Fogos e artifícios

Por Carlos Vogt


Áspera quando as chuvas de setembro
caem chuvas de verão
lânguida quando as terras rasas dos cafezais
queimam no horizonte o nexo das paisagens
de que me lembro
nos olhos na mente no coração
nos dedos que não as tocam
no ventre

Perdi a fogueira de São João na Fazenda Resfriado
por um jogo de futebol no campo da Associação Atlética Salense
nem era eu que jogava por iniciativa minha própria
era o entusiasmo o time o folguedo a amizade
o companheirismo era meu irmão
que calculou mal o tempo da passagem do Ford Bigode
que não nos levou
o Ford passou a fogueira queimou o tempo passou

Quando cheguei no dia seguinte de charrete
cedo só
as cinzas quentes da alegria de ontem
menino fiquei parado olhando a lembrança
que tenho do que perco
fiz xixi no que sobrou da festa
e fui brincar com os filhos do campeiro no curral de vacas
e bezerros obedientes à sua e à minha solidão

  • Publicado em Mascarada, Editora Pontes e Editora da Unicamp, Campinas, 1997, 97; também publicado em Poesia Reunida, Landy Editora, São Paulo, 2008, p.348.