No túmulo de Isaac Newton (1642-1727), na abadia de Westminster, em Londres, Inglaterra, estão gravados os versos que o panegírico de Alexander Pope (1688-1744) esculpiu:
Nature and Nature’s law lay hid in night.
God sad “Let Newton be” and all was light.
Em português, numa tradução politicamente livre, ou livremente poética:
A Natureza e as suas leis jaziam na noite escondidas.
Disse Deus “Faça-se Newton” e houve luz nas jazidas.
Uma outra versão do elogio de Pope foi produzida por Aaron Hill (1685-1750), seu desafeto literário, e diz assim:
O’er Nature’s laws God cast the veil of night.
Out blaz’d a Newton’s soul and was light.
Traduzindo, no mesmo espírito:
Sobre as leis da Natureza Deus lançou da noite o manto escuro.
Fora ardia um princípio essencial de Newton e era dia puro.
Consagrou-se, contudo, o dístico de Pope por qualidades próprias, pela inscrição no túmulo do herói da mecânica moderna e a tal ponto e de tal forma que entrou, sem trocadilho, pela porta da cultura pop e estourou em sucesso no best-seller de Dan Brown - O código Da Vinci - , cuja trama organiza-se, em sua parte final, em torno do quebra-cabeças em versos que envolve o poeta do século XVIII, o físico no seu jazigo e o jazigo na abadia de Westminster, cenário do desenlace do frenesi narrativo das peripécias exótico-esotéricas do romance.
Com as leis de Newton, o mundo científico viveu, ao menos até a segunda metade do século XIX, a sensação de que a física havia concluído sua tarefa e que a ciência estava, enfim, às portas de obter as respostas definitivas sobre os segredos da natureza e os mistérios do mundo.
Contudo, no dia 14 de dezembro de 1900, Max Planck anuncia, na Sociedade Berlinense de Física, que a energia não é emitida e tampouco absorvida continuamente, mas sim na forma de pequeninas porções discretas chamadas quanta, ou fótons, cuja grandeza é proporcional à frequência da radiação.
Nascia a física quântica e as determinações do mundo que a física newtoniana fazia compreender abalavam-se com toda a teoria e as certezas construídas de seu saber.
Em 1905, o “annus mirabilis” da ciência, da natureza, Einstein publica os artigos que revolucionarão a física e estabelecerão os seus fundamentos modernos: “Sobre um ponto de vista heurístico relativo à geração e à transformação da luz”; “Sobre uma nova determinação das dimensões moleculares”; “Sobre o movimento de partículas suspensas em fluídos em repouso”; “Sobre a eletrodinâmica dos corpos em movimento” e “A inércia de um corpo depende da sua energia?”, no qual propõe a sua famosa equação E= mc 2.
Com a teoria da relatividade restrita consagrada, Einstein trabalha numa nova teoria da gravitação, a sua teoria da relatividade geral e, em 1911, no artigo “Sobre o efeito da gravidade na propagação da luz” anuncia que o campo gravitacional deveria provocar a curvatura da luz.
Em 1921, conquista o Prêmio Nobel e consolida sua reputação como cientista, como humanista e como cidadão do mundo.
Nessa época, Einstein viaja bastante desempenhando com contínua intensidade esses diversos papéis sociais com que foi revestindo sua vida.
Em Londres, para onde se dirigiu depois de estar em Manchester, Sir John Squire (1884-1958) poeta, crítico, historiador e jornalista inventor da dupla paródia, que consiste em transmitir o conteúdo da obra de um poeta no estilo de um outro, acrescentou ao epitáfio de Alexander Pope para Newton os dois versos que, com fina ironia, dão bem medida dos transtornos científico-culturais que as descobertas de Einstein provocaram nas certezas de então:
It did not last: the Devil howling “Ho!
Let Einstein be!” restored the status quo.
Em nossa tradução:
Durou pouco: o Diabo uivando “Oh!
Einstein seja feito!” restaurou o status quo.
Como o mundo é feito de mudanças, conforme anotações em prosa e verso desde o renascimento, ou mesmo antes, e como lá se vão cem anos miraculosos do admirável ano de 1905 e outros quase tantos da homenagem divertida de John Squire aos abalos revolucionários da ciência, acrescento aqui meu tributo aos donos da criação.
Peço licença poética para emendar as antigas reverências com uma nova irreverência cheia de espanto maroto e sincera admiração, ficando assim, re-emendado, o poema original e também sua versão:
Nature and Nature’s law lay hid in night.
God said “Let Newton be” and all was light.
It did not last: the Devil howling “Ho!
Let Einstein be!” restored the status quo.
After a while, playing dice, thinking more free
In the space-time they started singing “Whatever will be, will be!”
A natureza e as suas leis jaziam na noite escondidas.
Disse Deus “Faça-se Newton” e houve luz nas jazidas.
Durou pouco: o Diabo uivando “Oh!
Einstein seja feito!” restaurou o status quo.
Passado um momento, jogando dados em livre pensar
No espaço-tempo todos cantavam “O que será, será!”.
(Assista ao vídeo produzido pelos alunos da 8a turma da Especialização em Jornalismo Científico do Labjor/Unicamp, a partir do Poema Pop Science.)
|