Criacionismo nas escolas é aberração legal e pedagógica, diz deputado
Filho de família judia, o deputado Carlos Minc (PT-RJ) considera que o ensino do criacionismo nas escolas públicas do Rio de Janeiro é uma volta à Idade Média. Minc é contra o ensino religioso confessional e acredita que as aulas de religião, de modo geral, não são necessárias.
Ele também é responsável pelo projeto que alterava a lei de autoria do ex-deputado Carlos Dias (PP-RJ). O projeto de lei previa que as aulas de religião, de caráter facultativo, fossem ministradas do ponto de vista histórico-antropológico. O plenário da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) chegou a aprovar o projeto de lei, em 16 de outubro de 2003, que foi, no entanto, vetado pela governadora Rosinha Garotinho.
ComCiência - Quais foram as alterações propostas em relação à lei estadual 3459/00, de autoria do ex-deputado Carlos Dias?
Carlos Minc - Na verdade, quando foi apresentado o projeto de lei do ex-deputado Carlos Dias, que implementava o ensino religioso confessional, isto é, por religião, fizemos emendas contrárias. Quando tal aberração foi aprovada, fizemos um projeto de lei alternativo para que o ensino religioso obedecesse à lei federal, sendo não confessional. Pelo nosso projeto, ele poderia ser ministrado por professores de quaisquer disciplinas, desde que devidamente capacitados. Certamente, professores formados em história, filosofia, sociologia poderiam dar noções de religião sob o enfoque antropológico.
ComCiência - O projeto apresentado pelo senhor foi vetado pela governadora do Rio de Janeiro. Em que situação se encontra hoje esse projeto?
Minc - O projeto foi vetado e, devido ao rolo compressor governista, a Assembléia, que o havia aprovado por amplíssima maioria, manteve o veto da governadora, chancelando assim a lei anterior.
ComCiência - Na sua opinião, a instituição do ensino religioso nas escolas públicas fere o princípio do Estado laico?
Minc - Fere. Além disso, o Estado tem que zelar pela legislação, defendendo o princípio da liberdade religiosa. Até por isso as escolas públicas não podem ensinar religião sob o enfoque confessional.
ComCiência - Do modo como está determinado por lei, é possível desvincular o ensino religioso de uma ou outra doutrina religiosa? Como atender as diferentes demandas de uma sociedade multireligiosa como a brasileira?
Minc - É impossível cumprir a Constituição e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) com a lei estadual em vigor. Para atender à lei e à cultura da sociedade brasileira o ensino de religião nas escolas públicas, caso existisse, deveria ter base histórico-antropológica.
ComCiência - Na sua opinião, as aulas de religião no ensino público, de modo geral, são necessárias?
Minc - Não. Infelizmente, falta tanta coisa nas escolas públicas que não deveria ter sido dada tal prioridade ao assunto. Acredito que haja outros interesses por trás do ensino religioso confessional defendido pela Igreja Católica conservadora.
ComCiência - Como o senhor vê a inclusão do criacionismo no currículo escolar? O senhor é partidário das críticas que apontam a incorporação do criacionismo na ementa do ensino religioso como estratégia para conseguir apoio político de lideranças religiosas?
Minc - Trata-se de uma aberração legal e pedagógica. É claro que o oportunismo político ultrapassa fronteiras éticas e morais e pode se utilizar do atraso para conquistar apoio político de lideranças religiosas.
ComCiência - O ensino das teorias evolucionista e criacionista nas escolas pode confundir os alunos?
Minc - Pode sim. Por isto, trata-se de uma aberração pedagógica.
ComCiência - O senhor tem religião? Qual?
Minc - Sou filho de família judia.
ComCiência - O senhor acredita na teoria do evolucionismo?
Minc - Não é questão de credo pessoal. Trata-se de ciência e, mesmo acreditando que até as "verdades" científicas são provisórias, o evolucionismo é a teoria na qual todos acreditamos. O absurdo atual é o ensino do criacionismo em escolas públicas, desautorizando a teoria evolucionista. É o caminho de volta à Idade Média, com o risco de se incentivar as crianças a queimar os livros de Darwin.
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