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Artigo
Pesquisa em educação e imagens, novas tecnologias e a busca pela interlocução
Por Carlos Eduardo Albuquerque Miranda
10/08/2009

O estudo da articulação entre educação, produção de imagens e tecnologias de informação e comunicação visa encontrar uma forma de abordagem da relação entre educação e tecnologia que extrapole a visão tecnicista e pragmática de aplicação de recursos tecnológicos, mas que, ao mesmo tempo, tenha um caráter propositivo em relação ao trabalho com as novas tecnologias na educação.

Para isso, vamos apontar algumas especificidades dos desafios da pesquisa educacional em relação ao desenvolvimento das tecnologias, recuperando um pouco as tendências que marcam o diálogo entre educação e tecnologia e propondo uma concepção de tecnologia que interesse àqueles que se preocupam com a construção de significados e com processos de significação nas relações educativas.

Por fim, pretendemos exemplificar a complexidade das formas de acesso e de uso das imagens no atual processo de comunicação e circulação de informações em rede e propor a importância dos sujeitos, professores e alunos, se colocarem como interlocutores no trabalho educacional.

Tecnologia e pesquisa educacional

O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação, assim como o desenvolvimento tecnológico dos últimos trinta ou quarenta anos, em todos os setores de atividades, gerou, inegavelmente, profundas transformações econômicas e culturais na sociedade contemporânea. A relação entre desenvolvimento tecnológico e transformações sociais, no entanto, é uma relação complexa. Embora possamos imaginar que exista um padrão ou uma tendência geral dessas transformações, cada atividade humana sofreu transformações singulares de acordo com suas próprias especificidades históricas e sociais. Além disso, o impacto que uma prática social sofre com o desenvolvimento tecnológico não é uniforme e universal. Diversos fatores interagem para que ocorram desigualdades e diferenciações nas formas como esse desenvolvimento atinge uma prática social.

Nos últimos dois séculos nos acostumamos a pensar que os avanços econômicos, políticos e culturais de uma sociedade estão articulados dialeticamente com seu desenvolvimento tecnológico. Isso seria verdadeiro tanto em âmbito regional quanto nacional ou supranacional. A experiência empírica nos permite afirmar que essa proposição não está totalmente errada, muito embora, às vezes, se omita outras determinações nesses processos de desenvolvimento e se desconsidere que suas consequências nem sempre são satisfatórias para a maioria dos indivíduos em uma determinada sociedade. Igualdade social, construção da cidadania e desenvolvimento humano não são produtos diretos do elevado nível tecnológico de uma sociedade. Esse é mais um mito da modernidade do que uma realidade histórica.

No entanto, não podemos desconsiderar as transformações nas formas de perceber, pensar e estar no mundo que as tecnologias de informação e comunicação propiciaram aos indivíduos e grupos sociais. Nesse sentido, diversas áreas do conhecimento estão preocupadas em entender em que consistem, de fato, essas transformações e qual é a melhor forma de abordar suas múltiplas causas, que são interdependentes, e seus efeitos, muitas vezes imprevisíveis.

A educação é uma das áreas de conhecimento que tem procurado fazer esse esforço no sentido de encontrar ferramentas conceituais que deem conta de esboçar formas de compreensão dessas transformações. Enquanto campo de pesquisa, no entanto, a educação, dada a sua especificidade, encontra um complicador a mais em relação a essa tarefa. A sociedade e, em geral, a própria comunidade acadêmica, espera dos pesquisadores da educação respostas de caráter prático e, às vezes, até pragmático. A dupla tarefa que se coloca sobre a pesquisa em educação em relação às tecnologias é, por um lado, dar respostas às questões que emergem com o desenvolvimento tecnológico e, por outro, dar soluções aos problemas que esse desenvolvimento provoca na prática educacional. Essa dupla tarefa não é, e nem poderia ser, apenas de um pesquisador ou de um grupo de pesquisadores. Essa tarefa exige articulação entre a pesquisa e a prática educacional em todos os níveis, aliás, como quase todos os questões e problemas da educação.

A conversa da educação com a tecnologia não é nova, ou seja, não é uma conversa da sociedade contemporânea ou “sociedade da informação” ou “sociedade do conhecimento”1. Essa conversa tem uma história e essa história não é tão recente como imaginam as novas gerações. No século XVII, Comenius desfrutou das tecnologias que possibilitaram o surgimento do livro impresso e depois do livro ilustrado para construir o que, para muitos, foi o primeiro livro didático do Ocidente2. Porém, não pretendemos ir tão longe, pois esse seria um percurso muito longo para as finalidades deste texto. Vamos nos limitar aos últimos quarenta anos em nosso país.

