele será executado no próximo
ano e terá como alvos o município de Cananéia
e parte da área marinha do litoral sul de São Paulo,
abrangendo as ilhas da Figueira, do Cardoso, Castilho, Cambriú
e Bom Abrigo.
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Ilha
da Figueira
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O projeto
deverá apoiar o cultivo de mexilhões da pedra (Perna
perna) no Pontal de Leste, uma pequena vila de pescadores da
Ilha do Cardoso. O cultivo acontece desde 1999, quando foram feitas
as primeiras experiências numa parceira entre o Parque da
Ilha do Cardoso, os pesquisadores do Instituto de Pesca de Cananéia
e Ubatuba e os moradores. Hoje, a vila dispõe, no Canal do
Ararapira, de cinco espinhéis - ou long-lines - sustentados
na superfície da água por bóias, nos quais
as redes de cultivo são amarradas lado a lado. Nessas redes
são colocados os mexilhões-semente, retirados de forma
manejada das pedras da praia da vila do Marujá, também
localizada na Ilha do Cardoso. Segundo a coordenadora do projeto
da estação ecológica, a bióloga Alineide
Lucena, serão instaladas novas estruturas de cultivo e haverá
melhorias das instalações físicas já
existentes para o processamento (como congelar e salgar) do mexilhão.
Moradores da própria comunidade serão capacitados
para processar e escoar o produto. A idéia é vender
o mexilhão produzido para restaurantes e peixarias, e criar
o "Selo Verde", enfocando que o produto é resultado
de uma atividade de manejo feita por moradores tradicionais de uma
unidade de conservação.
Turismo
- Também o turismo receberá atenção
especial do projeto. A Ilha do Cambriú, próxima à
Ilha do Cardoso, que tem tradição na pesca marítima,
foi escolhida para implementar estratégias de organização
da atividade turística. O turismo tem aumentado a cada temporada
e pode impactar o ambiente, prejudicando, no futuro, os próprios
moradores. Serão abertas novas trilhas, sinalizadas as já
existentes e serão discutidas com as comunidades formas de
melhorar a infra-estrutura de recepção ao turista.
Para Lucena, o fato de o parque da Ilha do Cardoso já possuir
um plano de manejo facilitará as atividades. "Tudo aquilo
que for implementado deverá estar de acordo com o plano de
manejo do parque", enfatiza a bióloga.
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Na
Ilha do Cambriú será proibida a pesca esportiva
e incentivado o mergulho contemplativo e a observação
de aves
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O projeto
ainda propõe a capacitação dos moradores da
Ilha do Cambriú para atuarem em ecoturismo e a formação
de uma associação de moradores, além da implantação
de um sistema de comunicação por rádio. Na
Vila do Pontal, a associação também será
proposta, esperando que auxilie na organização da
atividade de cultivo de mexilhões.
Durante
a "Oficina de Planejamento das Ilhas do Litoral Sul de São
Paulo", em fevereiro deste ano, realizada na sede do Ibama,
as instituições ligadas ao meio ambiente e às
atividades econômicas existentes nas ilhas, como turismo e
pesca, fizeram sugestões que foram aproveitadas pelo projeto.
Assim
como a pesca, o turismo é uma atividade incompatível
com a legislação que instituiu as estações
ecológicas. No entanto, ele é bastante praticado na
Estação Ecológica dos Tupiniquins. Operadoras
de turismo levam visitantes às ilhas da estação
para pesca esportiva com linha, mergulho ou, até mesmo, caça
submarina. Há também aqueles que chegam às
ilhas com embarcações particulares. "Queremos
discutir com as operadoras de turismo e pesca esportiva o ordenamento
dessas atividades", afirma Lucena. Na execução
do projeto está prevista a elaboração de um
zoneamento, o qual indicará as áreas em que determinadas
atividades poderão ser desenvolvidas. "A estação
está caminhando para o zoneamento e as operadoras terão
de se encaixar nesse processo".
Espera-se,
por exemplo, impedir a pesca esportiva nas ilhas do Castilho e Cambriú,
e incentivar a prática do mergulho contemplativo e a observação
de aves.
Uma
consultoria para levantamento biológico e de recursos explorados
(em especial pesqueiros) constatou que a fauna do entorno da estação
é muito rica, e que a pesca pode causar impacto nas populações
de todo esse ecossistema. Segundo Lucena, o estudo apoiará
uma das etapas mais importantes do projeto, a implantação
de arrecifes artificiais e obstáculos que impedem a pesca
de arrasto, também chamados de unidades ante-arrasto. O sistema
já foi testado em parte do litoral do Paraná com sucesso.
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Estrutura
para cultivo de mexilhão no Parque da Ilha do Cardoso:
alternativa para as famílias de pescadores
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Os
obstáculos (feitos de tonéis cheios de concreto e
atravessados por pedaços de trilhos de trem) serão
colocados desde o sul da Ilha do Castilho até o norte da
barra de Cananéia. Assim, será criada uma zona de
exclusão de pesca entre as ilhas da parte sul da estação
ecológica, onde não haverá arrasto industrial
e evitada a degradação da biodiversidade do fundo
marinho. Hoje, uma das principais reclamações dos
pescadores tradicionais e artesanais da região é a
baixa produtividade da pesca, conseqüência da ação
das parelhas que arrastam com redes de fundo. Como o arrasto não
é seletivo, pelo menos 50% do que as redes capturam é
descartado.
Com
as unidades ante-arrasto, a produção pesqueira da
região deverá melhorar, beneficiando em especial a
pesca de pequena escala, artesanal ou tradicional. Até mesmo
o turismo ecológico terá suas atividades de mergulho
contemplativo e pesca esportiva valorizadas com a conservação
das populações de peixes marinhos.
Dentro
da zona de exclusão criada pelos obstáculos serão
colocados arrecifes artificiais, que são cubos de concreto
com furos nos quatro lados, servindo de abrigo para a fauna marinha.
O arrecife artificial pode ser entendido como um habitat artificial,
que é colonizado por organismos marinhos. Quem ganha com
a proteção da biodiversidade da Estação
Ecológica dos Tupiniquins são os pescadores artesanais.
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