Por Bruno de Sousa Moraes, Camila Pissolito e Guilherme Henrique Vicente
Com dados assustadores e problemas como aquecimento global, instabilidade política e superpopulação, qual o futuro da humanidade? Até quando a Terra será o lugar que chamamos de “lar”? Se o futuro não parece nada promissor, o que podemos fazer para sobreviver a ele?
Dia 2 de agosto de 2017. Esta foi a data em que se esgotaram os recursos naturais que o planeta é capaz de repor em um ano. O chamado “Dia da sobrecarga da Terra” é calculado pela ONG Global Footprint Network e chega cada vez mais cedo: em 2016, foi em 8 de agosto. A primeira vez que a humanidade usou todos os recursos naturais produzidos antes de 31 de dezembro foi em 1970 e, desde então, vivemos numa espécie de “cheque especial” ecológico.
Dois minutos e meio para a meia noite. É o que aponta o “relógio do apocalipse”, criado pelo Boletim dos Cientistas Atômicos (BPA, na sigla inglês). A meia noite representa o apocalipse e a última vez que estivemos tão próximos do colapso foi em 1953, após Estados Unidos e URSS testarem armamentos termonucleares. O relógio não existe como objeto, mas é uma espécie de alerta para a proximidade de eventos cataclísmicos – que podem destruir a humanidade.
Com esses dados assustadores e problemas como aquecimento global, instabilidade política e superpopulação, qual o futuro da humanidade? Até quando a Terra será o lugar que chamamos de “lar”? Se o futuro não parece nada promissor, o que podemos fazer para sobreviver a ele?
Caminhando para o abismo
Todos os anos são emitidos cerca de 50 bilhões de toneladas de gases de efeitos estufa na atmosfera, que até agora já elevaram a média da temperatura global em cerca de 1º C em relação ao período pré-industrial.
Assinado em 2015, o Acordo de Paris prevê que todos os países signatários adotem atitudes que restrinjam a poluição e façam com a temperatura global cresça no máximo 2º C até o final do século. Porém, a saída dos Estados Unidos, segundo maior emissor de gases de efeito estufa, pode representar um enfraquecimento no tratado e eliminar as chances de limitar os prejuízos causados pelo aquecimento do planeta.
O estrago, no entanto, já parece estar feito. “O clima do futuro será, portanto, indubitavelmente mais adverso para nossas sociedades. O quão adverso ainda não é possível saber. Também é impossível dizer se nossas sociedades serão capazes de evitar a ultrapassagem deste limiar crítico”, declara Luiz Marques, sociólogo e professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp.
Sem nenhuma atitude, a humanidade pode ter que enfrentar, em um futuro próximo, a elevação do nível dos oceanos e eventos climáticos extremos, que causariam, dependendo do lugar, excesso ou falta de chuva e, por consequência, danos à produção de alimentos e ao acesso à água.
Marques, também fundador do grupo Crisálida (Crises socioambientais, labor interdisciplinar, debate & atualização), aponta ainda que se não houver um radical ajuste de conduta nos próximos anos, haverá um aquecimento global médio catastrófico, de 3o C a 6o C acima do período pré-industrial.
Além disso, somos muitos e consumimos demais. A Terra é o lar de 7,4 bilhões de humanos, a maioria deles inseridos em uma lógica de consumo extremamente voraz. “O sistema econômico e cultural nos diz que devemos consumir certos tipos de alimentos, comprar determinados produtos, renovar os estoques de roupas e gadgets com frequência, ao sabor do mercado.
Por fim, somos violentos e instáveis. Quando havia a sensação de que o temor de um “inverno nuclear” causado pelo conflito entre duas grandes potências havia terminado com o fim da Guerra Fria, a ascensão de líderes populistas, a eclosão de conflitos armados e o acesso a armas nucleares, químicas ou biológicas trouxe de volta o receio de que a humanidade tenha um destino nada glorioso: a autoaniquilação.
Salvando a própria pele
O primeiro passo para que o Homo sapiens não vire história é a mudança de atitude. Para Zulmira Coimbra, bióloga da conservação e documentarista, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, deveríamos aproveitar a diminuição da natalidade na maior parte do globo – ainda que estimativas indiquem que chegaremos aos 10 bilhões em 2050 dog training pads – para alterar a maneira de nos relacionarmos com a natureza, repensando, inclusive, a alimentação. Para ela, diminuir o consumo de carne já seria de grande valia.
A agropecuária é responsável pela emissão de 69% dos gases de efeitos estufa no Brasil, de acordo com dados do Observatório do Clima, publicados em 2016. Entram nessa conta as emissões produzidas pelos rebanhos, pelos dejetos e na produção de fertilizantes, além do desmatamento. “As pessoas não têm necessariamente de se tornar vegetarianas ou veganas. A simples redução no consumo já reduz o impacto no planeta e é algo que podemos fazer”, sugere Coimbra. Nesse processo, a transição para uma matriz energética menos dependente de combustíveis fósseis também se torna fundamental.
Porém, tanto as pequenas atitudes individuais quanto os grandes acordos globais para minimizar o aquecimento global têm um inimigo: o tempo. “A janela de oportunidade para desviar de um colapso socioambiental de proporções insondáveis está se fechando muito rapidamente”, afirma Marques. “O colapso que vemos pela frente difere dos das civilizações passadas pelo fato de ser o primeiro da história humana ao qual se avança conscientemente, sem que se possa, ao menos até agora, deter a engrenagem socioeconômica que nos impele em sua direção”.
