Em um país onde o acesso à internet ainda é privilégio de poucos, a
popularização do avançado sistema sem fio (ou wireless, do inglês) pode
parecer uma utopia, sobretudo para populações de baixa renda que vivem
longe dos grandes centros. De fato, o número de pessoas com acesso à
tecnologia de banda larga sem fio hoje é pouco significativo, mas há
quem diga que essa tecnologia seja a grande oportunidade para a
inclusão digital. Será mesmo? A briga das empresas de telefonia pela
participação no leilão de freqüências WiMax sugere que esse promissor
mercado renderá bons lucros às operadoras, que venderão o acesso à
internet aos cidadãos e às empresas. “Numa primeira instância, além das
operadoras, ganharão as empresas usuárias que, com apenas um acesso,
poderão distribuir o benefício para todas as suas subsidiárias no mesmo
município”, diz Luciano Leonel Mendes, professor do Instituto Nacional
de Telecomunicações (Inatel).
Mendes
acredita que o acesso público e gratuito à internet poderá decorrer das
tecnologias sem fio, mas sobretudo em telecentros e cidades digitais.
De acordo com o Barômetro Cisco da Banda Larga
(informe produzido pela empresa de tecnologia), o acesso à internet via
linha telefônica (xDSL) ainda equivale a quase 80% das conexões de
banda larga existentes no Brasil. A regulamentação dos serviços sem fio
nas faixas de freqüência de 3,5 GHz e 10,5 GHz, que abrangem
tecnologias como Wireless Mesh, WiFi e Wimax (veja box ao final da matéria), deverá aumentar a participação das tecnologias sem fio já a partir do ano que vem.
Total de Conexões de Banda Larga no Brasil |
|
2005 |
2006 |
Milhares |
1º Trimestre |
2º Trimestre |
3º Trimestre |
4º Trimestre |
|
1º Trimestre |
2º Trimestre |
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ADSL (cabos telefônicos) |
TV Assinatura |
Outros (rádio) |
|
2.088 |
2.406 |
2.762 |
3.092 |
393 |
452 |
528 |
629 |
30 |
44 |
60 |
75 |
|
3.359 |
3.594 |
789 |
950 |
80 |
86 |
|
Total Brasil |
|
|
Nota: Não inclui satélite e IP dedicado. *estimativa Teleco.
Fonte: Teleco
Jogo de forças
Antes da tecnologia de conexão sem fio, para se ter acesso à internet
em banda larga era necessário algum tipo de cabo, como o fio do
telefone ou da TV por assinatura. Isso representa um custo para que o
serviço seja oferecido, que desaparece com a tecnologia wireless. Por isso o WiMax, de alcance muito maior do que o WiFi, é tão interessante e cresce rapidamente no mundo. Segundo pesquisa da Infonetics Research,
o mercado mundial de equipamentos para redes WiMax cresceu 107% no
primeiro semestre de 2006, atingindo 141 milhões de dólares.
O
mercado será impulsionado pela inclusão de chips de conexão para redes
WiMax nos computadores (como ocorre hoje com os laptops que têm a
conexão WiFi embutida). Espera-se que empresas como Intel, Samsung,
Nokia e Siemens produzam os equipamentos adaptados ao novo sistema a
partir do próximo ano. O acesso à conexão sem fio WiMax deverá ser
vendido por empresas que atualmente disputam faixas de freqüência em
leilão.
Do
ponto de vista dos consumidores, o acesso aos benefícios do WiMax ainda
seria privilégio de poucos, ao menos na fase inicial de implantação. Os
analistas prevêem que o modem custaria em torno de US$ 500,00 e
chegaria a US$ 150,00 em 3 anos, ampliando o acesso. O preço do serviço
deverá incorporar os custos das empresas com a instalação de torres e o
aluguel de novos terrenos. Para Jaime Balbino Gonçalves da Silva,
consultor em automação em sistemas de ensino da ProfSAT - TV Educativa
Via Satélite, “durante os primeiros anos, o WiMax será de poucos mesmo,
mas é preciso garantir formas de massificar a tecnologia”.
O uso das ondas eletromagnéticas é limitado e regulado pela Agência
Nacional de Telecomunicações (Anatel). Assim como acontece com o rádio
e a televisão, será preciso uma concessão do governo para que as
radiofreqüências sejam exploradas (seja para o acesso à internet ou
para seus outros possíveis usos, como acesso aos sinais de TV,
telefonia móvel ou vídeo sob demanda). "Assim, um operador WiMax compra
uma licença de uso que lhe permite oferecer mais e melhores serviços
que os atuais, atendendo a novos nichos de mercado e atingindo
diretamente a competitividade com as tecnologias concorrentes."
