Um dos mais importantes desafios para a ciência brasileira
nesta segunda década do século XXI é o de buscar maior impacto mundial para o conhecimento
criado no país. A produção de ciência de maior qualidade requer a colaboração
entre os cientistas mais capazes e, por isso, em muitos casos, é importante
ultrapassar as fronteiras nacionais.
O indicador mais simples que caracteriza o impacto científico
é o número de citações por artigo científico publicado em revistas científicas
de circulação internacional. Em 2009, para o Brasil, o número de citações por
artigo1 foi 0,59,
enquanto para a China foi 0,73, para a Argentina, 0,84, para a Espanha, 1,11,
para os Estados Unidos, 1,50, e para o Reino Unido, 1,57. A evolução do impacto
dos artigos originados no Brasil e em alguns outros países é mostrada na Figura 1.
Figura 1. Impacto da produção científica do
Brasil e de alguns outros países para os artigos publicados em 1981, 1991,
2001, 2006 e 2009. (Fonte: Thomson Reuters InCites 2009).
É notável que o indicador de citações por artigo para o
Brasil piorou a partir de 2006, quando chegou ao pico de 0,71 citações por
artigo, o que parece estar relacionado ao aumento da quantidade de títulos
publicados no país e que passaram a ser incluídos no Web of Science a partir de
2007, levando a um aumento do número de publicações (que passaram de 19 mil
para 30 mil).
Fatores que afetam o impacto dos artigos vão desde o
compromisso das instituições de origem com a excelência acadêmica, sua
capacidade de financiamento e adequação de infraestrutura de pesquisa até a
existência de co-autoria de outros países e a língua em que o artigo é
publicado1. Neste artigo
vamos analisar os aspectos relativos à co-autoria internacional e como eles
podem contribuir para que os artigos originados no Brasil venham a ter mais
impacto.
O efeito da co-autoria no impacto dos artigos originados no
Brasil foi analisado por Leta e Brito Cruz2, verificando-se
que entre os artigos publicados em 1998, aqueles com co-autores internacionais
receberam 72% mais citações do que os sem co-autores internacionais. Mais
recentemente, a Royal Society publicou um estudo no qual se demonstra que
quanto maior o número de países dos co-autores, maior o impacto dos artigos3. No mesmo
relatório, a Royal Society mostrou que, diferentemente do ocorrido com países
líderes em criação científica, no Brasil, a intensidade de co-autorias
internacionais caiu de 35% do total de artigos em 1996 para 27% em 20084. Outro relatório
da Royal Society refere-se a ganhos de até 50% no impacto de artigos em
colaboração com Estados Unidos e França, e 30% de ganho nos artigos em
colaboração com Brasil5.
Pelo exposto, urge desenvolver instrumentos de fomento para
estimular e apoiar o estabelecimento de mais colaborações internacionais para a
ciência brasileira. O CNPq e a Capes têm programas tradicionais para esta finalidade,
bem como têm desenvolvido acordos internacionais importantes6. Na 4ª
Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, Jacob Pallis elencou as
iniciativas dessas agências federais e mostrou também as iniciativas da
Academia Brasileira de Ciências na participação em organismos internacionais
relativos à ciência7. Na mesma sessão
da 4ª CNCTI, Brito Cruz defendeu a necessidade de iniciativas para a
internacionalização da ciência brasileira8, elencando
algumas das iniciativas da Fapesp para isso9, como as Escolas
São Paulo de Ciência Avançada e a busca, no exterior, de candidatos aos
programas de pós-doutorado e de jovens pesquisadores. Esta última foi adotada
como uma das conclusões da 4ª CNCTI que se refere à busca de talentos no
exterior como uma forma de “brain gain”10.
É desejável que as FAPs se unam a esse esforço, como algumas delas já vêm
fazendo há alguns anos. Como exemplo, várias FAPs assinaram acordos com o INRIA
francês em 2010, publicando editais para a seleção de propostas visando a
intercâmbio e pequenos financiamentos de projetos de pesquisa. A Fapemig
ofereceu em 2010 um edital para intercâmbio com a Universidade de Queensland,
na Austrália, e a Facepe já publicou três editais com a Fapesp e a ANR francesa,
buscando projetos de pesquisa colaborativos em temas relacionados à oceanografia.
É importante oferecer meios e incentivar uma atitude mais
ousada e agressiva na busca de interações por parte da comunidade científica. A
qualidade de muitos projetos de pesquisa em andamento no país justifica tal
agressividade na busca de pós-doutores, alunos de pós-graduação e visitantes
temporários. Para isso, há instrumentos já disponíveis, e é necessário mais
ênfase para se dar publicidade às oportunidades disponíveis, por meio de
anúncios nas revistas internacionais relevantes na área, além da tradicional
comunicação pessoal em redes de pesquisadores destacados.
