09/03/2007
Segundo
Lohmann, o Protocolo, e principalmente o comércio de carbono nele
previsto, muda pouco no cenário mundial das emissões de carbono.
Trata-se um mecanismo de mercado, pouco prático e nada efetivo, que
promove o comércio do direito de poluir. Acabou funcionando de maneira
perversa, ao drenar as atenções de soluções mais radicais e efetivas
que, agora, se mostram urgentes. O autor do livro Carbon Trading,
aponta que a única saída é promover uma regulação dura, que taxe e
controle a indústria poluente, ao lado de reformas estruturais e
investimentos fortes na redução do consumo de energia.
ComCiência
- Em um artigo recente, o senhor descreveu o mecanismo de comércio de
créditos de carbono como “um aparato esclerosado de mercado”. Quais as
suas principais críticas ao comércio de carbono? Em um mundo governado
por mercados por que uma solução de mercado não pode funcionar?
Larry Lohmann - Para
tornar algo comercializável, é preciso muito trabalho. Ao longo de
séculos, tornou-se possível comercializar algumas coisas – prata, soja,
carros – mas outras não. A mitigação da mudança climática é uma dessas
“outras coisas”. Um dia, talvez, alguns dos obstáculos que impedem o
comércio efetivo do carbono serão superados. Mas a maior parte nunca
será.
Uma dificuldade é que todas as
tentativas atuais para transformar o carbono em negócio acabam ajudando
os piores poluidores a continuar poluindo. Hoje, os setores industriais
mais responsáveis pela crise climática estão ganhando enormes pacotes
grátis de recém-criados direitos de poluir que eles podem transformar
em enormes lucros. Na Europa, por exemplo, as usinas de geração de
energia estão colecionando centenas de milhões de libras por ano, de
lucros que caem do céu, simplesmente por fazerem o que sempre fizeram,
enquanto o cidadão comum sofre com o aumento do preço da eletricidade,
os que poluem menos não ganham nada e os que desenvolvem energias
renováveis estão à míngua. É exatamente o contrário do princípio
“poluidor - pagador”, é o princípio “quem polui, ganha”. O que
aconteceu é que, assim que a capacidade da Terra de limpar sua própria
atmosfera do dióxido de carbono se tornou um valor, essa qualidade já
foi convertida em propriedade particular e apropriada pelos ricos.
No entanto, isso é só o começo. Os
grandes poluidores se beneficiam também comprando direitos de poluir
mais, a partir de projetos em que eles investem no exterior e que,
supostamente, economizariam carbono. Por exemplo, uma empresa britânica
de cimento ou de petróleo que quer continuar a poluir do mesmo jeito de
sempre, mas não recebeu suficientes cotas grátis de poluição por seus
governos, pode suprir a desvantagem simplesmente comprando créditos a
baixo custo de, digamos, uma estação eólica na Índia, “economizadora de
carbono”, um plano na Coréia para eliminar geladeiras com gases HFC
(hidrofluorcarboneto), que contribuem para o aquecimento, ou um
programa de eficiência energética na África do Sul ou, ainda, um
projeto no Brasil para gerar eletricidade queimando gases de um lixão.
Esses projetos oferecem, de bandeja, um turbilhão de direitos futuros
de poluir, para o conjunto já enorme de direitos à disposição das
corporações do Norte.
E, além de ser injusto, tudo isso
simplesmente encoraja os piores poluidores do Norte a protelar o
afastamento estrutural dos combustíveis fósseis que a questão climática
exige a longo prazo. Por que inovar se você pode, ano após ano, comprar
direitos de poluição baratos de alguém? Na Europa, até as próprias
indústrias, em alguns casos, estão apontando que essa não é a maneira
de enfrentar a mudança climática, e estão apelando para uma
regulamentação mais dura no longo prazo.
Nem os projetos chamados de
“economizadores de carbono” (carbon saving) que estão sendo montados em
países como o Brasil estão enfrentando o problema climático. Só 2% dos
créditos registrados pelo Mecanismo de Desenvolvimento Limpo do
Protocolo de Quioto estão sendo gerados por projetos de energias
renováveis. E, até mesmo esses projetos, ao invés de substituirem o uso
de combustíveis fósseis, simplesmente autorizam seu uso em algum outro
lugar. As instituições por trás desses projetos, que vão desde o Banco
Mundial até à Tokyo Power Tokyo Electric Power Co., grande corporação
de energia, são exatamente aquelas mais comprometidas em queimar cada
vez mais carvão, petróleo e gás. O final lógico dessa abordagem é uma
paisagem coberta com carcaças de estações eólicas e solares, e
plantações abandonadas de biocombustível, tudo torrando numa atmosfera
tão quente que não pode mais hospedar a civilização humana.