Cerca
de cem empresas credenciaram-se para o leilão das faixas de 3,5Ghz e
10,5Ghz, inclusive empresas de telefonia fixa (como Telemar, Brasil
Telecom, Telefônica, Sercomtel e CTBC Telecom). Além da concorrência
com as operadoras que hoje vendem banda larga, como as telefônicas e as
empresas de TV por assinatura, a tecnologia WiMax pode avançar no
mercado das operadoras de celulares. Uma das principais vantagens do
sistema é a possibilidade de conexão contínua com a rede mesmo durante
um deslocamento - dentro de um veículo em movimento, por exemplo. De
acordo com Paulo Henrique Ferreira, diretor de comunicação estratégia
da consultoria de negócios e posicionamento em Tecnologia da Informação
Accenda, o WiMax poderia ameaçar diretamente as empresas de telefonia
fixa e móvel por permitir a oferta desses serviços a custos menores no
longo prazo. “Por isso essas empresas querem tanto participar do
leilão”, afirma.
No
último dia 04, após a entrega das propostas para o leilão, a licitação
foi suspensa pelo Tribunal de Contas da União (TCU), sob a alegação de
que havia uma defasagem no valor do câmbio utilizado na determinação
dos preços mínimos definidos no edital, além de valores mínimos
subavaliados para as cidades de Ribeirão Preto e Santos. Com a
suspensão do leilão, a Anatel decidiu não dar continuidade ao processo
enquanto as operadoras de telefonia permanecerem na disputa em regiões
onde já têm concessão. A agência alega que a atuação das telefônicas na
transmissão WiMax nessas áreas - onde elas já oferecem o serviço
discado - pode prejudicar os consumidores ante a ausência de
concorrência. Por outro lado, o Ministério das Comunicações apóia a
participação das telefônicas, mas deseja implementar uma política
mínima de inclusão digital com a criação de “quotas sociais” que
garantam a oferta do WiMax em comunidades distantes e em locais
públicos (como telecentros e escolas).
Para
Silva, há uma questão política entre a Anatel – que procuraria garantir
a estabilidade para os investidores do setor – e o Ministério das
Comunicações – cujas diretrizes mudam ao sabor dos mandatos de governo.
“Existe um conflito de interesses, mas pode-se dizer que ambos os lados
têm pontos que prezam o consumidor”, diz Silva. Segundo o consultor, “é
louvável a Anatel preocupar-se com a manutenção da concorrência e seus
efeitos sobre os preços finais, mas o Ministério das Comunicações
também tem suas razões ao defender as ‘quotas socias’ para a inclusão
digital”.
Silva
acredita que a Anatel confia demais na auto-regulação do mercado. Para
ele, as regras da agência não garantem a oferta dos serviços WiMax à
população, o que pode ameaçar a inclusão digital. “A concessionária
pode adquirir o direito de explorar a freqüência e não fazê-lo,
prejudicando os consumidores”. Algumas medidas apontadas por Silva
poderiam contornar esse problema, como a determinação da
obrigatoriedade da oferta num período de dois ou três anos (ao invés
dos atuais dez anos previstos) e a implementação das quotas sociais,
garantindo a oferta do serviço em áreas de baixo poder aquisitivo por
meio de um cronograma com metas para inclusão digital e acesso gratuito
ou a baixo custo em espaços públicos específicos, como as escolas.
Cidades digitais
Algumas
cidades brasileiras destacam-se em programas de inclusão digital, com
base na tecnologia sem fio. A tecnologia mais utilizada nessas cidades
digitais é a WiFi, mas há projetos experimentais de instalação da redes
WiMax em cidades como Campinas, Belo Horizonte, São Paulo e Ouro Preto,
com o envolvimento de empresas privadas e, às vezes, apoio público. “A
transmissão WiMax, quando regulamentada, será crucial para as cidades
digitais em função do seu longo alcance, mas WiFi e WiMax deverão
complementar-se”, diz Mendes. O sistema WiMesh é pouco utilizado no
Brasil, mas há uma experiência recente na cidade de Tiradentes (MG),
onde o Ministério das Comunicações, em parceria com a Cisco, habilitou
um telecentro e quatro escolas para oferecerem acesso gratuito à
internet. O Comitê Gestor da Internet no Brasil
reservou R$ 10 milhões do seu orçamento para fomentar as cidades
digitais, a grande promessa para a universalização do acesso à internet
no país.