Na Fapesp, uma estratégia institucional de
internacionalização tem levado à criação, nos últimos anos, de um amplo
conjunto de iniciativas. De 2005
a junho de 2011, a Fapesp já apoiou mais de 240 projetos
de pesquisa colaborativos, incluindo alguns de grande porte, com dezenas de
instituições estrangeiras de primeira linha11.
Fazem parte desta estratégia o apoio à publicação de livros
em língua estrangeira para distribuição mundial por editoras capacitadas para
tal, inclusive algumas das editoras universitárias brasileiras, e o envio de
estudantes de graduação e de pós-graduação para estágios de alguns meses no
exterior12, além de
anúncios mundiais das posições de pós-doutorado e jovem pesquisador13. Como exemplo
para o intercâmbio de estudantes, a Fapesp mantém acordos com a NSF e o MIT nos
Estados Unidos.
Uma outra iniciativa da Fapesp que tem trazido já ótimos
resultados é o Programa de Escolas São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA)14. Nas ESPCAs se oferece,
em termos competitivos, via chamada de propostas, recursos para a organização
de cursos de curta duração em pesquisa avançada, nas diferentes áreas do
conhecimento, no estado de São Paulo. Em cada ESPCA, a formação dos participantes
contribui para se criar no estado de São Paulo polos de atração de talentos
científicos mundialmente competitivos. Os professores que lecionam as
disciplinas nas ESPCA devem ser cientistas de excelente qualificação e destaque
em seus campos de pesquisa, incluindo-se cientistas estrangeiros convidados. Os
estudantes participantes devem estar matriculados em cursos de graduação ou
pós-graduação no Brasil ou exterior, sendo potenciais candidatos aos cursos de
mestrado, doutorado ou a estágios como pós-doutores em instituições de ensino
superior e pesquisa no estado de São Paulo. Também podem ser aceitos alguns
jovens doutores. As primeiras ESPCA começaram a ser realizadas no primeiro
semestre de 2010 com excelente repercussão15
e já houve 19 ESPCAs aprovadas. Como cada ESPCA traz a São Paulo em média 50
estudantes estrangeiros, com essas 19, foram trazidos em torno de 450.
No que diz respeito a projetos de pesquisa colaborativos, há
duas iniciativas complementares. Primeiro, para que os pesquisadores em São Paulo possam iniciar
colaborações e preparar projetos de médio e grande porte com colegas de outros
países, a Fapesp tem estabelecido acordos com várias universidades e
instituições de pesquisa no estrangeiro, em países como Reino Unido, França,
Holanda16; esses acordos permitem também o
intercâmbio de estudantes. Em segundo lugar, acordos com agências de
financiamento à pesquisa17 do Reino Unido,
França, Alemanha, Dinamarca, Argentina e Portugal garantem a oportunidade para
a submissão de propostas completas de pesquisas17.
Dentre os acordos com agências, os mais abrangentes são com
os sete Conselhos de Pesquisa do Reino Unido (RCUK) e com o DFG da Alemanha. No
acordo com os RCUK, um pesquisador em São Paulo pode se associar com um colega do Reino
Unido para preparar uma proposta de pesquisa que será analisada conjuntamente
pela Fapesp e pelo RCUK. Sendo aprovada, a Fapesp financiará o orçamento
aprovado para o pesquisador principal em São Paulo e o RCUK financiará o orçamento
aprovado para o pesquisador principal no Reino Unido. De forma análoga, mas sem
a análise integrada, funciona o acordo Fapesp-DFG que já tem seis projetos
aprovados. Recentemente, a Fapesp completou o processo de seleção de propostas
no primeiro edital em parceria com o Conicet argentino e foram aprovadas dez
propostas de projetos de médio porte.
Finalmente, o acordo Fapesp-Microsoft Research permite que
pesquisadores em São Paulo
desenvolvam projetos de pesquisa em que interagem com colegas dos laboratórios
da Microsoft Research em Redmond (Estados Unidos) e em outras localidades.
O desenvolvimento das FAPs tem sido um acontecimento auspicioso
para o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil. Elas podem ter um
papel fundamental no desenvolvimento e na intensificação da cooperação
internacional em pesquisa e várias delas já estão dando passos definitivos para
isso. É de todo desejável que os governos estaduais prestigiem suas FAPs, como
São Paulo sempre fez e como o Rio de Janeiro e Minas Gerais chegaram a fazer
depois de 2006.
Carlos Henrique de Brito Cruz é diretor científico da Fapesp.
|