No Brasil, por exemplo, conforme Favaretto (2004), a possibilidade técnica da presença do cinema nas práticas educativas, a partir da década de 1970, deu um novo impulso à conversa entre educação e tecnologia, pelo menos no âmbito acadêmico. Com a massificação da televisão e da escola, o termo mídia emergiu como um conceito central dessa conversa a partir da década e 1980. Há uma bibliografia considerável que se construiu nesses últimos quarenta anos e que alimenta essa relação entre educação e tecnologia. Essa produção aborda cinema, televisão, vídeo e, mais recentemente, informática e a internet. Durante todo esse período a conversa entre educação e tecnologia implicou estudos sobre teorias da informação e teorias da comunicação3.

Mesmo que seja temerário, propomos uma síntese da produção acadêmica dos últimos quarenta anos de conversa entre educação e tecnologias de informação e comunicação. Correndo o risco de nos tornarmos simplistas e cientes das lacunas dessa síntese, podemos identificar que duas tendências de abordagem foram construídas nesse período. Arriscamos-nos a enunciá-los para marcar uma distinção que, a nosso ver, é estratégica em relação aos desafios da educação em dar respostas e encontrar soluções, conforme afirmamos acima.

Uma primeira tendência propõe que a educação deve estar em sintonia com a sociedade tecnológica e a cultura industrial e, para isso, enfatiza metodologias de trabalho com as novas tecnologias de informação, comunicação e interação em geral – incluindo audiovisuais, cinema, fotografia etc. As tecnologias aparecem como instrumentos a serem utilizados pelo professor e pela escola e a preocupação central é a elaboração de propostas didático-metodológicas de utilização dos seus produtos e processos, tendo ou não sido produzidos para fins educacionais ou didáticos.

A segunda tendência parte de uma diversidade de experiências e abordagens teóricas, não tão pragmáticas, mas que abordam as tecnologias de informação e comunicação como um tema de pesquisa em educação. Geralmente consideram-se os próprios produtos e processos dessas tecnologias como instâncias educativas (cinema, computador, internet) e busca-se aprofundar reflexões sobre as relações entre educação e cultura, e entre escola e cultura. A ênfase são as formas de conhecimento e de inteligibilidade que as pessoas imersas em um mundo midiático produzem sobre si mesmas, sobre o mundo e a realidade.

Essas duas tendências não são, necessariamente, contrárias entre si, porém também não são complementares. Observamos que há movimentos de aproximação e distanciamentos no que tange à preocupação central de cada uma delas.

Poderíamos dizer que a primeira está mais preocupada em encontrar soluções para os problemas da educação gerados pelo desenvolvimento das tecnologias e, por isso, busca formas de incorporá-las à prática educacional e, mais particularmente, à prática escolar. Há certa crença de que as tecnologias vão transformar a educação, ou seja, há uma perspectiva modernizadora da escola.

Quanto à segunda tendência, as pesquisas estão mais voltadas a responder às questões que sa transformações advindas do desenvolvimento tecnológico provocaram. A educação não é circunscrita à prática escolar, e as reflexões dialogam com a cultura e com os processos de significação sociais, para depois pensar na prática escolar e na ação educativa.

Colocamo-nos a tarefa de tentar pensar com a preocupação central das duas tendências. Não porque julgamos necessária a construção de um consenso, mas porque, conforme dissemos acima, o campo da educação está sempre sendo pressionado tanto para responder questões quanto para encontrar soluções para os problemas da educação.

Mudança de foco – a especificidade da pesquisa em educação

Em primeiro lugar, é preciso alertar que refletir sobre os impactos do desenvolvimento de tecnologias de informação e comunicação de forma genérica é um tanto quanto perigoso, quando queremos abordar processos de significação, de construção de conhecimento, de saberes, de identidade, ou seja, quando olhamos para processos muitos singulares do ser humano, do seu comportamento e de suas atividades mentais. Para pesquisadores e profissionais que lidam com essas dimensões humanas, o foco deve ser o acesso e o uso que os indivíduos e os grupos sociais fazem das tecnologias.

Assim sendo, quando falamos em aumento de interatividade e de formas de comunicação mais horizontais, como resultado do desenvolvimento tecnológico, queremos nos referir na verdade a um aumento do acesso aos meios de produção e circulação de informações e a um determinado uso que os sujeitos fazem desses meios. No entanto, o acesso a essas tecnologias é desigual e diferenciado, tanto por questões sociais e econômicas quanto por questões culturais e até mesmo por questões ideológicas e religiosas. O uso que os sujeitos fazem das tecnologias de informação e comunicação também é desigual e diferenciado, também por questões sociais, ideológicas, econômicas e culturais.

