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Reportagem
Da guerra à paz, uma incursão pelo mundo dos drones
Por Erik Nardini
10/06/2016
Vá a um parque de grande movimento em um final de semana e olhe para o céu. As chances de se observar um estranho aparelho com rotores, voando a médias altitudes e emitindo um característico zumbido de abelha é grande. E embora pareça ficção, em breve, as compras feitas no site da Amazon, a gigante do comércio eletrônico, serão entregues por um robô-carteiro que voa. Estamos falando do drone (que em inglês significa zangão), tido como sinônimo de veículo aéreo não tripulados (VANT).

O universo de drones é bem vasto. O termo abarca desde aparelhos de aeromodelismo, quadricópteros – que são os modelos comerciais mais comuns de VANT –, até as aeronaves não tripuladas de uso profissional e estritamente militar. Dentre as características comuns a todas essas modalidades destaca-se, sobretudo, o fato de os equipamentos serem operados remotamente e não serem tripulados.

Os tamanhos também diferem de acordo com seu uso. O VANT da Polícia Federal (PF) brasileira, por exemplo, tem 9,3 metros de comprimento e 16,6 metros entre suas asas. Diferente das versões de uso comercial e recreativas, o aparelho da PF mais parece um avião caça em escala reduzida e tem autonomia para até 37 horas de voo. Ele é utilizado em operações de monitoramento de fronteiras e em outras atividades de vigilância.

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VANT da Polícia Federal: autonomia de até 37 horas de voo (Divulgação/Polícia Federal)

Quase um videogame

Os drones, em suas versões civis modernas, são normalmente operados por meio de tablets acoplados a um joystick. Um software apto a controlar as funções do GPS, além de acelerômetro, sensores e outros aparatos tecnológicos do drone são instalados no tablet, através do qual é feita a comunicação entre o piloto – que, lembre-se, está na terra – e o robozinho voador. De operação relativamente simples, pilotar um drone não é muito diferente de controlar um jogo de videogame. O joystick permite que o piloto desloque o aparelho em todas as direções e controle tudo o que estiver acoplado ao VANT: câmeras, sensores, termômetros, entre outros.

A cada lançamento da indústria – que pode movimentar em todo o mundo cerca de US$ 127 bilhões, segundo relatório da PwC –, novas funções são acrescentadas, como detector de obstáculos, pousos em plataformas em movimento, retorno automático ao local de origem em caso de descarregamento de bateria, dentre outras funções. Como os modelos comerciais são pequenos, sua autonomia também costuma ser curta, não ultrapassando os 30 minutos de voo, uma limitação que deve ser superada à medida que novos aparelhos forem chegando às mãos dos consumidores.

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Controle do drone DJI Phantom 4 acoplado a um tablet: operação simplificada (Reprodução/DJI)

Tais brinquedinhos voadores caíram no gosto dos apaixonados por aeromodelismo e imagens aéreas nos últimos anos. A origem dos aparelhos, porém, remonta ao século XIX. “Tal qual o rádio, o GPS e as telecomunicações de maneira geral, os drones também surgiram em ambientes militares e depois foram sendo adotados para o uso civil”, esclarece Itala Cavalli, chefe da Divisão do Planejamento da Navegação Aérea Civil da Secretaria de Aviação Civil. No caso dos drones, o principal objetivo era preservar a vida de soldados em operações de elevado risco.

Ao ataque!

Durante a Primeira Guerra de Independência Italiana, em 1849, a Áustria controlava a maior parte da Itália, mas queria ainda mais. Os austríacos produziram balões autônomos equipados com bombas visando atacar Veneza (a outrora República de São Marcos). O burburinho acerca da geringonça voadora sem pilotos, à época, foi inevitável, como mostra nota da revista Scientific American de março daquele ano:

“Veneza está para ser bombardeada com balões de ar ... que estão em construção em Treviso. ... Em condições favoráveis, os balões serão lançados e dirigidos tão perto de Veneza quanto possível, e ao serem levados à posição vertical sobre a cidade, eles serão acionados por magnetismo elétrico por meio de um fio de cobre longo conectado a uma bateria galvânica instalada em terra. A bomba cai perpendicularmente, e explode ao atingir o solo".

