Imagem: Paulo Muzio.
A ficção certamente estimulou os cientistas a desafiarem os limites da ciência. O termo “robô”, por exemplo, é atribuído ao teatrólogo checo Karel Capek (1890-1938), que designava um trabalhador forçado – um homem de metal com aparência humana e sem consciência – em sua peça R.U.R. (Rossum´s Universal Robots), de 1920.
Mais de meio século depois, o segundo longa-metragem da trilogia De volta para o futuro, de 1989, especulava sobre como seria o, então, longínquo ano de 2015. O filme dirigido de Robert Zemeckis acertou em diversas das suas previsões: computadores com tecnologia de comando de voz, óculos semelhantes ao Google Glass, câmeras fotográficas digitais compactas, monitores de tela plana, vídeo-chamadas, videogames com sensores de movimento e também drones.
De volta para o futuro
Na continuação da franquia, o roteirista Bob Gale dá pouca ênfase ao robô voador. Os drones aparecem apenas discretamente e estão longe de qualquer destaque no filme. O dispositivo aparece em apenas duas cenas do futuro. Uma ponta como um “quebra-galho” para os seres humanos que não querem passear com seus cães, e outra como uma espécie de câmera fotográfica voadora.
Duas décadas depois, os drones já são utilizados para substituir o componente humano em várias situações, incluindo contextos que envolvem perigo biológico, ambientes inacessíveis, controle de fronteiras e até mesmo em conflitos militares.
O fato de combinar várias tecnologias diferentes pode tornar difícil a tarefa de estabelecer um limite entre o que é e o que não é um drone. A diferença entre um drone e um robô, por exemplo, não é tão clara quando pode se pensar. “Não existe uma definição formal para diferenciar esses conceitos. A definição mais aceita é a de que drones são sinônimos de veículos aéreos não tripulados. Segundo essa definição, esse drone não precisa ser necessariamente um robô”, explica o especialista em robótica e inteligência artificial e professor da Unesp, Alexandre da Silva Simões.
Drones de guerra
Outro ponto que é demonstrado em filmes como Ameaça invisível: Stealth (2005), Sleep dealer (2008), Remote control war (2011) e Robocop (2014) é o uso de drones para fins militares.
Dirigido por Rob Cohen, Stealth mostra um time de pilotos que precisa enfrentar a concorrência de caça controlado por inteligência artificial. Apesar de se mostrar mais eficiente do que qualquer humano, o drone precisa ser impedido de iniciar uma guerra por conta de um defeito em sua configuração.
Os drones também falham na versão de 2014 de Robocop. Dirigido pelo brasileiro José Padilha, o longa tem uma trama diferente do original, lançado em 1987, do diretor Paul Verhoeven. Na versão repaginada, o “policial robô” tem seu projeto iniciado após erros causados pelos robôs/drones em zonas de guerras. O “componente humano” é visto como uma jogada de marketing pelo conglomerado OmniCorp.
Rudy, o piloto de Sleep dealer, controla um drone que visa ao impedimento da ação de "aquaterroristas" no México. Já a narração de Remote control war fala sobre um grupo de soldados em Nevada que acorda, pilota máquinas em um conflito no Paquistão e, ao fim do dia, volta para casa.
Os dois últimos filmes fazem parte da pesquisa do jornalista e mestre em comunicação pela Universidade Federal de Juiz de Fora, Igor Silva Oliveira. O tema de seu mestrado foi a telepresença – controle remoto de um corpo físico que permite interação em um ambiente real – para fins armamentistas.
“Ambos abordam o papel humano nesses confrontos por controle remoto. RCW especula que, se o objetivo da guerra é destruir o inimigo, a eficiência das máquinas é proporcional ao seu grau de autonomia, já que nosso tempo de cálculo e reação é menor”, explica Oliveira.
O jornalista acrescenta que há obras que enfatizam os benefícios da nossa relação com máquinas inteligentes, mas a chamada “tecnofobia” rende mais para efeitos de dramatização no cinema. Já no caso dos drones, sua inserção no cotidiano é tão grande que é difícil vê-los como tema de especulação na ficção científica.
As leis de Asimov
À medida em que avançam, as máquinas voadoras se tornam mais autônomas – o que gera a dúvida se esse tipo de dispositivo deveria seguir as leis da robótica. Estabelecidos pelo escritor Isaac Asimov, os princípios foram idealizados para limitar os comportamentos dos robôs em seus livros de ficção científica.
Para o professor de relações internacionais e doutorando em estudos estratégicos internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Thiago Borne Ferreira, é importante perceber que os robôs de Asimov não são os mesmos robôs que existem hoje. “As máquinas de obras como Eu robô, por exemplo, têm níveis de autonomia muito superiores aos dos robôs do mundo real”, afirma.
A chamada Primeira Lei ("um robô não pode ferir um ser humano") é relevante pois, de fato, robôs estão ferindo seres humanos em muitos países. Mas há uma ressalva importante. “Note, contudo, que eles o fazem com a aquiescência de um controlador”, aponta Ferreira.
As leis da robótica foram estabelecidas pelo escritor Isaac Asimov para limitar os comportamentos dos robôs em seus livros de ficção científica. Imagem: Paulo Muzio.
Pesquisador de robótica e consciência artificial, Alexandre Simões acredita que é necessária a discussão para uma regulação mundial dessas tecnologias, mesmo que elas ainda estejam longe de seu potencial pleno. “Drones ou robôs não são diferentes do que qualquer outro tipo de tecnologia avançada, como a energia nuclear, por exemplo. A humanidade precisou de várias décadas para conseguir algum tipo de acordo global para equacionar – ainda que de forma bastante preliminar – o uso de dispositivos nucleares”, comenta.
Chappie e Star wars: droids de estimação
A distopia dos robôs, liderada pelos drones, também já virou piada. O diretor Jordan Rubin resolveu ridicularizar o “perigo alado” usando os modelos com câmeras, mais conhecidos do público, para fazer piada no curta O drone. A produção independente foi editada para parecer o trailer de um filme de terror, no qual o veículo voador toma autoconsciência e decide matar um casal.
Já Chappie (2015) aborda androides, inteligência artificial e mostra um grande drone controlado por Hugh Jackman, com a ajuda de uma máquina que realiza leituras de suas ondas cerebrais. Chamado SANDF, o drone é uma referência ao ED-209, do Robocop original. Mas o que parece manter o gênero da ficção científica vivo, mesmo com a tecnologia presente no filme já ser em grande parte realidade, é o fato de o universo do filme ser uma distopia.
Por outro lado, há a franquia Star wars, que ainda parece manter a sua mística e seu fiel público. A “ópera espacial” criada por George Lucas ganhou seu sétimo capítulo nas mãos do estúdio Disney em 2015. O despertar da força apresenta novos personagens, dentre eles, o droid – termo criado pela franquia – BB-8. O pequeno robô conquistou o público nas telas e virou um brinquedo, controlado de forma idêntica a um drone, para lazer.
O BB-8 real é fabricado pela Sphero, startup especializada em robôs esféricos, criada por Ian Bernstein e Adam Wilson. A companhia participou de programas de aceleração – quando vários tutores e investidores ajudam a tirar uma ideia ou produto do papel. O robô esférico, controlado pelo smartphone atraiu a atenção da Disney e virou um brinquedo carismático, mas caro – cerca de R$ 2.300.
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