Para o campo da educação não interessa pensar apenas na potencialidade de determinados artefatos ou processos tecnológicos. As formas de acesso e uso é que são, de fato, geradoras de questões e problemas. Nesse sentido, o enfoque que Ihde (1993) dá para a caracterização da tecnologia pode ser uma ferramenta conceitual interessante para os estudos em educação e tecnologia. Não estamos defendendo a fenomenologia hermenêutica de Heidegger, da qual Ihde é tributário, embora possamos admitir que suas concepções de tecnologia sejam instigantes provocações para a educação e para as ciências humanas em geral. Para Heidegger, o sentido do mundo técnico se oculta à medida que vem ao nosso encontro e a tecnologia nos domina quando reduzimos a nossa forma de pensar ao cálculo. Interpretando Heidegger, Rafael (2007, p.6) afirma que quando o homem só tem o pensamento que calcula, é porque ele já se encontra dominado pela tecnologia e, por isso, ele fica cada dia mais pobre de pensamento, já não medita sobre si mesmo e nem sobre o mundo que está a sua volta.

Sob a inspiração de Heidegger, Ihde (1993) afirma que a caracterização da tecnologia se dá por três aspectos: primeiro, uma tecnologia deve ter um componente tangível, palpável, um elemento material ; segundo, o elemento material, condição de base, deve fazer parte de algum conjunto de ações humanas culturalmente determinadas e; terceiro, deve haver uma relação entre os objetos materiais e as pessoas que os usam, idealizam ou concebem, constroem, modificam ou manipulam esses objetos.

Nessa caracterização, a primeira condição, o elemento material, o artefato tecnológico é insuficiente para caracterizar de modo definitivo uma tecnologia, pois o usuário, diferentemente do idealizador ou criador do objeto, pode percebê-lo e usá-lo de modo totalmente diferentes do propósito original. O artefato em si, fora de um contexto, pode ser ambíguo, e tornar-se algo diferente da finalidade para a qual tenha sido desenhado e construído, dependendo assim de quem o apreende e de como seja usado. Da mesma forma o elemento material num determinado contexto, ou seja, fazendo parte de um conjunto de ações humanas culturalmente determinadas também não define uma tecnologia, pois sua definição ainda dependerá das relações entre os artefatos tecnológicos e as pessoas, nesse contexto. O que isso quer dizer? Quer dizer que, primeiro, um artefato tecnológico de informação e comunicação, de fato, produz ou faz circular informação, ou informa, se e somente se, os sujeitos, em um determinado contexto cultural, têm a intenção de assim fazer e reconhecem que o fazem. Segundo, um artefato tecnológico de informação e comunicação, de fato, possibilita uma comunicação, ou comunica, quando os sujeitos que se relacionam com essas tecnologias estabelecem uma relação dialógica com alguém através destes aparatos. Isso significa tanto ter a intenção de diálogo, como reconhecer essa interação mediada como dialógica.

Olhar para os usos e acessos que os sujeitos fazem das tecnologias de informação e comunicação, imersos em realidades culturalmente localizadas, nos parece mais produtivo do que inferir virtualmente as potencialidades desses aparatos e processos. As questões a serem formuladas e respondidas e os problemas a serem detectados e solucionados, em termos da educação, são referentes a esses usos e acessos e não às potencialidades das tecnologias. As escolas e outras instâncias educativas não incorporam tecnologia quando adquirem equipamentos, incorporam tecnologias quando os equipamentos fazem parte de um conjunto de ações humanas nas quais os sujeitos, de fato, se relacionam com eles de forma que possam utilizá-los, idealizá-los ou concebê-los, construindo, modificando e manipulando esses objetos, descobrindo e imaginando formas de uso.

A complexidade da produção de significados e a interlocução

Para demonstrar a complexidade das formas de acesso e uso das imagens no atual processo de comunicação e circulação de informações em rede, tomaremos com exemplo a imagem o rosto de Che Guevara, uma das imagens mais reproduzidas no mundo. Ela pode ser vista estampada em camisetas, flâmulas e até em bandeiras de torcidas organizadas de times de futebol do mundo todo. Na rede internet, podemos encontrar milhares de versões dessa imagem, nas mais variadas composições gráficas, todas muito acessadas e manipuladas4. Além disso, muitas outras imagens semelhantes, que também mostram o rosto de Che Guevara, podem ser encontradas na rede. Trata-se de um rosto com alta visibilidade, comparável apenas a artistas de Hollywood e ou alguns jogadores de futebol.

