Um dos mais antigos e conhecidos centros de pesquisa do mundo, o Massachussetts Institute of Technology (MIT), é também um dos maiores exemplos quando se fala em multicentro. Fundado em 1861, hoje o MIT abriga laboratórios nas áreas de energia, nanotecnologia, ciência nuclear, biomedicina, ciência da informação, ciências humanas, entre outros. Apesar disso, potenciais multicentros brasileiros apontam como referência o modelo europeu de pesquisa, da constituição de centros ancorados em universidades, embora tenham um jeito próprio de existir. Em todas as instituições, no entanto, permanece uma questão que é consensual: a multidisciplinaridade é chave na busca por resolução de problemas.
Carlos Aragão, diretor do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), ressalta que no Brasil há uma característica própria de reunir biociências e nanotecnologia com bioetanol e, no seu caso, com síncrotron. “Exatamente como o CNPEM não há”, compara em relação ao síncrotron suíço – Swiss Light Source (SLS) – e o European Synchrotron Radiation Facility (ESRF), em Grenoble, na França.
Nascido do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), por sua vez inaugurado em 1997, o centro, que fica no Polo II de Alta Tecnologia de Campinas, só passou a ser conhecido como CNPEM em 2010, momento em que já haviam sido criados outros dois laboratórios nacionais: o de Biociências (LNBio) e o de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE). A estes se juntou, no ano passado, o Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano). A Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncotron (ABTLuS), responsável por gerir o CNPEM, está atualmente em processo para assumir o nome do centro como nome também da própria organização social.
Nem todos os projetos de pesquisa realizados no CNPEM se utilizam da interação entre os laboratórios, como esclarece Aragão, mas ter a possibilidade de tratar um mesmo problema à luz de diversas especialidades é, na opinião do diretor, a grande vantagem de um centro de pesquisas multidisciplinar. “Há problemas em que você precisa de físicos, químicos, matemáticos, de gente da área de engenharia... Na minha visão é um grande ganho ter, em um mesmo campus, competências que são complementares e que permitem que se estude determinada questão com pessoas de formações diversas e equipamentos também complementares, o que amplia muito as possibilidades de solução do problema”, afirma.
A constituição de multicentros é uma tendência internacionalmente difundida. A razão básica para este fenômeno é a demanda crescente por diferentes competências para lidar com problemas cujo grau de complexidade transcende uma determinada área específica. “É uma tendência da ciência e tecnologia modernas que tem se consolidado e essa interação vai ocorrer cada vez mais”, defende Aragão.
Embora a multidisciplinaridade seja uma característica comum do ambiente das universidades, em geral, nem sempre há a interação entre áreas de conhecimento nas pesquisas realizadas nesse ambiente. O diferencial de um centro formado com o objetivo da multidisciplinaridade é a já pressuposta integração de capacidades, que resulta numa natural troca de informações entre os laboratórios e na utilização de uma linha de pesquisa – inicialmente desenvolvida em biociências, por exemplo – para diversas finalidades – podendo ser aproveitada, como cita o diretor do CNPEM, para nanotecnologia.
Outra característica marcante dos multicentros é que eles não são centros de pesquisa fechados em si próprios, ou seja, são geralmente abertos a usuários externos, tanto acadêmicos quanto do meio empresarial, em cooperações com empresas que tenham interesse na área de inovação, que parece ser uma tendência na nova concepção de instituições de pesquisa.
Tal pressuposição do trabalho em conjunto implica, no entanto, em que todos os grupos envolvidos atuem com velocidade similar na busca de recursos, de parcerias e de gerar conhecimento, tecnologia e inovação, o que, na opinião de um dos fundadores do Centro de Pesquisas em Processos e Materiais para a Indústria de Petróleo e Energia, em fase final de construção no principal campus da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), pode ser uma dificuldade. “O funcionamento e a perenidade de um centro de pesquisas multidisciplinar depende, fundamentalmente, da capacidade dos grupos de entregar resultados com qualidade”, alerta Ernesto Urquieta, coordenador de pesquisa do departamento de engenharia química da UFSCar e coordenador de pesquisa em catálise, materiais e energia no centro.
Uma segunda dificuldade que pode ser apontada é quanto ao financiamento. Alguns multicentros contam com o apoio de programas estaduais como o Cepid (Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que contempla apenas projetos de pesquisa essencialmente multidisciplinares. É o caso do Centro de Biotecnologia Molecular e Estrutural (CBME), com sede na Universidade de São Paulo (USP), no campus de São Carlos. Além de se utilizar dos laboratórios de Cristalografia de Proteínas e Biologia Estrutural do Instituto de Física da própria USP, o centro conta com parceria de biólogos moleculares do Departamento de Genética e Evolução e Departamento de Ciências Fisiológicas da UFSCar, dos laboratórios de Produtos Naturais e Síntese Orgânica do Departamento de Física também da UFSCar, e do próprio Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) do CNPEM. Mas a maioria dos centros acaba na dependência de parcerias com empresas interessadas no resultado das pesquisas, uma vez que não existem programas de incentivo nessa área por parte do governo federal, por exemplo.
Tendo iniciado as obras em 2009 e com previsão de entrega para o segundo semestre de 2012, o futuro Centro de Pesquisa da UFSCar conta com um investimento de R$ 20 milhões da Petrobras e abrigará nove laboratórios nas áreas de materiais, catálise, nanotecnologia, combustíveis limpos, lubrificantes e instrumentação. E ainda que não tenha sido inaugurado, já está em funcionamento, garante Urquieta: “Grandes projetos vem sendo desenvolvidos com os grupos de catálise, nanotecnologia, combustíveis, cerâmicas e refratários, e resultados atraentes já vêm sendo patenteados”. No que diz respeito a vantagens, Urquieta endossa o discurso de Carlos Aragão: “O desenvolvimento de pesquisa da maneira como se planeja nos multicentros tem, além das vantagens colocadas, a de que os resultados alcançados, em menor tempo e com os custos minimizados, poderão ter aplicação imediata contribuindo ao avanço da ciência e tecnologia do país, dessa maneira diminuindo a dependência tecnológica”.
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