No município de Piraí (RJ) foi criado, em 2002, o projeto Piraí Digital,
com o objetivo de democratizar o acesso aos meios de informação e
comunicação, gerando oportunidades de desenvolvimento econômico e
social. Os técnicos da equipe desenvolveram o Sistema Híbrido com
Suporte Wireless (SHSW), que se adapta às condições de cada
localidade por meio da adoção de tecnologias diferentes sobre o suporte
sem fio. A rede, que atinge os 520 Km de território (inclusive a área
rural), cobre 39 edifícios públicos, 25 escolas, quatro bibliotecas,
uma Casa da Criança, uma APAE, uma creche, quatro telecentros e nove
quiosques. O coordenador geral do projeto, Franklin Dias Coelho, diz
que desde o início o objetivo não era oferecer o acesso à internet
apenas nos telecentros, mas incluir terminais de atendimento nas
praças, escolas, rodoviária e sindicatos.
Com
relação à tecnologia, o sistema WiFi é a base do suporte de rede, mas
outras entram no projeto para a captação dos sinais. “A diversidade
topográfica, a distância e as particularidades das construções demandam
a adaptabilidade que o sistema híbrido permite”, diz Coelho.
Outro
caso exemplar é o da pequena cidade paulista de Sud Mennucci. Depois de
enfrentar as dificuldades de não ter um provedor local - e, por isso,
depender de ligações interurbanas para se conectar à internet por linha
discada – a cidade conseguiu disponibilizar o acesso gratuito à
internet sem fio, via WiFi, para sua população. Os moradores devem
fazer uma solicitação à prefeitura e aguardar sua aprovação. Depois,
compram uma antena e uma placa WiFi para receber o sinal emitido pela
prefeitura e usam o computador de mesa para acessar a internet. O kit
custa de R$ 300 a R$ 600, mas, como não há lojas especializadas em
produtos de informática, alguns representantes buscam o equipamento em
cidades próximas.
No
último dia 20, a Intel inaugurou uma rede sem fio em banda larga com
tecnologia WiMax na cidade de Parintins, localizada em uma ilha no rio
Amazonas. O sistema foi instalado em um centro de saúde, duas escolas
públicas, um centro comunitário e na Universidade da Amazônia. O
projeto faz parte de uma iniciativa da empresa (programa World Ahead)
para acelerar o acesso a computadores e à internet em comunidades em
desenvolvimento, com investimentos previstos em mais de US$ 1 bilhão em
todo o mundo ao longo dos próximos cinco anos.
As tecnologias de banda larga sem fio
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O acesso à internet em banda larga sem fio ocorre por
meio de ondas de rádio, que podem ser enviadas pelos sistemas WiFi
(Fidelidade Sem Fio), WiMax (Interoperabilidade Mundial para Acesso de
Microondas) e WiMesh (Rede em Malha Sem Fio).
A tecnologia WiFi consiste na emissão de
sinais de rede para serem captados por usuários com equipamentos
apropriados. Esse tipo de conexão trabalha com radiofreqüências de
2,4Ghz (também utilizadas em telefones sem fio e fornos microondas),
atinge a velocidade de 11Mbps e alcança até 100m a partir da fonte
emissora. Portanto, é um sistema geralmente usado em ambientes
internos.
Desenvolvido por um consórcio mundial e certificado pelo IEEE
(Institute of Electrical and Electronicas Engeneers), o padrão de
transmissão WiMax
difere do WiFi principalmente porque pode alcançar distâncias e
velocidades muito maiores, com limites de 50 Km e 75Mbps,
respectivamente. Assim, o WiMax pode cobrir localidades de grandes
dimensões, como as cidades. Estão disponíveis no Brasil para a
transmissão WiMax as freqüências de 2,5Ghz, 3,5Ghz, 10,5Ghz (que
necessitam de autorização da Anatel) e 5,8Ghz (livre).
Quanto às redes Mesh, elas podem utilizar os sistemas sem fio WiFi/WiMax ou cabos, para conectar os usuários. O WiMesh
é uma rede composta por várias antenas com capacidade de cobertura
menor que o WiMax e maior que o WiFi. As antenas ficam mais próximas
umas das outras e tornam a transmissão mais densa e segura, com
velocidades de 54 Mbps e alcance de até 400 metros.
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