Do ponto de vista científico, um dos
aspectos que mais afetam as esperanças no comércio de carbono é que,
simplesmente, não é possível verificar se os créditos de carbono que
fluem no mercado vindo de tais projetos, serão eficazes do ponto de
vista climático. Isso significa que os consultores e os
contabilizadores de carbono contratados pela indústria podem,
teoricamente, fazer qualquer afirmação sobre quanto carbono estariam
“economizando”. O dilema resultante para os que comercializam carbono é
insolúvel: de um lado, o mercado precisa de um fluxo de créditos
padronizados e baratos. De outro, quanto se insiste em se tentar criar
tal fluxo, menos acreditáveis se tornam os créditos de carbono e, por
consequência, menos crível o mercado.
Muitas pessoas comuns do Sul têm
preocupações mais imediatas a respeito do comércio de carbono. Em
geral, os créditos de carbono não estão sendo gerados por
empreendedores verdes ou por indústrias que estão abandonando os
combustíveis fósseis e, sim, por criminosos ambientais locais, enquanto
as comunidades que defendem suas terras contra a exploração de petróleo
ou contra usinas de carvão estão sendo ignoradas. Afinal, são os
grandes poluidores que tendem a estar na melhor posição para contratar
empresas de consultoria em carbono ou para ligarem-se a funcionários
públicos e pagar para que seus projetos sejam registrados no mercado de
carbono da ONU. Em Minas Gerais, comunidades locais há muito tempo
lutam contra os abusos da monocultura latifundiária de uma plantação de
árvores, criada por uma empresa de ferro-gusa que tentou vender
créditos de carbono alegando que, se não conseguisse isso, teria que
usar como combustível carvão mineral em lugar de carvão orgânico. Na
Índia, no estado de Chhatisgarh, indústrias de ferro esponja
(pré-reduzido), que são notoriamente poluidoras e ávidas por consumir
água, estão tentando vender créditos de carbono por fazer na maquinaria
melhorias mínimas que, provavelmente, já haviam planejado fazer de
qualquer maneira. No mundo inteiro, muitas comunidades que nossa rede
entrevistou não tinham idéia de que os maus cidadãos de empresas locais
estavam ganhando dinheiro extra no mercado de carbono – e não ficaram
felizes em saber.
O lado bom deste cenário é que eu
acho que não vai levar muito tempo para que o mundo dos negócios se
acostume com o fato de que o mercado de carbono não funciona. O mundo
dos negócios é acostumado a lidar com coisas não comercializáveis. De
fato, sua vida depende disso. Ele tira vantagem de bens comuns físicos
e intelectuais de todo tipo. Obtém coisas de graça do Estado. Utiliza
aterros sanitários gratuitamente. Não poderia sobreviver sem relações
familiares, relações clientelísticas etc. O mundo dos negócios entende
e sabe que o mundo não é, na realidade, governado pelos mercados. E sobreviveu muito bem, ao longo de sua história, sem o mercado da poluição. Para o big business,
uma vez que ele reconheça as impossibilidades concretas, a noção de que
“o mundo é governado pelos mercados” não será um argumento muito
persuasivo para se tentar criar esse mercado de carbono em particular.
ComCiência – Mas há alguma alternativa? Ao que parece, o mundo não vai parar de usar combustíveis fósseis no curto prazo.
Lohmann -
Precisamente o fato de que existe muita inércia torna crucial fazer com
que as elites mundiais que engordam usando combustível fóssil sejam
pressionadas a caminhar imediatamente em direção a mudanças estruturais
na forma como usam a energia, como projetam sistemas de transporte e
assim por diante. As sociedades industrializadas precisam começar uma
reestruturação séria já. Caso contrário, dificuldades e custos
crescerão exponencialmente. Como muitos cientistas do clima concordam,
grande parte dos combustíveis fósseis que ainda estão no subsolo deve
ser deixada lá. O mercado de carbono simplesmente se interpõe nesse
caminho, adiando a mudança estrutural e tirando dela recursos e engenho
humano.
