A energia nuclear no contexto internacional
O mundo assiste hoje à retomada da
opção nuclear no quadro energético, o que era tido como improvável até
bem pouco tempo, resultado da alta no preço do petróleo, receios sobre
a segurança do seu fornecimento e, principalmente, de uma preocupação
crescente a respeito do aquecimento global. Em contraposição é apontado
o fato de que alguns países estariam renunciando ao uso da Energia
Nuclear – sendo o exemplo mais citado o da Alemanha. Porém, países como
França e Japão caminham em direção oposta e novos reatores serão
construídos na Índia e na China. A Austrália, um dos maiores produtores
de concentrado de urânio do mundo, passa a considerar a hipótese de ela
própria construir usinas nucleares. Assim, novos reatores estão sendo
construídos em 13 países e tanto os EUA quanto países da Europa
aumentaram a geração de energia elétrica a partir de plantas nucleares
já existentes através do processo de upgrade. No aspecto financeiro, os
EUA estão oferecendo US$ 2 bilhões em seguros para cobrir eventuais
perdas devido a atrasos na construção de plantas nucleares.
É importante frisar que além do
combustível nuclear ser um dos mais baratos para as geradoras de
eletricidade, a incorporação de avanços tecnológicos no projeto e na
construção de centrais nucleares já permite avaliar a redução dos
custos de capital no setor e, para diversos países, uma nova central
nuclear já é competitiva em relação às demais fontes térmicas.
Iniciativas como o projeto “International Project on Innovative Nuclear
Ractors and Fuel Cycles” (Inpro) conduzido pela IAEA contribuem
significativamente para esse objetivo.
Mais ainda, se na comparação com as
unidades geradoras que utilizam combustíveis fósseis ou mesmo com as
hidroelétricas, os custos ambientais, inclusive aqueles relacionados às
emissões dos gases geradores do efeito estufa, forem levados em conta
(desde que esses custos sejam explicitamente reconhecidos) aí a energia
nuclear torna-se ainda mais competitiva. Finalmente, o
reprocessamento do combustível queimado de centrais nucleares associado
à redução da quantidade de radiotoxicidade dos rejeitos; ampliação do
uso efetivo e redução dos custos da deposição geológica; redução dos
inventários de plutônio e a recuperação de energia ainda presente no
combustível nuclear queimado são elementos favoráveis à retomada da
geração nucleoelétrica.
O Contexto Energético Nacional: Aspectos Ambientais e Econômicos
Recentemente, a Agência Internacional
de Energia Atômica publicou um estudo intitulado: “Brasil: a country
profile on suistainable energy development” que pode ser encontrado em www.iaea.org.
No estudo é reportado que, no Brasil,
a geração hidroelétrica provém de 433 plantas em operação, sendo que
somente 23 plantas com capacidade instalada de mais de 1000 MW
respondem por cerca de 70% da capacidade de geração instalada no país.
Há ainda um potencial de cerca de 190 GW a ser explorado, todavia com
grande parte se concentrando na região Norte, ou seja, afastado dos
centros consumidores das regiões Sul e Sudeste.
Se no passado não se dava muita
atenção para as possíveis conseqüências ambientais da construção de
grandes lagos e barragens, hoje aspectos como alagamento de
ecossistemas delicados, reassentamento de comunidades inteiras, perda
de madeira e aumento da emissão de gases causadores de efeito estufa
passam a ser considerados de forma bem criteriosa. Além de aspectos
relacionados com a migração de espécies de peixes, desenvolvimento de
ambientes atóxicos, corrosão de turbinas, produção de metano, uso de
agentes desfoliantes e herbicidas para impedir o crescimento de algas.
O carvão no Brasil tem reservas
modestas e de qualidade relativamente pobre. Das reservas brasileiras
de gás natural, de 326 bilhões de m3 em 2004, somente na Amazônia essas
estariam sendo exploradas como uma fonte principal de energia.
Importante notar que, cerca de 2/3 das reservas de gás se encontram no
litoral.
A geração eólica tem no Nordeste e na
região costeira do Rio Grande do Sul as perspectivas mais promissoras
sendo que o potencial eólico no Brasil pode estar entre 20 e 145 GW.
Todavia, apesar das boas perspectivas para o seu aproveitamento, é
reportado que os investidores não estariam dispostos a desenvolver
novos projetos até que o governo garantisse algum tipo de subsídio.
O uso da biomassa é apontado como uma
alternativa promissora. Em janeiro de 2002 havia 159 plantas
termoelétricas operacionais com uma capacidade instalada de 992 MW, ou
8% da geração térmica do país.
A energia nuclear no Brasil
O Brasil se constitui na sexta maior
reserva de urânio do mundo, com apenas 25% do seu território
devidamente explorado o que garante ao país autonomia em relação à
produção do combustível nuclear.
