Contaminação ameaça a saúde pública    
 
Poluição e saneamento

 

São Paulo é o estado que criou as mais amplas Reservas da Mata Atlântica nos últimos vinte anos. Em contrapartida, é onde mais se tem poluído a natureza. Fonte: Reserva da biosfera.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nem só da falta d'água nasce o problema do abastecimento. A má qualidade da água disponível muitas vezes é um fator determinante no quadro de escassez, sobretudo nas grandes cidades onde a poluição compromete os mananciais e acarreta inúmeros outros problemas, dos quais os mais visíveis são as enchentes e as doenças infecciosas. A gravidade do assunto pode ser percebida pelo que diz o capítulo 18 da Agenda 21 do plano mundial de metas ambientais estabelecido na Eco92: "aproximadamente 80% de todas as doenças de origem hídrica e mais de um terço das mortes em países em desenvolvimento são causadas pelo consumo de água contaminada".

Não é de hoje que a associação água-saúde é reconhecida pela ciência. No artigo "Água e saneamento básico - uma visão realista", o engenheiro Ivanildo Hespanhol, professor da USP/São Carlos, lembra o exemplo de Sócrates, que já na Antigüidade relacionou a deficiência de iodo na água com o aumento da tireóide (hipertireoidismo), causando o bócio.

Cita ainda o famoso estudo epidemiológico de John Snow, que em 1854, analisando a epidemia de cólera em Londres, verificou que a disseminação da doença devia-se à água da bomba de um poço situado na Rua Broad, onde a maior parte das vítimas recolhia água para seu consumo. Mais de 700 pessoas haviam morrido na Rua James Parish, em um período de 17 semanas. Snow estudou detalhadamente seus hábitos e verificou que a maioria se abastecia do poço na Rua Broad. Logo depois, descobriu que um vazamento da linha de esgotos que passava junto ao poço drenava justamente a casa onde havia sido registrado o primeiro caso de cólera, o que o levou a associar a disseminação da doença com a água contaminada. Isso aconteceu uma década antes da teoria de Pasteur sobre a propagação de doenças através de micróbios e três décadas antes da identificação, por Koch, dos organismos patológicos.

Os problemas verificados por Snow, Pasteur e Koch no século XIX continuam atuais, sobretudo nos países em desenvolvimento, onde o saneamento básico atinge pequena parcela da população. Mas a contaminação da água é contornável, desde que se tomem medidas adequadas, a começar pelo respeito ao meio ambiente e pela ocupação racional dos espaços.

Saneamento básico - Segundo Ivanildo Hespanhol, no período 90-94, enquanto a oferta de água mundial ficou estável nas áreas urbanas e apresentou relativo crescimento nas áreas rurais, o saneamento foi totalmente negligenciado durante o período. (Tabela 1). Na América Latina a situação é um pouco melhor que nas outras regiões, mesmo assim a questão do saneamento é precária.

O caso brasileiro não escapa a essa realidade. Em 1994, 85% da população urbana tinha acesso a água potável e apenas 55% desse mesmo grupo tinha cobertura de saneamento. Para a população rural esses números eram muito menores: 31% com acesso a água e 3% a saneamento. A cobertura, é claro, é proporcional à renda. As camadas mais pobres são as que menos têm acesso, principalmente entre os favelados das grandes metrópoles.

Tabela 1 - Abastecimento de água e saneamento em nível global no período de 1990-1994.

Setor
1990 (Pop. em milhões)
1994 (Pop. em milhões)
Tot
Ser
%
Tot
Ser
%
Água
Urbano
1.389
1.145
82
1.594
1.315
82
Rural
2.682
1.342
50
2.789
1.953
70
Total
4.071
2.487
61
4.386
3.268
75
Saneamento
Urbano
1.389
936
67
1.594
1.005
63
Rural
2.682
536
20
2.789
505
18
Total
4.071
1.472
36
4.383
1.510
34
Tot: total da população; Ser: População servida, %: Porcentagem da população servida
Fonte: "Água e saneamento básico - uma visão realista" por Ivanildo Hespanhol.

A água de má qualidade gera altos índices de doenças infecciosas, como esquistossomose, dengue, febre amarela e malária, doenças de pele e doenças diarréicas, cólera e febre tifóide (Tabela 2).