Provavelmente só em um ambiente
intelectual profundamente degradado pela ideologia neoliberal o mercado
de carbono pode parecer como a “única alternativa” no campo climático.
A verdade é que o comércio de poluição nunca foi nada mais do que um
espetáculo secundário inflado, um artifício mal ensaiado para
economizar o dinheiro de grandes corporações ao fazer pequenos cortes
de emissão a curto prazo. O artifício já havia resultado em grandes
problemas no único país onde fora testado antes de 1997, os EUA, e é
simplesmente inapropriado e impraticável quando aplicado a um problema
global científica e politicamente complexo como a mudança climática.
A ação de verdade sobre a mudança
climática sempre aconteceu em outros campos, e sempre será assim. Os
governos dos países industrializados precisarão transferir subsídios
dos combustíveis fósseis para energia renovável. Precisarão empreender
investimentos públicos grandiosos em eficiência energética e
transportes, para fornecer a seus cidadãos mais opções sobre como
utilizar energia. Precisarão aplicar a regulação convencional e
taxações de maneira mais radical. Enquanto isso, comunidades na Nigéria
e até no Alasca continuarão resistindo à perfuração petrolífera e à
mineração de carvão em suas terras e continuarão defendendo ou
desenvolvendo seus próprios modos de vida com baixo uso de carbono.
Deverão ser apoiados, e não prejudicados, nessas lutas.
ComCiência- No último Fórum
Social Mundial, no Quênia, o senhor citou e criticou o que chamou de
remendos tecnológicos. Pode nos explicar o que é isso?
Lohmann - Tem uma
história maravilhosa sobre um grupo de pessoas que tentou tirar um
carro que rolou uma rampa abaixo, num cais, e estava quase
completamente submergido. A primeira coisa que as pessoas fizeram foi
arrumar um caminhão e algumas cordas para tentar trazer o carro para a
superfície. No começo, tudo foi bem. Mas assim que o pára-brisa do
carro começou a aparecer sobre a água o caminhão começou a patinar, deu
ré e foi parar na água junto com o carro. O grande número de
espectadores então começou a debater sobre o que fazer. Depois de
alguma discussão, eles tentaram trazer um terceiro guincho, ainda
maior, para prenderem ao primeiro guincho e trazê-lo para fora. Mas o
segundo caminhão também patinou e foi parar na água. Depois de uma
discussão forte entre a crescente multidão de homens, cada um deles
tinha uma teoria sobre como resolver o problema, e um terceiro guincho
foi providenciado para tirar o segundo guincho para fora da água.
Infelizmente o destino desse guincho foi o mesmo dos outros: água.
Nesse momento, a multidão de homens era consideravelmente grande.
Muitos conselhos técnicos foram trocados, muitos braços foram
levantados e muitas teorias fizeram progressos. No final do debate um
quarto guincho, ainda maior enganchou-se à última vítima. Vocês
adivinhem o resto. No final do dia cinco veículos jaziam sob o cais,
com apenas seus tetos acima da água e o carro original não chegou nem
perto de ser resgatado.
Remendos tecnológicos são um pouco
como isso. Um pequeno grupo da sociedade insiste repetidamente em usar
um conjunto limitado de aparatos técnicos para resolver um problema
complicado, sem se importar com quantas vezes eles falham. Seja por
causa de seus interesses políticos ou financeiros, ou por seu
conhecimento limitado, o grupo resiste a aprender com a história e
analisar a complexidade do problema e os recursos disponíveis. É esse o
grupo que toma a decisão, então para ele o problema é como se fosse um
prego já esperando para ser martelado. Se você acha que o exemplo do
guincho afundado é engraçado, lembre-se do exemplo do Banco Mundial,
que falhou por 60 anos consecutivos em seu suposto objetivo primeiro –
diminuir a pobreza – e continua usando dos mesmos métodos.