Os impactos ambientais causados pela
operação de reatores nucleares podem ser considerados mínimos. Claro
que é preciso abordar a questão da deposição final dos rejeitos
radioativos. No entanto, decisões a respeito das estratégias a serem
adotadas a esse respeito se tornam muito mais complicadas pelos
aspectos políticos envolvidos e pela percepção da opinião pública de
que este problema não tem solução adequada, do que pelos aspectos
tecnológicos inerentes. Na realidade, um consenso está sendo formado
internacionalmente no sentido de que a deposição desses rejeitos em
repositórios de sub-superficie (deposição geológica) é uma opção
aceitável. Tanto a Finlândia quanto os EUA já escolheram os sítios para
deposição.
Quanto à questão envolvendo
acidentes, inicialmente, deve ser considerado que os dois acidentes
nucleares mais citados são os relativos à Three Mile Island, nos EUA e
Chernobyl (na antiga União Soviética). O primeiro, ao contrário do que
se propala, pode ser considerado uma prova da segurança das centrais
nucleares, já que a estrutura de contenção impediu que a radiação
escapasse para o ambiente. No segundo caso não havia um vaso de
contenção, além de o projeto ser de 2ª geração, em contraste com os
reatores ocidentais que são de 3ª geração e tem na contenção as 5ª e 6ª
barreiras físicas para evitar o escape de radioatividade para o
exterior. O que se pode afirmar é que a manutenção dos baixos níveis de
risco está, entre outras coisas, associada com a manutenção de uma
cultura de segurança operacional e com a consolidação de uma Autoridade
Regulatória atuante, que disponha de pessoal treinado, estimulado e bem
remunerado, contando ainda com recursos financeiros adequados, o mesmo
valendo para os agentes operadores das instalações.
Deve-se também buscar a melhoria
contínua das ações de resposta na eventualidade de ocorrência de um
acidente nuclear, e se dispor de mecanismos atualizados para lidar com
essas situações. Isso implica em planejamento, treinamento e condução
de exercícios de forma regular.
Conclusões
Formas alternativas de geração de
energia, especialmente aquelas que são consideradas como provenientes
de fontes renováveis, virão, no futuro, desempenhar um papel importante
no panorama de geração de energia elétrica, tanto no Brasil quanto no
mundo. O seu desenvolvimento, contudo, depende da realização de
investimentos importantes assim como da concessão de subsídios
governamentais. No curto prazo, as formas convencionais de geração de
energia, como a partir de combustíveis fósseis e geração hidroelétrica
tem a si impactos associados, mais ou menos percebidos pela sociedade
que, se contabilizados no custo total de geração, tornam a geração
nucleoelétrica uma opção muito atraente.
As questões de segurança ainda
representam barreiras importantes para a aceitação da energia nuclear
pela sociedade. Isso é causado pelo preconceito da sociedade em relação
à energia nuclear oriundo tanto da falta de informação e pela
disseminação de informações não consistentes. Há sim estratégias para a
deposição final segura dos rejeitos radioativos sendo que os riscos de
acidentes nucleares, já bastante baixos, tenderão a diminuir mais ainda
se investimentos na área de desenvolvimento tecnológico e de segurança
continuarem a ser feitos. Para tanto, o fortalecimento da Comissão
Nacional de Energia Nuclear, no Brasil, é algo imperativo e para isso
se concretizar há a necessidade de se investir, não só em formação de
mão-de-obra, mas também na reciclagem dos profissionais mais
experientes.
A opção nuclear no Brasil, até
recentemente defendida na sua perspectiva puramente estratégica, passa
a ser importante no tocante à contribuição do ponto de vista da
diversificação e regulação termoelétrica, necessária para conferir
confiabilidade ao sistema elétrico brasileiro e para propiciar
desenvolvimento tecnológico ao país e o que é melhor sem ônus adicional
para o Tesouro Nacional. O Brasil passa a ter uma nova oportunidade de
explorar a opção nuclear e conferir maior diversificação e
confiabilidade ao sistema elétrico brasileiro, cujo primeiro passo é a
conclusão de Angra 3, seguindo-se de outras instalações nucleares.
Horst Monken Fernandes é pesquisador do CNEN, atualmente licenciado e atuando na Agência Internacional de Energia Atômica.
Referências: 1 International Atomic Energy Agency (2006). Brazil: a country profile on sustainable energy development. Vienna. 250p. (www.iaea.org) 2
International Atomic Energy Agency. International Project on Innovative
Nuclear Reactors and Fuel Cycles (INPRO) – Status 2005. Vienna 12p. (www.iaea.org) 3
Mattos, J.R. L e Dias, M.S. Brasil nuclear: da estagnação ao
crescimento (2006).Energy Information Administration/Department of
Energy: http://www.eia.doe.gov
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