Editorial:
Ciência, Tecnologia e Inovação: desafios e contraponto
Carlos Vogt
Reportagens:
MCT busca construir agenda para a ciência brasileira
Sistema de C & T é gerido por diversas instituições
Fundos garantem injeção de novos recursos à tecnologia
Programas especiais financiam pesquisas
Fapesp é modelo no fomento à ciência e tecnologia
A inovação tecnológica nas grandes empresas
Incubadoras geram empregos e inovações
Comunidade científica faz prévia para conferência nacional
O Brasil tem cientistas, mas faltam empregos
Artigos:
O intinerário da pesquisa no Brasil:
Evando Mirra
Os desafios para transformar conhecimento em valor econômico:
Roberto Nicolsky
Livro Verde pode ampliar conceito de política científica:
Ulisses Capozoli
Interação Rhodia-universidades no Brasil:
Saul D'Ávila
Quando o setor produtivo faz C&T:
Adermerval Garcia
Poema
Bibliografia
Créditos

 

 

Fundos Setoriais garantem injeção de recursos à C&T

Com a proposta de financiar a infra-estrutura, o desenvolvimento e a pesquisa científica e tecnológica de forma clara e a longo prazo, foram criados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, em 1999, os Fundos Setoriais. Entre suas vantagens podem ser listadas a estabilidade ao financiamento, uma vez que este está determinado em lei; a aplicação dos recursos por uma gestão compartilhada; e sua contribuição à redução do desequilíbrio regional. Entretanto, nem toda a comunidade científica considera a criação dos Fundos um avanço na política de C&T. Surgem interpretações várias sobre suas reais finalidades, o que precisa ser definido na busca de um entendimento entre os responsáveis por sua gestão e por seus potenciais parceiros e beneficiários.

Discussões à parte, os Fundos Setoriais irão permitir a injeção de recursos de R$ 1 bilhão ao ano, praticamente dobrando aos recursos geridos pelo Ministério de Ciência e Tecnologia e a previsão é que esse montante chegue a R$ 4,5 bilhões até 2005.

Funcionamento
Os Fundos Setoriais são formados por contribuições incidentes sobre o faturamento das empresas, sobre o resultado da exploração de recursos naturais à União ou da cobrança de royalties pela transferência de tecnologia. Com exceção do Funtel (gerido pelo Ministério das Comunicações), os recursos captados são alocados, em categoria de Programação Específica, no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

O Brasil conta com dez fundos setoriais aprovados e sancionados pelo governo: petróleo e gás (CTPetro), recursos hídricos (CTHidro), energia elétrica (CTEnerg), mineração (CTmineral), espacial (CTespacial), transporte (CTTranspo), informática (CTInfo), integração universidade-empresa (Verde-Amarelo), infra-estrutura (CTinfra) e Funtel. Cada um possui um Comitê Gestor que define diretrizes em suas áreas. Trata-se de um órgão colegiado, constituído por membros de diversos ministérios, do setor produtivo e da comunidade científica.

Os únicos fundos em atividade são o CTPetro, de 1999, e o CTInfra, regulamentado em abril de 2001. Os recursos do CTPetro são provenientes dos royalties da produção do petróleo e do gás natural, sendo 40% dos recursos destinados às regiões Norte e Nordeste e têm por objetivo o financiamento de programas de amparo à pesquisa e ao desenvolvimento tecnológico aplicados à indústria do petróleo. Para o período 2001-2005 os recursos planejados são da ordem de R$900 milhões.

Já os recursos do CTInfra são constituídos por 20% dos valores do FNDCT. A previsão para 2001 é de R$150 milhões, sendo que 30% deste montante deverão ser aplicados em instituições sediadas nas Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O fundo tem como objetivo o fortalecimento da infra-estrutura e de serviços de apoio técnico-científico desenvolvido em instituições públicas de ensino superior, e de pesquisas brasileiras para o desenvolvimento de pesquisadores. O primeiro edital dá prioridade à recuperação da infra-estrutura de pesquisa das universidades e institutos de pesquisa federais, destinando para isso 80% dos recursos. A verba poderá ser usada na recuperação e ampliação de laboratórios, aquisição de equipamentos, compra de material bibliográfico e na construção de instalações. Está previsto para o período 2001-2005 um total de R$1.160 milhão.

No mês de setembro passarão a funcionar os seguintes fundos: CTEnerg, CTMineral e CTHidro. O CTEnerg prevê o financiamento de programas na área de energia, com ênfase na área de eficiência energética e na utilização de fontes alternativas. O CTMineral deverá estimular a atuação da indústria nacional e apoiar o crescimento de pequenas e médias empresas na área mineral. O objetivo do CTHidro é assegurar o financiamento de projetos científicos e de desenvolvimento tecnológico nas áreas de gerenciamento de Bacias Hidrográficas, Limnologia, Hidrologia e Climatologia.

Ainda em fase de regulamentação, estão os fundos Verde-Amarelo - conhecido também por fundo Universidade-Empresa, Telecomunicações, Transporte e Espacial. O Verde-Amarelo deve impulsionar o desenvolvimento tecnológico brasileiro através de projetos de pesquisa cooperativa entre universidades, centros de pesquisa e setor produtivo, reduzindo desta maneira a dependência de tecnologias produzidas no exterior.

O CTEspacial pretende financiar o Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Setor Espacial, principalmente no que diz respeito aos projetos de satélites e lançadores. O CTranspo garante financiamento para programas e projetos com impacto imediato sobre a pesquisa e o desenvolvimento em engenharia civil, engenharia de transportes, materiais, logística, equipamentos e softwares.

