Por Sarah Siqueira de Oliveira, Júlio Cury Hoffmann, Liandra de Oliveira Barreto e Sávio Cunha Costa
Os artrópodes, em especial os insetos, estão presentes no cotidiano, sejam como alimento, vetores de doenças, animais que picam e ferroam ou apenas animais bonitos e coloridos que atraem a atenção e embelezam a paisagem.
A ferroada do escorpião é sempre letal? As aranhas são venenosas? As baratas transmitem doenças? Para cientistas biólogos essas perguntas são rotineiras e as respostas estão na ponta da língua. Depende de quem foi ferroado pelo escorpião, se um adulto ou uma criança, da relação peso da vítima e volume de veneno inoculado. Sim, todas as aranhas são venenosas, mas uma minoria tem capacidade de envenenar os seres humanos. Sim, as baratas transitam das redes de esgoto urbanas para as nossas residências e podem carregar vírus e bactérias causadores, por exemplo, de hepatite A, febre tifoide e diarreia.
Alguns insetos são também lendários e instigam a curiosidade sobre as espécies animais que ocupam o planeta e como elas interagem com as outras. É o caso da jequitiranobóia, que no Brasil é conhecida como inseto portador de um veneno mortal, mas que se alimenta de seiva de planta e não oferece risco aos seres humanos.
Saiba outras curiosidades sobre esses animais:
Os insetos dormem?
O sono desempenha um papel muito importante na vida dos animais e com os insetos não seria diferente. Ele reabastece as reservas de energia esgotadas durante a vigília (momento em que o animal está acordado), faz parte da consolidação das memórias, está envolvido em processos hormonais e imunológicos e regula a temperatura corporal (termorregulação).
Um estudo feito com a mosca doméstica, Drosophila melanogaster (Meigen), mostrou que as moscas, em um determinado momento do dia, ficavam paradas durante cinco minutos, o que seria o momento do sono, e, durante esse período, elas quase não respondiam aos estímulos externos. Em um experimento do trabalho, elas foram privadas do sono e, quando podiam dormir, dormiam por mais tempo para repor o sono perdido.
Então sim, os insetos dormem, mas não possuem um sono parecido com o dos seres humanos, porque a anatomia e algumas substâncias neuroquímicas relacionadas ao sono não existem em insetos, devido às diferenças estruturais do sistema nervoso.
Larvas que se alimentam de cadáveres também podem se alimentar de pessoas vivas?
Os animais que se alimentam de cadáveres são chamados de necrófagos. As moscas necrófagas, pertencentes à ordem Diptera, são um dos primeiros organismos a chegar aos cadáveres, atraídas pelo odor. Depois de atraídas, elas fazem a oviposição dos ovos. Destes ovos, posteriormente, as larvas eclodem, saem e se alimentam do cadáver.
Existe uma doença chamada miíase que é uma infestação em vertebrados vivos causada por larvas de moscas que podem se alimentar do tecido vivo (larvas biontófagas) ou tecido morto/lesionado (larvas necrófagas). Portanto, é possível que larvas que se alimentam de cadáveres também possam se alimentar de pessoas vivas quando houver um tecido lesionado. As famílias de moscas consideradas necrófagas que geralmente estão relacionadas com miíases são Calliphoridae, Muscidae, Fanniidae, Sarcophagidae e Piophilidae.
Apesar de essas larvas causarem ojeriza, elas podem ser utilizadas em uma técnica médica chamada de terapia larval, se alimentando do tecido necrosado, promovendo o crescimento tecidual e melhorando a cicatrização. As mais utilizadas são pertencentes à família Calliphoridae.
O “pó” das asas da borboleta causa cegueira?
O que seria o “pó” da asa da borboleta? Para descobrir o que é, é necessário entender como as asas são estruturadas.
As borboletas possuem dois pares de asas membranosas (ou seja, quatro asas) revestidas, total ou parcialmente, por escamas. Em algumas espécies além das escamas, encontram-se cerdas em forma de espinhos. Essas escamas constituem o chamado “pó” que se prende aos dedos quando se toca nas asas das borboletas.
Essas escamas, quando levadas aos olhos, causam a mesma reação que qualquer corpo estranho – como a poeira – causando a irritação, que é um mecanismo para eliminar aquele corpo. Desse modo, é mentira que o “pó” das asas das borboletas causa cegueira.
Existem baratas-d’água que se alimentam de tartarugas, sapos e serpentes?
