Micro-organismos com potencial agronômico promovem crescimento de milho e soja

Por Maria Letícia Bonatelli 

Pesquisadores da ESALQ/USP estudam bactéria que promove significativamente o crescimento de milho e soja, e focam na relação micro-organismo-planta na busca de práticas agrícolas mais sustentáveis

O avanço das tecnologias tem permitido observar o papel importante da microbiota para o estabelecimento e sobrevivência das plantas. A professora Maria Carolina Quecine-Verdi, do Departamento de Genética da Esalq/USP, é uma das pesquisadoras que se debruça sobre a questão.

O grupo de Quecine-Verdi obteve resultados promissores ao estudar micro-organismos capazes de melhorar o fitness da planta, que pode envolver a promoção do crescimento de folhas, caules e raízes, aumento da resistência às pragas e a ampliação da produtividade de frutos e sementes.

O grupo estuda uma linhagem bacteriana do gênero Bacillus, que foi isolada do guaranazeiro da Amazônia, e mostrou potencial para promover o crescimento em plantas como milho e soja. “Estamos agora tentando entender, com maior profundidade, como funciona essa interação micro-organismo-planta” afirma Quecine-Verdi.

O Bacillus foi isolado do solo do guaranazeiro, numa região chamada rizosfera, que sofre interferência direta das raízes da planta. O fato de pertencer à microbiota do guaranazeiro, porém, não significa que não tenha potencial para se relacionar com outras espécies. E, de fato, os resultados encontrados no crescimento de milho pela linhagem de Bacillus foram impressionantes.

Em recente artigo publicado pela pesquisadora Bruna Durante Batista, responsável por isolar e iniciar a caracterização dessa bactéria, houve aumento de mais de 200% no peso seco da raiz do milho e de mais de 40% no peso seco da parte aérea. Tais incrementos de raiz (responsável pela absorção de nutrientes e água do solo) e da parte aérea – incluindo folha e ramos – demonstram que o Bacillus é um promissor bioinoculante de plantas.

Crescimento de milho promovido pelo Bacillus sp.

“Existem micro-organismos benéficos que podem, inclusive, serem inseridos em produtos para melhorar a resistência de doenças de plantas ou ajudá-las a crescer mais”, afirma Quecine-Verdi, apontando as possibilidades de pesquisa abertas com as descobertas.

Indo a fundo na interação Bacillus-planta

Quecine-Verdi e seus alunos seguem duas linhas de pesquisa para entender a biologia da relação Bacillus-planta. A bactéria pode atuar na promoção de crescimento seja através da disponibilização de nutrientes (como nitrogênio, fósforo, ferro, entre outros) ou da produção de hormônios vegetais.

Por meio do sequenciamento do genoma do Bacillus, juntamente com testes realizados em laboratório, sabe-se que essa linhagem tem a capacidade de fixar o nitrogênio do ar; solubilizar o fosfato presente no solo (normalmente está em forma insolúvel para a planta); disponibilizar ferro para a planta (também geralmente indisponível no solo); e produzir hormônios vegetais de crescimento.

A importância de estudar os mecanismos que permitem à bactéria disponibilizar diferentes nutrientes ou hormônios vegetais está na tentativa de encontrar soluções mais sustentáveis para as práticas agrícolas. Frequentemente, os agricultores lançam mão de fertilizantes sintéticos, que são poluentes em todas as etapas de utilização: desde o processo de produção – nos altos gastos energéticos – até a aplicação no campo, que pode contaminar leitos de rios ou lençóis freáticos.

Os resultados são promissores e as pesquisas continuam para desvendar os mecanismos envolvidos na complexa relação. Quecine-Verdi explica que o próximo passo será responder algumas perguntas que vão mais a fundo na genética da interação Bacillus-planta. Entre os questionamentos, como e quando os genes do microrganismo estão ativos e como é possível melhorar a expressão de um gene para que seja mais favorável à planta. A meta é encontrar resultados para o desenvolvimento de medidas mais sustentáveis nas práticas agrícolas, explica a pesquisadora.

Relações complexas

Com as novas tecnologias, há dados impressionantes sobre a quantidade de micro-organismos que habitam os sistemas da Terra. Para ter uma ideia, cientistas costumam correlacionar esses números a referências cotidianas. Estima-se que em uma colher de chá contendo solo é possível encontrar um bilhão de micro-organismos.

Com números de tais magnitudes, é de se esperar que a proporção de micro-organismos benéficos ou indiferentes a um outro organismo seja maior que a dos que causam doenças – contrariando o medo da maior parte das pessoas. Para patógenos humanos, estima-se que muito menos de 1% de todas as espécies seja capaz de causar alguma doença.

“Não é concebível entender qualquer organismo – não somente planta, mas animais e até mesmo o homem – isoladamente. Com os avanços moleculares, percebemos que os micro-organismos estão presentes em todos os organismos vivos”, destaca Quecine-Verdi.

Com o avanço das técnicas de sequenciamento de DNA, monitorar os micro-organismos tornou-se um trabalho muito mais simples, e o desafio agora é compreender os mecanismos envolvidos nessas complexas relações.

 

Maria Letícia Bonatelli é formada em ciências biológicas (Unicamp), com mestrado e doutorado em ciências (USP). É aluna do curso de jornalismo científico do Labjor e bolsista Mídia Ciência.