A
diversidade étnica, econômica e cultural da sociedade brasileira, somada aos
diferentes padrões de clima, informação e exigência dos consumidores, abre
espaço para o surgimento de milhares de empresas (de micro-confecções a grandes
indústrias de cosméticos) no país. O setor da beleza vem crescendo no Brasil,
para atender a um público cada vez mais segmentado, refletindo as influências
da moda, da mídia e dos movimentos sociais.
No ramo
de perfumaria e cosméticos, inúmeras marcas, linhas de produtos, embalagens e
preços visam suprir o gosto de cada consumidor, sendo os produtos para cabelos
(crespos, lisos, ondulados, secos, oleosos, danificados etc) um exemplo. Além
dos produtos étnicos, a indústria tem investido também em conceitos como
bem-estar, relaxamento do corpo e contato com a natureza, por meio de óleos
corporais, hidratantes etc. O desenvolvimento de produtos para retardar o
envelhecimento da pele, principalmente a do rosto, também recebe forte
investimento e aporte tecnológico. É um mundo de promessas, cor, jovialidade,
inovação tecnológica e auto-estima.
Segundo a
professora do Departamento de Economia da Universidade Federal Fluminense
(UFF), Ruth Helena Dweck, os brasileiros estão entre os povos mais vaidosos do
mundo, comportamento percebido pela produção brasileira da indústria de higiene
pessoal, perfumaria e cosméticos. A preocupação com a beleza impulsiona ainda o
setor de serviços, com a sofisticação dos salões e clínicas de estética e o
quase desaparecimento das barbearias, afirma Ruth, que coordenou o estudo
"O impacto socioeconômico da beleza – 1995 a 2004", tornado público
no início deste ano.
Segundo a
Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos
(Abihpec), o setor apresentou, entre 2001 e 2005, um crescimento médio de 10,7%
ao ano. No mesmo período, o PIB total brasileiro cresceu apenas 2,2% ao ano.
Contribuem para essa performance a maior participação da mulher no mercado de
trabalho; o interesse crescente dos homens por produtos de beleza; o aumento da
expectativa de vida e a conseqüente “necessidade” de parecer jovem; os ganhos
de produtividade decorrentes do uso mais intensivo de tecnologia, permitindo
que os preços praticados pelo setor nos últimos cinco anos subissem menos que a
inflação.
Os dados
da Abihpec mostram a existência de quase 1.400 empresas fabricantes de produtos
de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos em 2005. Do faturamento total, mais
de 70% provêm de 15 empresas de grande porte, indicando razoável concentração.
Estima-se
que, no ano passado, o setor tenha gerado mais de 2,8 milhões de oportunidades
de trabalho, entre revendedoras, cabeleireiros, esteticistas e outros. “Devido
à pouca qualificação exigida, o setor de serviços de beleza torna-se a grande
porta de entrada para o trabalho urbano, principalmente para as mulheres,
depois do trabalho doméstico. No entanto, vem crescendo o número de
profissionais com nível universitário e do sexo masculino”, afirma a professora
Ruth Helena Dweck. Os salários no setor continuam baixos – em média, 1,7
salários mínimos, enquanto a média nos serviços em geral é de três salários
mínimos.
A
professora da UFF destaca outra variável que ajuda a explicar o crescimento do
setor de estética e higiene pessoal no país: o fato de a beleza ser fator de
discriminação no mercado de trabalho. De acordo com os resultados de sua
pesquisa, pessoas de “boa aparência” tem melhor aceitação – e, inclusive,
melhor remuneração – em todos os setores da economia. “A maioria das mulheres e
um percentual crescente de homens se preocupam com a aparência e compram
produtos para melhorá-la. As mulheres de renda mais baixa comprometem,
proporcionalmente, uma parcela maior de sua renda com cosméticos do que as
mulheres de renda mais elevada”, adiciona.
Igualmente
decisiva para ratificar a importância socio-econômica da beleza é a indústria
da moda. Determinante das tendências de cores, estilos e padrões estéticos, a
moda tem a seu favor o imaginário coletivo, um fetiche relacionado à elegância
e as aspirações pessoais voltadas ao “ser belo”, conferindo aos fatores
psicológicos um peso cada vez maior nas decisões de compras.
As
vitrines, por exemplo, têm função importante nessa construção psicológica. Nos
shopping centers e nas butiques refinadas, as vitrines se caracterizam pela
disposição de peças e acessórios na forma de conjuntos. Mais do que um produto,
a loja vende um estilo, reforçado pela decoração e pela música do ambiente, cujo
objetivo é aproximar o consumidor de sua privilegiada posição social. Já o
grande comércio varejista distribui suas peças de roupas de forma aleatória,
enquanto nos sacolões populares a vitrine muitas vezes nem existe. Predominam
os produtos dispersos horizontalmente em grandes bancadas e os dispostos em
araras. Ao contrário da idéia de conjunto, a desvinculação entre as peças visa
desconfigurar os indicadores de uma posição social menos privilegiada.
