Uso de luzes para a saúde: Terapia Fotodinâmica

Por Vanderlei Salvador Bagnato, Mirian Denise Stringasci, Michelle Barreto Requena e Natalia Mayumi Inada, do Instituto de Física de São Carlos, Universidade de São Paulo

A terapia fotodinâmica

A terapia fotodinâmica (TFD) é modalidade terapêutica que vem sendo cada vez mais conhecida e utilizada, com aplicações tanto no tratamento de infecções causadas por microrganismos quanto de lesões malignas e pré-malignas (1).

A TFD utiliza um fotossensibilizador (FS), a luz no comprimento de onda adequado (cor) e moléculas de oxigênio presentes nas células. O FS deve ser seletivo e acumular preferencialmente nas células alteradas ou infectadas, de acordo com a aplicação terapêutica. A forma da entrega e o tempo de incubação também variam de acordo com o FS e o tratamento utilizado. Após o período de biodistribuição do FS, o local é iluminado para excitar a molécula do FS que, por sua vez, pode transferir energia às moléculas de oxigênio (2), formando espécies reativas capazes de causar morte celular seletiva (3,4).

As propriedades de fluorescência características do FS e seu acúmulo preferencial em células alteradas também podem favorecer o uso de técnicas de diagnóstico óptico (5,6). As regiões com maior acúmulo de FS apresentam maior intensidade de fluorescência enquanto regiões com menor acúmulo apresentam fluorescência menos intensa (7).

O comprimento de onda utilizado no tratamento deve ser escolhido de acordo com a absorção do FS e, em casos de FS’s com mais de uma região de absorção, o comprimento de onda também pode ser escolhido de acordo com a profundidade que se deseja alcançar no tratamento. Em tratamentos nos quais o alvo é mais superficial, é comum que se opte por comprimentos de onda na região do azul (400 a 450 nm) que tem baixa penetração no tecido biológico; enquanto que no tratamento de lesões mais espessas costuma-se utilizar irradiação na região do vermelho/infravermelho (600 a 850 nm) que atinge maior profundidade (2,8,9).

Luzes para as áreas da saúde

Diversas são as áreas em que a Terapia Fotodinâmica atua muito bem, tanto para o diagnóstico óptico, como para o tratamento de diversas doenças, onde destacamos a Neoplasia Intraepitelial Cervical, ou NIC, de alto e baixo graus. São lesões precursoras do câncer de colo uterino e causadas pelo vírus HPV (Human papillomavirus) oncogênico (10). Nosso grupo de pesquisa tem experiência há mais de dez anos em pesquisa clínica oferecendo tratamento individualizado para as pacientes portadoras das NICs de alto grau com a TFD, cujo protocolo é de custo e risco menores que os da cirurgia de alta frequência (CAF), além de ser indolor, preservando o colo uterino e diminuindo a incidência de casos de câncer cervical. Na Figura 1a apresentamos o equipamento CerCa 150 System® produzido na cidade de São Carlos (SP) (MMOptics) e que possui as plataformas para o diagnóstico da fluorescência do FS e de tratamento com LEDs emitindo na cor vermelha (630 nm). Em apenas 21 minutos de iluminação do colo uterino e em poucas sessões, a paciente recebe o tratamento ambulatorial, podendo retomar as atividades cotidianas no mesmo dia e com uma diminuição significativa da carga viral (11).

Figura 1. a) CerCa 150 System® (12) e b) LINCE. Imagens do manual forncecido pela empresa MMOptics.

 No contexto TFD no Brasil, nosso grupo de pesquisa desempenhou um papel pioneiro no seu desenvolvimento para o tratamento de câncer de pele não melanoma e de lesões pré-cancerígenas de pele, como a queratose actínica. Os protocolos clínicos foram avaliados com o uso do sistema comercial LINCE (Figura 1b) também da empresa MMOptics, uma plataforma desenvolvida para realizar o tratamento (630 nm) e auxiliar no monitoramento da fluorescência (450 nm) do FS durante o tratamento. (13)

Em 2023, conquistamos a aprovação da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde) para a implementação da TFD no tratamento de lesões iniciais de carcinoma basocelular. Nesse procedimento, um creme é aplicado no paciente, aguarda três horas para que o FS se acumule na lesão e, em seguida, aplica-se a luz. Uma semana após o tratamento, o processo é repetido. (13)

Alternativamente, desenvolvemos um protocolo que permite a realização das duas sessões no mesmo dia, com resultados equivalentes, eliminando a necessidade de uma segunda visita ao hospital. Nesse caso, após a primeira irradiação, o paciente recebe uma camada adicional de creme, aguarda uma hora e meia, e a segunda sessão com luz é realizada (14,15).

Visando proporcionar maior conforto ao paciente e otimizar a rotina ambulatorial, nosso grupo está avaliando um novo protótipo de irradiação. Este dispositivo, de baixo custo e portátil, permite que o paciente passe menos tempo no hospital durante o tratamento. Após a primeira sessão de luz, o paciente recebe o creme e o dispositivo portátil é posicionado sob a lesão e o paciente é liberado para deixar o hospital, ligando o dispositivo uma hora e meia depois e mantendo-o por duas horas (16). Essa inovação não apenas amplia o acesso à terapia, mas também confere aos pacientes a autonomia de realizar parte do procedimento no conforto de seus lares, representando uma revolução na abordagem terapêutica.