A imagem mais famosa de Che Guevara, tanto no meio virtual quanto material (camisetas, flâmulas, buttons e bandeiras) é o desenho do seu rosto em alto contraste baseado na foto do cubano Alberto Korda5, feita pelo artista irlandês Jim Fitzpatrick e publicada em forma de pôster, em maio de 1968, e que logo se tornou um ícone contra a guerra do Vietnã. Entre os movimentos mais significativos que utilizaram essa imagem estão a F.A.R.C. na Colombia e os zapatistas do México. Segundo Amaral (2006, p.13), comparando a fotografia de Korda com o desenho de Fitzpatrick, o s olhos foram alterados pelo artista irlandês, que os desenhou olhando à distância, dando um significado heróico rosto. Para Amaral (2006 p.14) enquanto o original de Alberto Korda mostra um Che Guevara humano, frágil e com falhas, pois mostra um olhar preocupado, a alteração feira por Jim Fitzpatrick permitiu ao retrato tornar-se um símbolo, imagem ícone, ajustado para o uso em massa.

O documentário Personal Che, (2007) de Douglas Duarte (brasileiro) e Adriana Marino (colombiana), apresenta diversos depoimentos de pessoas reinterpretando o mito de Che Guevara. Esses depoimentos foram colhidos em várias partes do mundo: Cuba, Estados Unidos, Bolívia (onde Che Guevara morreu em 1967), Alemanha, Hong Kong e Líbano. Chama atenção dois depoimentos. Um é de Calixto Cárdenas, de Vallegrande (cidade da Bolívia para onde foi levado o corpo de Che Guevara depois de assassinado), diz ele: “Os santos estão categorizados aqui em Vallegrande: Santo Antônio para os apaixonados, São Silvestre para o fim de ano e a Virgem de Urkupiña te ajuda a conseguir uma casa. Mas São Che faz de tudo. Quando estudantes têm uma prova, rezam para ele para ir bem. Quando uma vaca se perde, ou adoece, seu dono reza a Che, para que seja encontrada ou curada. Che ajuda em tudo”. O outro depoimento é de Stefan Siebel da Alemanha. Vestindo uma camiseta que estampa a imagem heróica de Che Guevara, perfil preto em fundo vermelho, Siebel, neonazista do movimento autodenominado livre-nacionalismo, afirma: “Adolf Hitler é como Che Guevara. Ambos eram revolucionários que tentaram levar suas ideias a frente e ambos lutaram e morreram por isso”.

Tomo esse exemplo pelo paradoxo que ele nos apresenta. A imagem de Che Guevara, considerada como uma informação ou como um signo que contém informações articuladas em formas e cores aparentemente simples (o desenho de Fitzpatrick), é compartilhada por pessoas que constroem significações extremamente díspares. No entanto, são logicamente compreensíveis e somos até capazes de entendê-las, não estamos falando de simples opiniões pessoais, mas de movimentos sociais que se organizam em termos políticos e religiosos. O paradoxo é que parece que quanto mais uma mesma informação é, excessivamente, repetida, mais interpretações ela pode suscitar. Quem está errado no uso que faz da imagem? A resposta depende de quem responde, a interpretação correta depende do ponto de vista. Seria uma propriedade das imagens essa pluralidade de possibilidades de significação? Ou é uma propriedade dessa imagem, pela suas formas e cores ou pela personagem que apresenta ou representa?

Se não podemos responder a todas essas perguntas, ao retornarmos à questão da educação e da pesquisa em educação, deparamo-nos com uma situação extremamente complexa: a sensação de ubiquidade das pessoas e das coisas que o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação nos apresenta tende, ao mesmo tempo, para a possibilidade infinita de diálogo e para o fim deste. Afinal, o diálogo não é feito apenas de sons e estímulos. O diálogo necessita de ausência de significados em busca de respostas. Podemos inferir que compartilhar não é dialogar e o discurso do compartilhamento é insuficiente para o trabalho e a pesquisa em educação quanto se trata de novas tecnologias

Resta-nos esboçar uma proposição para o campo da educação. Como dissemos, no início e indicamos no título deste texto, julgamos que os sujeitos, professores e alunos, precisam se colocar como interlocutores no trabalho educacional diante da incorporação das tecnologias de informações e comunicação na educação e em outras práticas sociais.

Nesse sentido, afirmamos que já não se trata mais de pensar a educação como transmissão de informações e conhecimentos, e nem mesmo de propor ao professor o papel de mediador das informações e interpretações. Que condições um professor tem de mediar um nazista ou um religioso ao discutir Che Guevara? Sinceramente, nenhuma. A ideia de mediação também é insuficiente.

