No Brasil, foram realizadas 88 mil cirurgias de redução de estômago em 2014, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM). O procedimento vem sendo amplamente utilizado e é considerado eficaz contra a obesidade grave – também denominada mórbida ou extrema. Porém, é preocupante o número de pacientes que abandonam o acompanhamento nutricional depois da cirurgia bariátrica, colocando em risco os resultados do tratamento.
Interessados em entender esse problema, os pesquisadores Veruska Magalhães Scabim, Jose Eluf-Neto e Beatriz Helena Tess investigaram a taxa de adesão de um grupo de pacientes ao acompanhamento nutricional após a cirurgia.
Eles analisaram registros de 241 pacientes do SUS operados no Hospital das Clínicas, em São Paulo, entre 2006 e 2008. São indivíduos que passaram pela cirurgia do tipo mais comum no Brasil, o bypass gástrico. O procedimento reduz a capacidade gástrica a 50 ml, aproximadamente, e liga o estômago diretamente ao jejuno, desviando o trânsito alimentar da primeira porção do intestino.
Durante o primeiro ano após a cirurgia, 56% dos pacientes do grupo aderiram ao seguimento nutricional, indo a quatro ou mais consultas, um resultado considerado baixo, conforme analisam os autores em artigo publicado em 2012 na Revista de Nutrição. Essa adesão, idealmente, deveria ser de 75% das consultas, no mínimo, conforme o protocolo que prevê seis consultas no primeiro ano após a cirurgia.
Na segunda etapa da pesquisa, publicada recentemente,na Revista da Associação Médica Brasileira, Tess, Scabim, juntamente com os pesquisadores Marco Aurélio Santo e Júlio César Pereira, também observaram que até 18 meses da cirurgia, tanto os pacientes acompanhados quanto os que faltavam às consultas perdiam em torno de 40% do peso. Essa perda, independentemente do acompanhamento nutricional, pode ser um dos motivos para o abandono das consultas observado no primeiro estudo, e no longo prazo os faltosos podem colocar em risco os resultados do tratamento, segundo alerta Beatriz Tess.
“Até os 18 meses, o paciente está no que é conhecido como fase de ‘lua de mel’, ou seja, ele perderá peso porque a cirurgia leva a alterações anatômicas e fisiológicas que independem do seguimento nutricional. A maioria dos operados perde muito peso porque ingere menor quantidade de alimentos, absorve menos gordura, ou seja, tem o efeito direto da cirurgia, entre outros fatores”, explica Tess.
Na prática, porém, o resultado real da cirurgia de redução de estômago só poderá ser observado em médio-longo prazo. A pesquisadora explica que, apesar de ser considerada segura, a cirurgia não é isenta de riscos. É um procedimento de médio a grande porte, altera a anatomia e o metabolismo, com risco de complicações no longo prazo, como carências nutricionais e osteoporose. Os pacientes devem retornar às consultas com equipes multidisciplinares para monitorar o peso, deficiências nutricionais e, portanto, obterem chances de melhores resultados do tratamento.
“Muitos, depois que operam, melhoram de doenças associadas, como diabetes e hipertensão arterial. Portanto, o ganho de peso novamente pode ser deletério para o organismo, é voltar a uma situação não só clínica, mas psicológica, muito ruim, que inclui preconceito, dificuldade de conseguir emprego, complicações na vida afetiva e social”, diz Tess.
O estudo também considerou variáveis que poderiam estar associadas a uma maior adesão ao seguimento nutricional, verificando relação estatística apenas com a duração da internação depois da cirurgia. Esses foram os casos de pacientes que estiveram seis ou mais dias internados devido a complicações da cirurgia. O maior contato com a equipe, a maior percepção da gravidade da doença e a preocupação com a saúde podem ser os motivos para a maior assiduidade ao seguimento depois da alta hospitalar, avaliam os autores.
Após a segunda parte da pesquisa, os cientistas ressaltam que são necessários mais estudos para esclarecer a relação entre a perda de peso e a aderência a programas complementares à cirurgia. Porém, deve-se continuar reforçando o contato com a equipe e a percepção do paciente sobre a gravidade do problema. “O seguimento é importante para o resto da vida, porque o paciente precisa mudar seus hábitos, e a alimentação faz parte disso”, acrescenta Scabim.
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