A regulamentação do fundo de Informática deverá ocorrer em 2002, tendo como objetivo estimular as empresas nacionais a desenvolverem e produzirem bens e serviços de informática e automação, investindo em atividades de pesquisas científicas e tecnológicas. Para o período 2001-2005, já foram previstos recursos da ordem R$1.320 milhões para Verde e Amarelo, R$700 milhões para CTEnerg, R$120 milhões para CTHidro, R$20 milhões para CTMineral, R$80 milhões para CTEspacial e R$120 milhões para CTTrasnpo. O orçamento do Funtell, em 2001, foi de R$ 240 milhões , com previsão de R$ 570 milhões para o período 2001-2005. Ainda em discussão estão os fundos Saúde, Agronegócios, Aeronáutica e Biotecnologia.

Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
O tipo de gestão dos Fundos Setoriais será inovador. Em junho do ano passado, o ministro Ronaldo Sardenberg anunciou a criação do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, que tem entre as suas atribuições, ser a secretaria técnica de cada fundo. Para o secretário-executivo do MCT Carlos Américo Pacheco, "é extremamente relevante criar uma estrutura permanente de suporte técnico para os fundos e precisamos de uma equipe permanente". Foi planejada para o Centro uma estrutura reduzida, mas com atuação forte e funções estratégicas, e com responsabilidades sobre a prospecção tecnológica, estudos e diagnósticos e imprescindíveis exercícios de acompanhamento e avaliação. A idéia é ter nesse Centro um mecanismo de avaliação para os projetos.

Em 21 de fevereiro, o senador Saturnino Braga apresentou o seu descontentamento em relação à criação do Centro, na tribuna do Senado. Ele declarou que "criar uma nova agência e deixar ao abandono aquela que lá está (Finep), com todo o patrimônio de pessoal muito bem formado, com experiência e tradição, é alguma coisa não-razoável, que contraria o espírito, por exemplo, da Lei de Responsabilidade Fiscal, que vai constituir-se num prejuízo".

A opinião pessoal da presidente da SBPC é de que o Centro é perfeitamente dispensável. Segundo Glaci Zancan, bastava criar um Conselho Deliberativo do FNDCT. "Temo que provoque o esvaziamento do próprio MCT", diz. Essa posição não é da SBPC, já que não houve uma reunião para discutir o assunto.

Salles Filho diz que o sucesso dos fundos depende da ação conjunta de agências, ministérios e pesquisadores

Mas segundo o Superintendente de Planejamento Operacional da Finep-MCT, Sergio Salles Filho, "o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos será instância de ação prospectiva e de avaliação. Portanto, não afetará o papel desenvolvido, hoje, pela Finep ou pelos comitês gestores". Adicionalmente, James Gama, Assessor de Imprensa do Centro de Estudos Estratégicos, esclarece que o mesmo abrigará as ações relativas ao Centro, aos fundos setoriais e aos projetos especiais do MCT. Esse órgão que está em construção deverá secretariar os fundos e não interferirá na definição de suas prioridades. Os Comitês gestores, embora partam de documento com diretrizes fornecidas pelo MCT, são instância deliberativa quanto à definição de prioridades.

Críticas
Sobre a criação dos fundos, entre os pesquisadores que criticam a implantação desses está Roberto Nicolsky, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro do Conselho Empresarial de Tecnologia de Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Para ele, a idéia inicial dos Fundos é boa, porém corre-se o risco de não gerar os avanços tecnológicos que a economia necessita para se tornar mais competitiva, principalmente no comércio exterior.

Um dos pontos mais criticados por Nicolsky é o das empresas não terem acesso direto aos recursos dos Fundos, embora esses recursos tenham sido deduzidos de suas receitas. "A meu ver isso configura uma situação injusta, pois a empresa não pode passar essas deduções para a tarifa por ser classificado de investimento. Mas também não pode usá-los livremente. Isso tem a cara de imposto", declara. A limitação de uso dos recursos por universidades e institutos de pesquisas não possibilita, segundo ele, que os fundos cumpram a sua missão. Ou seja, gerar tecnologia e inovações, posto que esses órgãos fazem apenas pesquisa, enquanto que para se ter uma tecnologia completa é necessário também o componente desenvolvimento no contexto de P&D (Pesquisa & Desenvolvimento).

Glaci Zancan teme que centro de estudos estratégicos esvazie o MCT

A presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Glaci Zancan, acredita que os Fundos Setorias irão alavancar a inovação. Porém ela defende a continuação do financiamento da ciência, sendo contrária ao direcionamento do financiamento apenas para o desenvolvimento tecnológico. Como exemplo de equilíbrio, ela cita a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) que não abandonou os programas anteriores ao acrescentar o financiamento à inovação.

Sergio Salles Filho, Superintendente de Planejamento Operacional da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), não vê riscos de reflexo negativo em áreas de pesquisa não contempladas pelos fundos, já que o Verde-Amarelo pode ser aplicado sem diretriz setorial e amenizará as possíveis distorções do sistema. "Os fundos setoriais representam um rompimento com o sistema até então vigente de financiamento de C&T. Isso leva a alguns conflitos, indagações, a algumas preocupações, mas acima de tudo há uma expectativa extremamente positiva de que essa fonte permanente de recursos reflita de forma significativa gerando inovação no país." Salles Filho, complementa: "o sucesso dos fundos depende da ação concertada entre agências (Finep, CNPq, Secretarias do MCT, Centro de Gestão e Estudos Estratégicos), ministérios e pesquisadores. Os pesquisadores devem estar articulados com empresas, adotar proposta de inovação, ter perspectiva de longo prazo, e utilizar o mecanismo de participação aberta nos comitês gestores."

Atualizado em 10/09/2001

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