Um dos desafios da educação e da pesquisa no campo da educação (e esses desafios não se restringem aos educadores e pesquisadores da educação) é encontrar formas de construção de situações de interlocução, ou seja, de construir práticas em que os enunciadores e os enunciados estejam comprometidos com o logos e com o pathos em si mesmo e com o outro. A interlocução pressupõe a interrupção de um discurso por outro, sucessivamente. Os problemas da educação já não são mais os métodos, mas sim a posição (o local) que os sujeitos estão e ocupam nos processos da significação, diante das condições que as tecnologias de informação e comunicação criaram para esses processos. As questões da educação já não são universais, pois dependem do local, dos sujeitos e das ações desses para construir significados. A educação, mais do que nunca, precisa ser o espaço e tempo da interlocução, seja ela presencial ou mediada por tecnologias. Mas esse é apenas o começo uma conversa.

Carlos Eduardo Albuquerque Miranda é professor assistente doutor do Departamento de Educação, Conhecimento, Linguagem e Arte da Faculdade de Educação da Unicamp, pesquisador do Laboratório de Estudos Audiovisuais - Olho. Mestre e doutor em educação pela Unicamp.

Notas

1 Segundo Werthein (2000): A expressão “sociedade da informação” passou a ser utilizada, nos últimos anos do século XX, como substituto para o conceito complexo de “sociedade pós-industrial” e como forma de transmitir o conteúdo específico do “novo paradigma técnico-econômico”. A realidade que os conceitos das ciências sociais procuram expressar refere-se às transformações técnicas, organizacionais e administrativas que têm como “fator-chave” não mais os insumos baratos de energia – como na sociedade industrial – mas os insumos baratos de informação propiciados pelos avanços tecnológicos na microeletrônica e telecomunicações (Werthein, 2000, p.71).

2 Sobre a história desse livro ver Farne (2005).

3 Para um estudo do estado da arte desse tema ver Miranda (1996)

4 Pode-se utilizar tanto o Bing da Microsoft quanto o Google. O número de imagens na opção rosto é impressionante: 19.200 resultados no Bing e 43.200 resultados no Google – acesso realizado no dia 29/07/2009.

5 Segundo o Maryland Institute College of Art essa é a fotografia mais famosa do mundo e um símbolo do século XX. Fonte: BBC Homepage – link: http://news.bbc.co.uk. Na exposição “Che Guevara – Revolutionary & Icon” do The V&A Museum (de junho a agosto de 2006), somos informados que é a imagem mais reproduzida da história da fotografia. Fonte: http://www.vam.ac.uk/

Referências Bibliográficas

AMARAL, Tatiana. Educação e as imagens dos mitos políticos: mitificação e desmistificação de Ernesto “Che” Guevara. In: XIV Congresso Interno de Iniciação Científica da Unicamp 2006. Campinas-SP: PRP-PIBIC: CNPq: CD_ROM, 2006.

DUSEK, Val; SCHARFF, R.C. Philosophy of technology: the technological condition; an anthology. Malden, Mass. u.a.: Blackwell, 2003.

FARNÉ, Roberto. Iconologia didattica. Bologna: Zanichelli Editore, 2005.

IDHE, D. Philosophy of technology: an introduction. New York: Paragon, 1993.

MIRANDA, C.E.A. O que estamos vendo?: um estudo sobre imagem e educação na era da reprodutividade técnica. 1996. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Unicamp, Campinas, 1996. Disponível em: http://libdigi.unicamp.br

RAFAEL, M.A. A questão da tecnologia no pensamento de Martin Heidegger ou uma possível leitura da conferência “serenidade” (1959). In Existência e Arte - Revista Eletrônica do Grupo PET - Ciências Humanas, Estética e Artes da Universidade Federal de São João Del-Rei - Ano III - Número III – janeiro a dezembro de 2007. Diponível: http://www.ufsj.edu.br

WERTHEIN, Jorge. A sociedade da informação e seus desafios. Ci. Inf. online. 2000, vol.29, n.2, pp. 71-77. ISSN 0100-1965. doi: 10.1590/S0100-19652000000200009.

Filmografia

Personal Che (2007). Direção: Douglas Duarte e Adriana Marino. Produção: Douglas Duarte, Adriana Marino. Roteiro: Douglas Duarte, Adriana Marino. Estúdio: Flashstar. Distribuidora: Skyview Media. Colômbia/ EUA/ Brasil, 2007, 86 min.