Entrevistas do mês

Reservas extrativistas e populações tradicionais
Mauro Almeida

A ABA e os laudos antropológicos
Rubem George Oliven

A Funai e o novo Estatuto do Índio
Roque de Barros Laraia

Biodiversidade e Biopirataria na Amazônia
Ilse Walker

Entrevistas anteriores

Biodiversidade e Biopirataria na Amazônia

A Dra. Ilse Walker, 70, é especialista em ecologia aquática na região da bacia do rio Negro e trabalha no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Deixou a Suiça, seu país natal, em 1963, para viver durante 13 anos em países como os EUA, Tasmânia (África), e Inglaterra. Segundo ela a adaptação no Brasil foi tranquila pois foi bem acolhida pelos brasileiros. Sua posição de Professora no Imperial College of London, foi garantida por 4 anos enquanto dedicava-se às pesquisas no Brasil. Gostou mais daqui. O ambiente acadêmico favoreceu sua escolha para fixar-se definitivamente no país. A Dra. Walker, apaixonou-se pela Amazônia e sua cultura, onde mora há 25 anos.
Nesta entrevista, realizada pelo telefone, ela analisa a produção científica e captação de recursos versus a biodiversidade na Amazônia.

Com Ciência - Quais são as consequências da ação da biopirataria na Amazônia para a produção científica?
Ilse Walker - Eu acho que o único valor que nós temos que dar para a biopirataria são as leis de patentes. Hoje em dia não teriam mais a coragem de levar nada daqui, porque existem leis. A legislação é muito importante. Eu lamento imensamente que a comunidade global dos cientistas não tenha se posicionado com mais antecedência sobre a questão das patentes.

Com Ciência - A produção científica é proporcional ao potencial da biodiversidade do país?
Walker -
Isso é uma pergunta muito complexa porque a biodiversidade aqui na Amazônia é tão incrível… Só um exemplo: em um pequeno igarapé tem mais espécies de peixes que a Inglaterra e a Escócia juntas. Na floresta, por hectare, você chega acima de 100-150 espécies de árvores. Então a biodiversidade existente é muito maior do que a que se conhece em outras regiões, talvez exceto a da África. É uma questão de dinheiro. Hoje em dia você (o pesquisador) recebe dinheiro para estudos aplicados em medicina que estão sendo cada vez mais fortalecidos por pesquisas com plantas e animais. O que é mundialmente muito difícil de conseguir dinheiro é para a taxonomia (área que estuda as estruturas anatômicas). Por exemplo, as piranhas que a gente pensa que são conhecidas, ainda não possuem taxonomia clara. Nos últimos anos foram descobertas até novas espécies de macacos. Agora imagine insetos e microorganismos que em sua maioria ainda não são conhecidos…

Com Ciência - Qual é o maior problema que a biodiversidade da Amazônia enfrenta?
Walker -
Eu acho que se fala muito do valor da floresta e que agora está sendo reconhecido, (mas) o que não está sendo discutido é a influência sobre o clima. A Amazônia produz 60% das chuvas da região. E 70% da biomassa de uma floresta é água, quer dizer a biomassa é um reservatório maciço de água. E (se) você corta a floresta, está secando o loco e você perde de imediato toda a biodiversidade da área. Esse é o maior perigo, o desmatamento. Eu acho que é certamente importante a proteção aqui do local, porque a Europa destruiu uma grande parte de sua biodiversidade. Agora isso não significa que você não pode usar a biomassa. Você pode promover o desenvolvimento sustentável.

Com Ciência - O fato do Brasil ter um passado de colonialismo, de exploração, a senhora acha que a própria estrutura econômica e política que acabou se formando no país tem alguma influência na captação de recursos e desenvolvimento da pesquisa?
Walker
-Isso é uma questão de filosofia. Primeiro você tem toda a história, a Europa também foi colonizada pelos romanos há dois mil anos atrás, o novo mundo aconteceu há 500 anos atrás. São fatos históricos que ninguém está seguindo os seus modelos. Tudo é uma questão de ação e reação. O ser humano não está dirigindo nada, só está reagindo. É uma idéia que nós temos que estamos dirigindo… Então, pessoalmente, eu acho que o Brasil está em uma situação extremamente favorável.

Com Ciência - O que falta então?
Walker
- A primeira coisa que precisaria ter, mas não tem, são escolas primárias mais do que universidades. A filosofia inteira é dar uma boa política e educação para o professor da escola primária, pagar razoavelmente, que ele (terá) os dados que ele precisa para ser respeitado. Mas o governo não pode dizer ao cabloco aqui na Amazônia o que ele tem que fazer. Ele faz exatamente o que ele quer. Claro que isso indica planejamento, mas não se pode planejar se o povo não tem percepção.
O pesquisador que é pesquisador, é um fanático. Ele faz pesquisa como pode. Ele vai fazer pesquisa do jeito que sobra, vai trabalhar em outra coisa mas pesquisa sempre tem. O Darwin fez, o Lamarck fez. O Einstein foi contratado por uma firma de patente. Tem que ser virar. Mas o cidadão não pode se virar se ele não tem a base da escola primária. Uma vez adulto, inteligente, ele se vira.

Atualizado em 10/11/00

http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

© 2001
SBPC/Labjor
Brasil