Sim, existem! Mas as baratas-dágua são hemípteros, pertencentes à família Belostomatidae, sendo mais próximas dos barbeiros e marias-fedidas do que das baratas urbanas comuns. Algumas delas, consideradas gigantes (com 10 centímetros ou mais), já foram registradas no Japão se alimentando de tartarugas, serpentes e peixes. O primeiro registro de predação com tartarugas ocorreu em 2011 pelo pesquisador japonês Shin‐ya Ohba. Neste ano, o mesmo pesquisador realizou um trabalho sobre a ecologia desses hemípteros, fazendo uma revisão sobre as relações predador-presa do grupo com outros animais.
Esses percevejos gigantes habitam locais de água doce, como campos de arroz, pântanos, lagoas, rios e incluem cerca de 150 espécies pelas áreas subtropicais e tropicais do mundo, incluindo o Brasil. A espécie mais estudada é Kirkaldyia deyrolli (Vuillefroy), uma das nativas do Japão e predadora do topo da cadeia em campos de arroz e áreas alagadas. As maiores espécies são Lethocerus grandis (Linnaeus) e Lethocerus maximus (De Carlo) e vivem na América do Sul.
Esses belostomatídeos possuem pernas dianteiras raptoriais para capturar animais e injetam enzimas que decompõem o tecido e, possivelmente, substâncias químicas anestésicas que ainda são pouco conhecidas.
As moscas e mosquitos vivem apenas um dia?
Não. As milhares de espécies de moscas e mosquitos apresentam variação quanto ao tempo do ciclo de vida, mas não há registro de espécies que vivam apenas um dia. As moscas e mosquitos possuem um ciclo de vida do tipo holometábolo, ou seja, envolve as fases de ovo, larva, pupa e adulto com diferenciação de nicho, e cada fase dura um tempo específico. Em geral, os ciclos de vida são em torno de 30 dias. Mas varia bastante. Há espécies de mosquitos da família Chironomidae, da Antártida, que podem viver anos, e a espécie Aedes aegypti (Linnaeus), que duram, aproximadamente, 10 dias.
Quanto tempo vive uma cigarra? O “canto” da cigarra chama chuva?
As cigarras adultas são vistas apenas em determinadas épocas do ano e levam bastante tempo para se desenvolverem. As ninfas vivem em baixo do solo, absorvendo seiva da raiz. O conteúdo da seiva absorvida é pobre em açúcares, o que seria responsável pelo seu lento desenvolvimento. As espécies Magicicada tredecim (Walsh & Riley) e Magicicada septendecim (Linnaeus) da América do Norte se destacam pelo tempo de desenvolvimento de 13 e 17 anos, respectivamente. Porém as espécies da região tropical geralmente possuem tempo de geração mais curto, pois há maior abundância de recursos e estações do ano menos acentuadas, em que as árvores fazem fotossíntese o ano todo.
A espécie mais comum no Brasil é a Carineta fasciculata (Germar) ou cigarra-do-cafeeiro. As ninfas deixam o solo antes de último estágio de desenvolvimento para se tornarem adultas. Geralmente este processo ocorre quando se iniciam as primeiras chuvas após a estação seca, pois o solo está mais úmido e menos compactado, facilitando que saiam das raízes e passem a se alimentar de seiva nos troncos das árvores. Por esta razão os machos “cantam” no início da estação chuvosa, primavera e verão: para atrair as fêmeas. O som é produzido por um par de timbales, estruturas localizadas no segmento abdominal. O acasalamento ocorre e os adultos morrem pouco tempo depois de os ovos terem sido depositados na terra para se iniciar um novo ciclo.
Sarah Siqueira de Oliveira é bióloga, professora da Universidade Federal de Goiás (UFG) e do Programa de Pós-graduação em Biodiversidade Animal da UFG. oliveira.sarahcv@gmail.com.
Júlio Cury Hoffmann é ecólogo e analista ambiental e doutorando do Programa de Pós-graduação em Biodiversidade Animal da UFG. Bolsista Capes. j.cury.h@gmail.com.
Liandra de Oliveira Barreto é bióloga e mestranda do Programa de Pós-graduação em Biodiversidade Animal da UFG. liandra454@gmail.com.
Sávio Cunha Costa é biólogo e mestrando do Programa de Pós-graduação em Biodiversidade Animal da UFG. Bolsista Capes. saviocunhacosta@gmail.com.