Apesar de interessante, a primeira experiência com os objetos voadores, realizada em julho de 1849, não foi das melhores. “De fato, esses objetos não eram exatamente drones”, explica Cavalli, da Secretaria de Aviação Civil. “Eles estavam mais para balões que foram projetados para fazer um ataque a Veneza. Mas por razões diversas, com a mudança do vento, as bombas acabaram caindo mais na própria Áustria e em outros locais da Europa do que no alvo em si”.

O segundo ataque aconteceu em agosto daquele ano, e dessa vez os balões contavam com detonadores programados para explodir 30 minutos após seu lançamento. Mas de acordo com o pesquisador Russell Naughton, da Monash University na Austrália, os objetos novamente causaram mínimos danos a Veneza. Atrapalhados, esses balões são tidos como o primeiro registro de uso de um objeto voador não tripulado com funções predefinidas. Considerando-se os tempos modernos, especialistas concordam que o VANT israelense Mastiff, produzido pela empresa Tadiran, foi o primeiro drone realmente tecnológico e remotamente operado com vistas à vigilância de áreas de risco. Novamente, sua utilização militar se sobressai.

Os aparelhos continuaram a se modernizar ao longo das décadas, e seu uso foi intensificado durante as grandes guerras. Ao mesmo tempo, a utilização para fins de pesquisa, recreativos e em trabalhos de campo também começaram a crescer. O monitoramento de áreas remotas, as operações de alta periculosidade, o controle de pragas em plantações por meio da pulverização assertiva de pesticidas e até mesmo o controle do mosquito Aedes aegypti são exemplos de usos modernos dos drones.

Laboratório de robótica imprime seu próprio drone

O preço de um aparato como esse é proporcional ao nível de equipamentos a ele acoplados. A questão do orçamento e do tempo de prototipagem foi considerada pelo Laboratório de Aprendizado de Robôs (LAR) do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da Universidade de São Paulo (USP) São Carlos, que resolveu usar uma impressora 3D que já possuía desde 2013. Bastava encontrar um modelo de drone para ser impresso e começar o trabalho.

“Precisávamos montar um drone de baixo custo e cujas peças fossem de fácil reposição”, conta Eduardo Sacogne Fraccaroli, aluno de doutorado do ICMC e responsável pelo desenvolvimento do drone utilizando uma impressora 3D. Fraccaroli, orientado pela professora Roseli Francelin Romero, encontrou um projeto de drone open source, mas como ele não atendeu às expectativas, teve que “alterar totalmente o projeto de criação”, diverte-se, acrescentando que o projeto, o desenvolvimento e os testes do aparelho levaram cerca de um ano.

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Eduardo Fraccaroli com o drone feito em impressora 3D (Reprodução Youtube/Efraccaroli)

“Desenvolvemos um drone robusto para que fosse utilizado de plataforma base para diversas aplicações, tais como imageamento aéreo, tracking (rastreamento) de veículos, coleta de dados climatológicos e coleta de dados de plantações de laranja”, explica Fraccaroli, que construiu do zero o VANT. Com exceção da haste, do motor e da eletrônica, todas as partes do drone foram impressas no LAR. Seu funcionamento foi simulado em um software chamado SolidWorks, capaz de emular as situações do aparelho no mundo real. “A experiência com o SolidWorks é importante, porque nós conseguimos inclusive mapear os pontos de stress do aparelho para saber qual peça irá se danificar e onde exatamente ela irá quebrar em caso de queda”, conta o pesquisador.

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Área de trabalho do SolidWorks: modelagem 3D e cinemática de objetos (Reprodução/ BackyardRC)

As quebras costumam acontecer nos trens de pouso do aparelho, que absorvem impactos na aterrissagem. “De acordo com o projeto, o trem de pouso deve absorver o impacto em caso de queda, fazendo com que a parte eletrônica seja protegida. Em apenas algumas horas, é possível repor essas peças utilizando a impressora 3D”, lembra.

Novos voos: para onde vai a tecnologia?

Onde irão parar esses equipamentos? Quais serão as próximas tecnologias? A indústria tem o poder de desenvolver não apenas novos produtos, mas também de criar novas necessidades que ainda não conhecemos. A possibilidade do uso de drones parece, a priori, infinita. “A gente ainda não consegue visualizar todos os tipos de usos que podem ser feitos dessa ferramenta”, comenta Itala Cavalli, da Secretaria de Aviação Civil. “Nós estamos caminhando e conhecendo essa nova tecnologia junto com a sua própria evolução. É um assunto novo e um tema muito intrigante. Cada dia aparece algo novo”, conclui.