Embora muitas vezes o produto agrícola de um dado local envolva tecnologias simples e tradicionais, os riscos tendem a ser menores quando decisões como o que plantar, quando plantar, quando colher e como e onde vender são tomadas com base no conhecimento sobre o ambiente e os aspectos econômicos, sociais e políticos que condicionam a atividade.
Conforme destaca Eduardo Assad, pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária, a quantidade de dados atualmente disponível para a agricultura é muito grande, e processá-los corretamente permite que o agricultor tome decisões menos arriscadas e, consequentemente, com maior probabilidade de acerto. Clima, tipo de solo, tipo de semente, quantidade de água, de fertilizantes e de agrotóxicos compõem o arsenal de informações que precisam ser recolhidas, processadas e aplicadas para que, ao final do ciclo de produção, o agricultor possa cobrir seus gastos e obter renda que assegure sua permanência no sistema produtivo.
A utilização do big data tem sido muito importante nos sistemas de produção baseados na agricultura de precisão, na simulação de cenários climáticos e na predição de safras, por exemplo. Imagens podem ser captadas por um vant (veículo aéreo não tripulado) e indicar que áreas da lavoura precisam de irrigação, ou de reforço na adubação ou, ainda, em quais glebas pode-se iniciar a colheita. Com um tablet ou um celular pode-se obter imagens de lesões em plantas ou frutos, enviá-las a um técnico especializado ou, então, compará-las a padrões já armazenados e, com isso, determinar a intensidade do ataque de praga ou doença e definir o controle adequado.
Grandes empresas e centros de pesquisa estão investindo em diversos estudos para melhorar as tecnologias de gerenciamento de dados. De acordo com o pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária, Thiago Teixeira Santos, “um bom exemplo é a rede da Embrapa que pesquisa e divulga a agricultura de precisão no país”. Santos, que possui experiência em Ciência da Computação, informa também que outro exemplo é o DataExp, que “envolve projetos de infraestrutura computacional (hardware e software) para o processamento massivo de dados necessários ao big data”.
Por se tratar de sistemas de produção ainda limitados a poucas áreas no Brasil, muitos ainda se perguntam sobre os reais impactos da agricultura de precisão. Em artigo publicado na revista Opara – Ciências Contemporâneas Aplicadas, pesquisadores da Faculdade de Administração de Petrolina (PE) se propuseram a estudar as funcionalidades do big data em diversos campos da sociedade (agricultura, transporte, educação, serviços de saúde e financeiros). Os autores Aristóteles Moura e Dinani Gomes concluíram que, na agricultura, esse conhecimento pode ser usado para garantir a disponibilidade de armazenamento de culturas adequadas, reduzir resíduos e desperdício e fornecer melhor informação sobre que tipos de serviços financeiros são necessários para os agricultores. E acrescentam que, “do ponto de vista ambiental, também é possível diminuir a quantidade de insumos, e, assim, poluir menos o ambiente”.
A Monsanto, uma das gigantes mundiais na produção de insumos, ou seja, agrotóxicos e sementes para o cultivo, é uma das empresas que mais investe em tecnologia de dados. Recentemente adquiriu, por cerca de US$ 1 bilhão, a Climate Corporation, empresa que emprega algoritmos de inteligência artificial para reunir informações de clima e aplicá-las na agricultura. A Monsanto, em nota oficial na época da compra, declarou que poderá agregar mais valor aos seus produtos, além de obter soluções para suas lavouras.
Outra empresa que faz uso da tecnologia de dados de forma sistemática é a Uteva, localizada em Itaberá (SP). Além da produção de milho, soja, feijão e trigo, há a preocupação em reunir o máximo de dados possíveis sobre as áreas plantadas, como resultados de análises físicas e químicas do solo, dados de colheita, índices pluviométricos, entre outros, e estabelecer mapas que permitam definir melhor uso para as terras.
No entanto, como aponta Assad, atualmente, no Brasil, ainda se tem a visão de que big data na agricultura se restringe a conjuntos de dados de altíssima resolução levantados dentro de uma propriedade: “na verdade, é muito mais do que isso, pois vai além da porteira da fazenda, porque integra as informações da produção agrícola local ao mercado nacional e internacional, ao sistema de certificação, às políticas e legislações ambientais e ao mercado futuro”. Outro dogma é achar que big data só serve para a grande produção. Saad salienta que cooperativas de diferentes matizes, associações de pequenos, médios e grandes produtores rurais, sindicatos, serviços de extensão rural públicos e privados acessam remotamente as informações, e que “a noção de que big data é útil apenas a uma categoria muito rica de grandes produtores de commodities é equivocada”.
E não basta armazenar milhões de dados. Para que sejam úteis, o primeiro passo é filtrar e separar dado confiável de dado não confiável. Em segundo lugar, é preciso saber como transformar dados em informação, o que exige ferramentas de análise apropriadas. O agroclimatologista Assad explica, usando como exemplo dados de chuva: “um dado de chuva, isolado, não significa nada; mas se associado a um balanço hídrico, permite determinar o risco climático e a necessidade de irrigação”. O terceiro passo é transformar a informação em conhecimento: “seguindo o mesmo raciocínio, conhecendo-se o balanço hídrico, pode-se definir qual o tipo de cultura é viável em um determinado local; replicando-se isto em milhares de pontos no espaço, pode-se ter uma avaliação de viabilidade econômica de produção de culturas num dado local”. E, finalmente, é necessário transformar o conhecimento por meio de tecnologia apropriada, para que possa ser acessado pelos que precisam da informação. Ou seja, é necessário integrar tudo. O último patamar consiste em “preencher as lacunas de informação e conhecimento por meio da pesquisa e da inovação tecnológica dentro e fora da porteira”, conclui Assad.
Usar big data na agricultura permite uma maior eficiência nas lavouras, que, por consequência, geram produtos de melhor qualidade, e principalmente, com maior ganho financeiro. Com efeito, um relatório de 2014 da empresa de consultoria McKinsey apontou que, em cinco anos, o Brasil poderá lucrar o equivalente a R$ 24 bilhões com a aplicação de big data na produção de soja, milho e trigo. O relatório indica ainda que, com o uso dos dados, é possível reduzir em 17% os gastos com tratores, caminhões, colheitadeiras e outros equipamentos móveis. Ou seja, big data adequadamente processado pode transformar a agricultura do século XXI em produção sustentável, minimizando desigualdades regionais e setoriais.
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