A aplicação de cloro como meio de desinfecção pode reduzir consideravelmente a incidência dessas doenças a um custo relativamente baixo. No entanto, a cloração deve ser feita de maneira controlada, atendendo às exigências da Organização Mundial de Saúde (OMS) que estabelece dosagens adequadas e que não ofereçam riscos à saúde humana. Atualmente a dose de cloro estabelecida é de 250 mg por litro d'água.

A adição de flúor na água também têm contribuído enormemente para a redução de cáries. Segundo Armando Gallo Yahn, Diretor de Operações da Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S.A (Sanasa), na cidade de Campinas (SP), a fluoretação reduziu o número de dentes perdidos, cariados e obturados em 8 mil crianças de até 12 anos de idade. Em 1992, havia uma média de 4,8 dentes cariados por criança e em 1997 o número caiu para 2,6. A OMS esperava que esse índice fosse atingido somente no ano 2002 nos países em desenvolvimento.

Tabela 2 - Doenças relacionadas à água.

Doenças
Número por ano (1993)
Casos de doenças
Mortes
Cólera
297.000
4.971
Febre tifóide
500.000
25.000
Giardíase
500.000
Baixo
Amebíase
48.000.000
110.000
Doenças diarréicas
(idade < ou igual 5 anos)
1.600.000.000
3.200.000
Esquistossomose
200.000.000
200.000

Fonte: Ivanildo Hespanhol - OMS.

Hoje a população urbana brasileira corresponde a 76% e no estado de São Paulo essa taxa cresce para 91%. A tendência é que, conforme a cidade vá se expandido em áreas rurais e periféricas, geralmente de forma não-planejada, os mananciais sejam contaminados com o despejo de esgoto e de lixo. Essa contaminação também pode atingir os aqüíferos através da perfuração de poços sem cuidado específico e através de fossas sépticas que contaminam os lençóis freáticos.

Enquanto aumenta a demanda de água a sua qualidade piora, encarecendo os custos de tratamento. Para que apenas a população urbana tenha total acesso ao abastecimento de água e saneamento, o Ministério do Planejamento e Orçamento estima que serão necessários cerca de 40 bilhões de reais até 2010. Enquanto a solução não chega, a atitude mais barata e ao alcance de todos no momento são as campanhas de conscientização para um uso racional da água, assim como o seu reaproveitamento.

Águas subterrâneas - O caso dos depósitos de lixo e a contaminação das águas subterrâneas também chama atenção. A água da chuva dissolve os resíduos acumulados nesses depósitos e em seguida os carrega para o subsolo, poluindo os poços que servem ao abastecimento urbano. Por isso, os locais de escavação de poços e as áreas que os circundam devem ser muito bem escolhidos e precisam ficar protegidos de rejeitos e substâncias tóxicas. Naturalmente, algumas condições são mais favoráveis.

"No caso de áreas onde ocorrem rochas ígneas, metamórficas ou mesmo rochas sedimentares impermeáveis, o risco de poluição é menor, em função das características físicas das rochas, que também não armazenam água subterrânea. Estes locais são os mais apropriados para a disposição de resíduos poluentes, tais como lixões e aterros sanitários", lembra o professor Celso Dal Ré Carneiro, do Instituto de Geociências da Unicamp.

Carneiro explica que fatores como "tipo de aqüífero, espessura e constituição litológica do material de recobrimento, capacidade de infiltração do solo (relacionado ao teor de argila), e profundidade do nível d'água, são fatores importantes para o planejamento urbanístico de qualquer cidade". Por isso, é importante contar com uma assessoria técnica para a instalação de qualquer poço, mesmo os domésticos.

A participação da população na gestão da água é hoje um desafio para as ONGs e para a sociedade civil. Alguns programas têm sido implementados na tarefa de conscientizar a população quanto ao desperdício e conservação da água ...

   
           
     

Esta reportagem tem
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11
, 12, 13, 14 documentos
Bibliografia | Créditos

   
     
   
     

 

   
     

Atualizado em 10/09/2000

   
     

http://www.comciencia.br
contato@comciencia.br

© 2000
SBPC/Labjor
Brasil