|
|||||||||
|
|||||||||
Investindo no genoma
|
Abrindo espaço para a genômica no Brasil Neste momento em que a mídia divulga com grande destaque o primeiro rascunho completo do genoma humano, o Brasil assiste ao evento na posição de quem entende do assunto. Isto porque, por ação de órgãos de incentivo à ciência e tecnologia, em especial a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o país investiu nos últimos anos na área de genética molecular e pôs o pé no grupo dos países que desenvolvem projetos de seqüenciamento genético. Entrou, por sinal, com o pé direito, pois em fevereiro deste ano tornou-se o primeiro a completar o genoma de uma bactéria que provoca doenças em plantas (fitopatógeno), cujo nome, aliás, acabou se tornando popular: a Xylella fastidiosa. Causadora da praga do amarelinho, a Xylella foi escolhida pela Fapesp como organismo para seu projeto genoma piloto por uma conjunção de fatores. Para citar os mais importantes: pelo fato de não haver no mundo, à época, outra pesquisa de seqüenciamento de um fitopatógeno, sua importância econômica (cerca de 30% dos laranjais paulistas são afetados pelo amarelinho) e o tamanho de seu genoma (2,7 milhões de pares de bases, relativamente pequeno). Prova de que a escolha foi acertada é a fala de Peter Johnson, responsável por um dos maiores programas de financiamento de pesquisa do departamento de Agricultura norte-americano: "Meus caros, tenho para vocês uma boa e uma má notícia. A boa é a de que foi concluído o seqüenciamento do primeiro fitopatógeno no mundo. A má é a de que não fomos nós que fizemos, mas um grupo brasileiro". O reconhecimento da importância da pesquisa vem também pela publicação, este mês, do artigo científico descrevendo os resultados do projeto, na revista Nature, que aliás já havia publicado, em 1997, uma notícia dando conta do início do projeto, com destaque para o ineditismo da pesquisa com a bactéria. A publicação do artigo, como bem sabem os cientistas, é um importante fator de certificação do mérito da pesquisa e certamente fará aumentar as citações internacionais dos pesquisadores envolvidos no projeto e indiretamente da ciência brasileira. Enquanto isso, outros projetos genoma financiados pela Fapesp já estão em andamento. Como conseqüência direta do Genoma Xylella, surgiu, em 1999, o Genoma Xylella Funcional, que busca estudar apenas os genes de caráter patogênico da bactéria, ou seja, aqueles que mantêm relação com a praga do amarelinho. Desta etapa participam cerca de 20 laboratórios, que no prazo de um ano deverão apresentar seus primeiros resultados. Eles foram selecionados entre os cerca de 100 que apresentaram propostas à Fapesp. Como exemplo das pesquisas, há o estudo da biossíntese de goma xantana, substância viscosa produzida pela Xylella e uma das possíveis causas do entupimento dos vasos da laranjeira, o que causa o amarelinho. Outro estudo em curso, utilizando novos métodos de microscopia eletrônica, é o da adesão bacteriana no trato bucal da cigarrinha que transmite a Xylella e sua influência na propagação da doença. Além dos projetos Genoma Xylella e Genoma Funcional, surgiram também aqueles dirigidos a outros organismos. O primeiro deles foi o Genoma Cana, iniciado em julho de 1999, com o objetivo de seqüenciar partes escolhidas do DNA da cana-de-açúcar e identificar cerca de 50 mil genes com características de interesse econômico, como resistência a doenças, metabolismo da sacarose, resistência a geadas e seca. Este projeto, que é coordenado pelo professor Paulo Arruda, da Unicamp, conta também com um financiamento de US$ 500 mil da Copersucar (assim como, no caso da Xylella, participou a Fundecitrus), que disponibilizou seu Centro de Tecnologia para a realização de algumas etapas da pesquisa. Até março deste ano foram depositados nos laboratórios de bioinformática do projeto 68 mil partes seqüenciadas e o objetivo é alcançar 300 mil até julho de 2003. Este prazo será, muito provavelmente, reduzido, devido à maior velocidade de seqüenciamento adquirida com o Genoma Xylella. Do seqüenciamento participam, além do laboratório de bioinformática da Unicamp, coordenado pelos professores João Meidanis e João Setúbal, também o laboratório da Universidade Federal de Penambuco coordenado pela pesquisadora Kátia Guimarães. Quase ao mesmo tempo que o Genoma Cana surgiu o Genoma Câncer, em parceria com o Instituto Ludwig de Pesquisa do Câncer, o primeiro a entrar com um financiamento igual ao da Fapesp na pesquisa (US$ 5 milhões cada). A pesquisa, que é coordenada pelo professor Andrew Simpson, está baseada numa nova técnica de seqüenciamento, chamada ORESTES (Open Reading Frame EST), desenvolvida e patenteada pelo Ludwig. Os dados, que já resultam em 250 mil seqüências de genes, estão disponibilizados no GenBank, onde está a maior parte da informação do projeto Genoma Humano, e num site dedicado a este seqüenciamento. Deste projeto participam cinco centros de seqüenciamento, localizados na USP, Unifesp e USP/Ribeirão Preto. Espera-se chegar, até o final do ano, a 1 milhão de seqüências de genes. Em julho deste ano, o projeto Genoma Câncer contou com um aumento de 60% no orçamento, sendo parte deste montante investido na área de bioinformática e na criação de mais dois bancos de clones. Esse projeto colocou o Brasil no segundo lugar no ranking do países que mais descreveram seqüências genéticas expressas em cânceres, ficando atrás somente do National Cancer Institute (NCI), que desenvolve pesquisa homóloga nos Estados Unidos. Finalmente, o mais recente dos projetos genoma é o Genoma Xanthomonas, coordenado pelo professor Fernando Reinach, que procurará seqüenciar o código genético da bactéria Xanthomonas axonopodis pv citri. Ela é causadora do cancro cítrico e parente próxima da Xylella fastidiosa. Seu genoma, porém, é aproximadamente duas vezes maior que o desta última, mas deverá ser concluído em menos tempo. A comparação entre ambos gerará informações importantes sobre semelhanças e diferenças de metabolismo, ciclos de vida e interação com seu hospedeiro comum, os citros (sobretudo a laranja). A organização do projeto inclui 12 laboratórios, sendo os dois principais da USP e da Unesp/Jaboticabal, onde serão armazenadas, processadas, comparadas e anotadas as seqüências de DNA, usando o software do projeto da Xylella. Toda a parte de bioinformática será feita pela Unicamp. Os outros laboratórios de seqüenciamento serão selecionados por um comitê da Fapesp e depois agregados à rede Onsa, formada por todos os laboratórios que participam de projetos Genoma financiados pela agência. Desse modo, o Genoma Xylella e seus "descendentes" consolidam uma etapa importante da pesquisa científica no país e abrem campo para novos projetos... |
||||||||
|
|||||||||
Atualizado em 06/07/00 |
|||||||||
http://www.comciencia.br |