Além dos dispositivos de irradiação, um avanço significativo na TFD é o uso pioneiro de microagulhas dissolvíveis com ácido aminolevulínico. Estudos pré-clínicos em andamento indicam que essa abordagem inovadora pode ampliar as possibilidades terapêuticas e melhorar a eficácia do tratamento, permitindo a entrega da medicação em maior profundidade em comparação com o uso de creme (17).

Figura 2. Imagem de microscopia eletrônica de varredura de microagulhas dissolvíveis contendo ácido aminolevulínico.

Referências:

  1. Lehmann P. Side effects of topical photodynamic therapy. Der Hautarzt [Internet]. 2007 Jul 1;58(7):597–603. Available from: http://link.springer.com/10.1007/s00105-007-1363-4
  2. Wilson BC, Patterson MS. The physics, biophysics and technology of photodynamic therapy. Phys Med Biol [Internet]. 2008 May 7;53(9):R61–109. Available from: https://iopscience.iop.org/article/10.1088/0031-9155/53/9/R01
  3. Bagnato VS. Novas técnicas ópticas para as áreas da saúde. Livraria da Física, editor. 2008.
  4. Robertson CA, Evans DH, Abrahamse H. Photodynamic therapy (PDT): A short review on cellular mechanisms and cancer research applications for PDT. Vol. 96, Journal of Photochemistry and Photobiology B: Biology. 2009. p. 1–8.
  5. Torezan L, Niwa ABM, Neto CF. Terapia fotodinâmica em dermatologia: Princípios básicos e aplicações. Vol. 84, Anais Brasileiros de Dermatologia. 2009. p. 445–59.
  6. MacCormack MA. Photodynamic Therapy. Vol. 22, Advances in Dermatology. 2006. p. 219–58.
  7. Valentine RM, Ibbotson SH, Brown CT a, Wood K, Moseley H. A quantitative comparison of 5-Aminolaevulinic acid- and methyl aminolevulinate-induced fluorescence, photobleaching and pain during photodynamic therapy. Photochem Photobiol. 2011;87:242–9.
  8. de Berker D, McGregor JM, Mohd Mustapa MF, Exton LS, Hughes BR. British Association of Dermatologists’ guidelines for the care of patients with actinic keratosis 2017. Br J Dermatol. 2017;
  9. Piacquadio DJ, Chen DM, Farber HF, Fowler, Jr JF, Glazer SD, Goodman JJ, et al. Photodynamic Therapy With Aminolevulinic Acid Topical Solution andVisible Blue Light in the Treatment of Multiple Actinic Keratoses of the Faceand Scalp. Arch Dermatol [Internet]. 2004 Jan 1;140(1). Available from: http://archderm.jamanetwork.com/article.aspx?doi=10.1001/archderm.140.1.41
  10. Clifford G, Franceschi S, Diaz M, Muñoz N, Villa LL. Chapter 3: HPV type-distribution in women with and without cervical neoplastic diseases. Vaccine. 2006;24(SUPPL. 3):26–34.
  11. de Castro CA, Lombardi W, Stringasci MD, Bagnato VS, Inada NM. High-risk HPV clearance and CIN 3 treated with MAL-PDT: A case report. Photodiagnosis Photodyn Ther [Internet]. 2020 Sep;31:101937. Available from: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S157210002030291X
  12. Inada NM, Buzzá HH, Leite MFM, Kurachi C, Trujillo JR, de Castro CA, et al. Long Term Effectiveness of Photodynamic Therapy for CIN Treatment. Pharmaceuticals [Internet]. 2019 Jul 12;12(3):107. Available from: https://www.mdpi.com/1424-8247/12/3/107
  13. Buzzá HH, Moriyama LT, Vollet-Filho JD, Inada NM, da Silva AP, Stringasci MD, et al. Overall Results for a National Program of Photodynamic Therapy for Basal Cell Carcinoma: A Multicenter Clinical Study to Bring New Techniques to Social Health Care. Cancer Control. 2019;
  14. Ramirez DP, Moriyama LT, Oliveira ER De, Inada NM, Bagnato VS, Kurachi C, et al. Single visit PDT for basal cell carcinoma – A new therapeutic protocol. Photodiagnosis Photodyn Ther. 2019;26(March):375–82.
  15. Salvio AG, Veneziano DB, Moriyama LT, Inada NM, Grecco C, Kurachi C, et al. A new photodynamic therapy protocol for nodular basal cell carcinoma treatment: Effectiveness and long-term follow-up. Photodiagnosis Photodyn Ther [Internet]. 2022 Mar;37:102668. Available from: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1572100021004853
  16. Salvio AG, Stringasci MD, Requena MB, Bagnato VS. The use of a portable device for photodynamic therapy at home decreasing the patient’s stay at hospital for small nodular basal cell carcinoma treatment. Photodiagnosis Photodyn Ther [Internet]. 2023 Mar;41:103449. Available from: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S157210002300176X
  17. Requena MB, Permana AD, Vollet‐Filho JD, González‐Vázquez P, Garcia MR, De Faria CMG, et al. Dissolving microneedles containing aminolevulinic acid improves protoporphyrin <scp>IX</scp> distribution. J Biophotonics. 2021 Jan;14(1):jbio.202000128.