É claro, falando politicamente é mais
complicado do que isso. A pessoa que me contou a história do guincho
estava tentando argumentar que o fracasso em resgatar o carro tinha
algo a ver com a obstinação do homem, a abordagem auto-destrutiva
masculina para o problema. e claramente isso é verdade. Mas, falando
como homem, eu também consigo detectar muitos “sucessos” momentâneos
nesses fracassos. Note, por exemplo, que cada falha, por ter trazido
mais problemas, fez com que mais homens dessem palpites e mais donos de
guinchos se envolvessem nesse empreendimento excitante. Em inglês,
chamamos isso de “job for the boys”, serviço para os garotos. Além
disso, a abordagem persistente dos homens gerou uma idéia de batalha
heróica contra a natureza, um desejo renovado de “acertar o problema na
cabeça até que ele morra”. “Nós não estamos parados, estamos em ação!”,
os homens podem dizer “tudo bem, pode ter dado errado, mas qual a
alternativa?”. Tal luta pode oferecer material para intermináveis
conversas de bar. Em certo sentido, na verdade, quanto menos eficiente
for um remendo tecnológico melhor, porque mais serviço de garotos será
criado, mais esses trabalhos vão durar, e mais histórias para contar
surgirão no final. Se um remendo tecnológico não tem chance alguma de
ter sucesso, ainda melhor. Vai se ter serviço para sempre, uma vida
inteira de histórias a se contar. Ou pelo menos até que o mundo acabe.
A atual política para o clima é cheia
de remendos tecnológicos, porque poucas pessoas no governo ou na
indústria querem enfrentar o problema em suas raízes políticas e
sociais, especialmente o excessivo e desigual uso de combustíveis
fósseis. Agora temos muito falatório sobre biocombustíveis,
armazenamento geológico de carbono, fertilização dos oceanos, florestas
de árvores geneticamente modificadas, partículas reflexivas a serem
espalhadas na atmosfera, análise de custo-benefício, créditos de
carbono. Cada um desses remendos tecnológicos cria uma cadeia de novos
problemas sem resolver o problema original. Por exemplo, fazer uma
análise de custo-benefício sobre quando devemos fazer algo sobre o
aquecimento global traz um novo risco porque, entre outros, esse tipo
de análise trata a mudança climática como algo linear ao invés de
não-linear e subestima as ignorâncias e incertezas que caracterizam a
ciência climática para calcular “probabilidades”. Do mesmo modo, a
troca em créditos de carbono a partir de projetos de “seqüestro” de
carbono requer um processo de fiscalização e acompanhamento que tem, em
si, efeitos contra-produtivos. Por exemplo, para quantificar a
contribuição de um projeto para a diminuição dos níveis de gases estufa
é preciso imaginar um cenário único descrevendo “o que teria
acontecido” sem a existência do projeto. Ao confundir, misturar,
previsão e processo de decisão isso simplesmente levanta a questão
sobre o que pode e o que não pode ser feito contra o aquecimento
global. Isso passa a substituir a discussão sobre mudanças estruturais
nas sociedades industrializadas pela interminável disputa escolástica
entre consultores sobre números sem sentido. Neoliberalismo,
profissionalismo estreito, elitismo e as classes políticas estão se
combinando para produzir remendos tecnológicos que só criam novos
problemas.
ComCiência - O Protocolo de
Quioto teve amplo apoio popular, mesmo sem a assinatura dos Estados
Unidos e mesmo propondo reduções muito pequenas na emissão. O senhor
considera que o Protocolo da Quioto foi uma má idéia? Se os EUA
tivessem assinado faria alguma diferença? O que precisa mudar para um
novo e mais eficiente acordo internacional?
Lohmann - A
Convenção -Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC),
de 1992, trouxe alguns bons princípios. Ajudou a trazer atenção para o
assunto e reconheceu que o Norte, não o Sul, era o principal
responsável pelo aquecimento global e tinha maior dever de agir. Mas em
1997, com o Protocolo de Quioto, as grandes complexidades do comércio
de carbono começaram a dominar as negociações internacionais. O
resultado foi um monte de tempo perdido em um processo contraproducente
tão complicado que, poucos que estão por fora dele, conseguem entender.
É importante lembrar que os EUA
estavam por trás do impulso de tornar o Protocolo de Quioto um
documento pelo comércio de carbono. A Europa e o Sul estavam
inicialmente céticos, e só mais tarde caíram na pressão dos EUA. Embora
os EUA tenham, mais tarde, abandonado o Protocolo de Quioto, várias
empresas dos EUA estavam, e continuam, a favor dele. A Enron é um bom
exemplo. Ela apoiava o Protocolo de Quioto porque queria ganhar
dinheiro com o comércio de carbono – e enfureceu-se por George W. Bush
não assinar o tratado. Corporações como a ExxonMobil (Esso), por outro
lado, não gostavam do Protocolo pois não estavam preparadas para se
beneficiarem tanto do comércio de carbono e, inicialmente, não queriam,
de nenhuma forma, admitir que as ações humanas estavam causando a
mudança climática. Bush ligou-se ao grupo da Exxon. Mas mesmo que os
EUA tivessem assinado Quioto ele ainda teria representado apenas o
triunfo de uma facção das empresas dos EUA sobre a outra.