Odisseia no espaço
Diante de todas essas ameaças, a chance de o planeta se tornar um lugar inóspito para a vida é grande no curto prazo e quase uma certeza no longo prazo. Desta forma, procurar alternativas para o futuro se torna necessário. E a colonização de outros planetas pode ser uma das saídas, por mais que ideias desse tipo ainda estejam mais no campo da ficção científica.
Stephen Hawking, um dos mais proeminentes cientistas do século XX, declarou algumas vezes a necessidade de a humanidade se tornar uma civilização interplanetária. Em entrevista ao jornal El País em 2014, ele afirmou que a sobrevivência da raça humana dependerá da capacidade para encontrar novos lares em outros lugares do universo, pois o risco de que um desastre destrua a Terra é cada vez maior. No mesmo ano, ele reforçou tal necessidade em discurso no Starmus Festival, na Noruega. Hawking ainda disse que a humanidade precisa construir uma base lunar em 30 anos e chegar a Marte até 2025, como relata a BBC. Para ele, isso poderia dar uma “sensação de propósito” para nossa espécie.
Em meio a vastidão do espaço, Vênus é mais próximo, mas a pressão atmosférica e a temperatura fazem de lá um lugar inabitável em qualquer circunstância. Por isso Marte parece ser a melhor opção como segunda casa, pelo menos nos próximos anos. De acordo com Cássio Barbosa, doutor em astrofísica pela USP, a ideia seria “estabelecer colônias em Marte com ambiente propício como o da Terra”.
As missões não tripuladas que já visitaram Marte estudam as condições que permitam obter oxigênio para a respiração e água do subsolo para retirar energia através do hidrogênio. Entretanto, os custos para tamanha empreitada são exorbitantes. Barbosa acredita que deveria haver um consórcio entre os países para bancar os investimentos necessários, que hoje ainda são proibitivos. “Em um primeiro momento seria como se fosse uma estação na Antártida, em forma modular, em ambiente fechado, para depois pensar em grandes redomas que criam um ambiente iluminado naturalmente, aberto”.
Entretanto, precauções com a radiação do Sol – que não há na Terra devido à proteção natural – elevam o custo e a logística a um patamar que hoje, mesmo com diversos países colaborando financeiramente, não seria viável.
A iniciativa privada também está de olho em Marte. A Space X, do magnata Elon Musk, também dono da fábrica de carros elétricos Tesla, apresentou um plano que prevê naves reutilizáveis que façam viagens de ida e volta até o planeta vermelho e possam ser reabastecidas no espaço, tornando o transporte de grandes quantidades de passageiros possível.
Além disso, o processo de colonização proposto pela empresa englobaria a criação de uma cidade autossustentável em Marte que produziria o combustível necessário para as viagens, que demorariam entre 80 e 150 dias, dependendo da posição dos planetas. As primeiras missões desembarcariam em 2025, uma previsão bastante otimista. A Nasa, agência espacial norte-americana, não planeja chegar em Marte antes de 2030.
Vida em Marte?
As viagens interplanetárias poderiam causar consequências biológicas e psicológicas para o corpo humano. Do ponto de vista biológico, teríamos que lidar com alterações na gravidade e nos níveis de radiação solar, que são diferentes nos planetas. Como a gravidade é menor em Marte, os ossos não precisariam ter uma estrutura tão rígida para sustentar o peso, e não haveria necessidade de músculos tão fortes. “Seria um ser humano atrofiado. Uma pessoa que passasse a vida inteira em Marte, provavelmente não conseguiria ficar em pé na Terra, por causa da gravidade. A radiação também acaba induzindo mutações imprevisíveis e, a longo prazo, câncer”, explica Cássio Barbosa.
No âmbito psicológico, é impossível prever quais seriam os efeitos na mente humana causados pelo enclausuramento necessário para superar a longa distância da viagem. Experiências como a Mars500, que confinaram astronautas em espaços similares a naves espaciais por 500 dias, simulando uma viagem de ida e volta até Marte, mostraram que, de modo geral, a mente humana pode resistir à missão. Apesar disso, alterações do padrão de sono e tendência ao isolamento social foram percebidos em alguns deles.
Por enquanto, planetas fora do sistema solar (exoplanetas) estão fora de cogitação. A recente explosão na descoberta de exoplanetas mostra que planetas similares ao nosso não são tão raros. Porém, a tecnologia à disposição torna esses destinos poucos prováveis. “Colonizar outros sistemas solares está muito além do que podemos fazer hoje em dia. Existem propostas, mas dependem do desenvolvimento tecnológico e, se não for uma situação comercial, militar ou de necessidade, vai demorar bastante para fazer isso funcionar”, completa Barbosa.
Independentemente de qual destino tivermos enquanto espécie, o importante será a criação de uma consciência global de que tudo o fazemos pode afetar nosso lar planetário, seja ela a Terra, Marte ou qualquer outro planeta.
Bruno de Sousa Moraes tem graduação em ciências biológicas (UFRJ), mestrado em ecologia (UFRJ) e é aluno do curso de pós-graduação em jornalismo científico do Labjor/Unicamp.
Camila Pissolito é jornalista (FIAM) e aluna do curso de pós-graduação em jornalismo científico do Labjor/Unicamp.
Guilherme Henrique Vicente é jornalista (Unesp) e aluno do curso de pós-graduação em jornalismo científico do Labjor/Unicamp.