Segundo
Queila Ferraz Monteiro, professora dos cursos de moda da Faculdade Belas Artes,
do Senac e da Universidade Anhembi Morumbi, aproximadamente 17.400 fábricas
operam no setor têxtil brasileiro, gerando 1,2 milhões de empregos diretos. A
participação é superior a 4% do PIB nacional. Para os próximos anos, a
expectativa é de expansão, com a continuidade do aumento da produção de peças
de vestuário.
A
indústria nacional apresenta-se bastante fragmentada: cerca de 70% das empresas
são de pequeno porte, tendo sua sobrevivência viabilizada por pela diversificação
da demanda, com uma variada gama de tribos consumidoras de vestuário e
agregados e o lançamento das coleções de moda rápida, que exigem flexibilidade
na estrutura produtiva.
A
abertura dos mercados e a mudança nos níveis de competitividade forçaram um
processo de reestruturação no setor, em curso até hoje. A indústria têxtil,
concentrada sobretudo nas regiões Sul e Sudeste, reformou seus parques
industriais, investiu em maquinário e tecnologia para competir com os
fornecedores de matéria-prima estrangeiros e atender aos estilistas
brasileiros. Ao mesmo tempo, as empresas grandes e bem posicionadas no mercado
passaram a concentrar suas atividades no marketing, no design e no
desenvolvimento de produtos, terceirizando a fabricação das peças. Grifes como
M.Officer, Zoomp e Forum, trabalham justamente na valorização das respectivas
marcas, ao passo que, na outra ponta, tem-se empresas como o Grupo Vicunha e a
Santista Têxtil, especializadas no fornecimento de calça jeans e outros
produtos para diversas grifes.
Esse
movimento de modernização também suscitou a necessidade de formar profissionais
para trabalhar no setor. Em 1995, após o primeiro Morumbi Fashion (atual São
Paulo Fashion Week - SPFW), observou-se a explosão das escolas de moda. Segundo
dados do Ministério da Educação, em 2003 existiam 35 cursos de graduação em
moda no país. Considerando os cursos técnicos, seqüenciais e especiais, o
número ultrapassava 60.
Em
paralelo à evolução do setor têxtil e da qualidade da matéria-prima nacional a
moda brasileira iniciou um processo de internacionalização. Um dos impulsos foi
justamente a consolidação do SPFW, que trouxe a mídia estrangeira para o Brasil
e estabeleceu um calendário nacional de moda, dando uniformidade a iniciativas
antes isoladas. A repercussão mundial de super-modelos brasileiras que, como
Gisele Bündchen, tiveram como berço o SPFW, também atraiu o olhar estrangeiro
sobre o país. A moda passou a ser valorizada como negócio, contribuindo para a
projeção externa – e claro, interna – dos estilistas nacionais.
Atualmente,
as coleções de estilistas brasileiros já fazem parte dos mais importantes
desfiles internacionais, como a Semana da Moda de Nova York, e ocupam espaço em
cobiçadas lojas de grife do mundo. Além dos ateliês de roupas exclusivas,
existem peças vendidas em grandes redes de varejo e mesmo em lojas menores.
Estima-se que o Brasil tenha clientes em mais de 150 países.
Moda
praia, roupas esportivas, lingeries e jeans são os segmentos que mais encontram
receptividade fora do Brasil, sobretudo em função do design mais justo e da
criatividade. Os acessórios seguem os passos do vestuário e ganham o mercado
internacional. Jóias, sapatos e bolsas “made in Brazil” são vendidos na Europa,
Estados Unidos e países árabes, sendo o sucesso atribuído às cores e à mistura
de materiais, como madeiras nacionais com brilhantes e rubis.
Mas a
moda brasileira também encontra muitas barreiras no exterior. Investimentos
limitados, alto custo e excesso de burocracia, além da forte concorrência e da
vaidade inerente ao mercado, são alguns entraves.
Segundo
informações da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecções
(ABIT), o setor vem registrando superávits na balança comercial desde 2001. Nos
cinco primeiros meses de 2006, contudo, o saldo positivo caiu 91% frente ao
mesmo período do ano anterior. A desvalorização cambial é a principal
responsável e, se a tendência persistir, pode resultar num balanço negativo em
2006. Para não perder competitividade e manter o bom relacionamento com clientes
antigos, evitando a quebra de contratos e a perda de credibilidade, muitas
empresas do ramo adotaram como estratégia a redução das margens e o achatamento
dos preços. Outras que optaram por não reduzir a margem de lucro reajustaram os
preços, dando seqüência à internacionalização da marca através da busca por
novos clientes.
O
segmento de produtos para beleza também está presente no exterior, embora os
investimentos mais efetivos em exportação sejam recentes. Num projeto
ambicioso, a Natura, por exemplo, inaugurou no ano passado sua primeira loja
mundial, localizada em Paris – a meca dos cosméticos e perfumes. A empresa já
atua no sistema porta-a-porta em países como Argentina, Chile, Peru, Bolívia e
México. O Boticário, por sua vez, possui mais de 60 lojas espalhadas pelo
mundo.
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