A diferença entre essas duas facções
dos negócios é significante, mas o que me interessa mais é o que
comungam muitas das empresas pró e anti Quioto nos EUA. Podemos dizer
que é a diferença entre a Enron e a Exxon, ou podemos dizer que é a
diferença entre Al Gore
e George W. Bush. São as diferenças entre duas abordagens pró poluição.
Nenhuma delas quer enfrentar as raízes do problema do clima. Ao invés
disso, ambas se detêm principalmente em usar a crise climática como uma
nova oportunidade para a acumulação de capital. Um acordo efetivo
deveria abandonar as duas abordagens – a da Enron e Exxon e a de Al
Gore e George W. Bush. O que é preciso, ao invés disso, é: abrir para
um público mais amplo o que foi inicialmente um debate muito técnico;
discutir abertamente a política que se esconde por trás de tratados
como Quioto; não assumir, sem evidências, que a solução reside no
comércio; estudar a história de efetivos movimentos políticos por
mudança tanto quanto se estuda a climatologia; e apoiar as abordagens
construtivas que já existem.
ComCiência – Os países
subdesenvolvidos dizem ter o direito de poluir por não terem feito isso
historicamente. O senhor concorda com essa idéia? É possível melhorar
os padrões de vida nos países pobres sem aumentar as emissões de
combustíveis fósseis?
Lohmann - As pessoas
do Norte não têm autoridade moral para dizer às pessoas do Sul que
estas não podem usar carvão, petróleo ou gás. Mas as pessoas do Sul têm
essa autoridade e esse direito. E muitos o estão exercendo. Para cada
governo do Sul que patrocina a industrialização com uso intensivo de
combustíveis fósseis, há dúzias de governos de movimentos sociais da
mesma região lutando contra a perfuração de poços de petróleo,
mineração de carvão, realocação de populações, geradoras de energia
muito poluidoras, os dutos de gás e a emissão de carbono, assim como há
movimentos explorando e experimentando alternativas energéticas não
poluidoras. Como as pessoas podem melhorar seu padrão de vida, seja lá
o que “padrão de vida” signifique, é uma questão de poder político e
democracia, não apenas o conjunto limitado de tecnologias que as
grandes empresas deveriam ser encorajadas a adotar. É interessante
lembrar que há 35 anos, antes da era da política das mudanças
climáticas, o falecido Ivan Illich observou que uma política de baixo
uso de energia permite um grande número de escolhas de maneiras de
viver, se “uma sociedade opta pelo alto consumo de energia, suas
relações socias passam a ser ditadas pela tecnocracia, e esta será
intragável de qualquer forma, seja ela capitalista ou socialista.”
ComCiência - Esta entrevista é para leitores brasileiros. Há algo especial que queira acrescentar?
Lohmann - A crise
climática, assim como todos os problemas ambientais, envolve poder,
direitos, acesso, terras, capital e muitos outros assuntos políticos. É
um problema que compete a todos, não só aos cientistas, economistas e
autoridades governamentais. A rede internacional de que participo, o
Grupo Durban pela Justiça Climática, está tentando pensar nas melhores
maneiras de se contatar ativistas de base, sindicatos, organizações
indígenas, associações de agricultores, povos da floresta,
historiadores, igrejas e muitos outros – incluindo, é claro,
cientistas, economistas e partidos políticos. Temos vários colegas do
Brasil trabalhando com assuntos como direito à terra, reflorestamento,
biocombustíveis e outros – assim como temos colegas na Costa Rica,
Equador, Uruguai, Uganda, África do Sul, Índia, Indonésia, Suécia,
Estados Unidos, Reino Unido, Espanha e Samoa – e eles estão sempre
buscando novos companheiros. Também estamos planejando traduzir nosso
livro mais recente, Carbon Trading (disponível, em inglês, em: www.thecornerhouse.org.uk ou www.dhf.uu.se) para o português. Quem quiser trocar idéias, por favor, entre em contato!
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