Quando Pedro Álvares Cabral aqui chegou com suas
três caravelas e dez naus tripuladas por 1.500 homens, o Brasil ocupava uma
área de cerca de 2.650.000 km2 ao sul da linha do Equador, na parte leste
da América do Sul. Hoje o território brasileiro se estende por 8.514.876 km2,
que fazem do Brasil o 5º maior país do mundo. E, se prevalecer um pedido
recente feito à Organização das Nações Unidas (ONU), poderão ser acrescentados mais
uns 4.500.000 km2 de mar territorial, a chamada Amazônia Azul.
Essa espetacular expansão envolveu astúcia, mortes, ouro, dinheiro e muita
negociação. E poderá, ao cabo desses pouco mais de 500 anos, tornar o Brasil
quase cinco vezes maior do que era quando se firmou o Tratado de Tordesilhas em
7 de junho de 1494.
O Tratado de Tordesilhas resultou de intensas
negociações entre Portugal e Espanha, as duas potências marítimas que, desde o
século XV, expandiam suas terras a pretexto de defender o cristianismo mundo
afora. Por meio dele, foi estabelecida a
divisão das áreas de influência dos países ibéricos, cabendo a Portugal as
terras descobertas e por descobrir situadas antes da linha imaginária que demarcava
370 léguas marítimas a oeste das Ilhas
de Cabo Verde, que pertenciam aos portugueses. À Espanha caberiam as terras que
ficassem além dessa linha.
Conforme assinala a geógrafa Vânia Vlach, em sua tese
de doutorado defendida em 1997 na Universidade de Paris VIII, o Tratado de
Tordesilhas trouxe muitos problemas. Primeiro, os instrumentos da época não
permitiam determinar com precisão as 370 léguas marítimas. Outro problema era
que não se sabia qual ilha do Arquipélago de Cabo Verde serviria de referência
para se contar as 370 léguas marinhas; isto é, não se conseguia definir o
meridiano adequado. Assim, o Tratado de Tordesilhas, ratificado em 26 de
janeiro de 1506 pelo papa Julio II, por meio da Bula Ea Quae Pro Bono Pacis,
teve apenas efeito moral. De todo modo, destaca Vania Vlach, o meridiano de
Tordesilhas legitimou a presença portuguesa na América.
Em busca do ouro
A chegada de Cabral à costa brasileira em 21 de
abril de 1500 não foi obra do acaso. Tendo saído de Lisboa em 9 de março
daquele ano, o jovem capitão Cabral, depois de passar pelas Ilhas de Cabo
Verde, desviou sua esquadra para a direita rumo à porção de terra que se supunha
existir a leste da Ilha de Cabo Verde, mas ainda não ocupada pelos portugueses.
E o fez sob as ordens de D. Manuel I, rei de Portugal de 1495 a 1521, que,
endividado, tinha motivos fortes para enviar Cabral às terras portuguesas,
antes de seguir para as Índias.
Com efeito, quando assumiu a coroa portuguesa, D.
Manuel I herdou também uma dívida muito grande, que crescia há mais de 100 anos.
Portanto, Cabral estava atrás de ouro, adotado como moeda desde o século IV a.C.
Mas o que o navegador português levou do Brasil de presente ao rei foram
araras, papagaios, arcos, flechas, penas e plantas tropicais, inúteis para
amenizar as dívidas reais. O rei português preferiu o comércio com as Índias,
de onde vinham grandes quantidades de especiarias, porcelana, diamantes e
rubis.
Do Brasil, a Coroa Portuguesa explorou principalmente
o pau-brasil. Entretanto, o Brasil, entre 1500 e 1530, dava muitos prejuízos a
Portugal. No livro A história econômica
do Brasil, publicado em 1938, Roberto Simonsen afirma que a retirada de
centenas de toneladas de pau-brasil representava menos de 5% do que era arrecadado
pelos cofres portugueses. E ainda era necessário gastar para proteger as terras
brasileiras, frequentadas regularmente por invasores. A solução foi adotar no Brasil o que vinha sendo
feito nas Ilhas da Madeira e Cabo Verde: doar terras para colonização.
Nascia a primeira divisão de terras no Brasil. Em
1534, D. João III, sucessor de D. Manuel I, dividiu o território em 14
capitanias hereditárias, correspondentes a 15 lotes e distribuídas a 12
donatários. Do norte para o sul tinha-se: Primeira Capitania do Maranhão,
Segunda Capitania do Maranhão, Ceará, Rio Grande, Itamaracá, Pernambuco (ou
Nova Lusitânia), Bahia de Todos os Santos, Ilhéus, Porto Seguro, Espírito
Santo, São Tomé, Rio de Janeiro, Santo Amaro, São Vicente e Santana. Todas
tinham por limite leste o mar e limite oeste a linha imaginária (e um tanto
incerta) do Tratado de Tordesilhas.
Como a nobreza lusitana não se interessou por essas
doações, as capitanias brasileiras foram concedidas a membros da burocracia
estatal, a militares e a navegadores, que tinham poderes absolutos para
legislar e controlar tudo em suas terras, menos arrecadar os impostos reais. A
divisão dos lotes foi feita com base em acidentes geográficos (em geral rios,
baías e ilhas) e não respeitou a divisão territorial das tribos indígenas. Esse
arranjo revelou-se problemático: dos 12 donatários, quatro nunca estiveram no
Brasil; dos oito que vieram, apenas Duarte Coelho fez uma boa administração em
Pernambuco; dos 15 lotes, Rio de Janeiro, Ceará, Ilhéus e Santana não foram
ocupados; apenas em Pernambuco e em São Vicente a colonização foi bem sucedida; e
foram muitos os conflitos com a população indígena. Ainda assim, as capitanias
hereditárias representam a primeira incursão de portugueses nos trópicos e marcou
a estrutura fundiária e agrária do Brasil.
Com o objetivo de centralizar a administração e
melhor informar à Coroa Portuguesa sobre as descobertas feitas na colônia, D.
João III instituiu, em 1549, um governo geral, com sede na Capitania da Bahia
de Todos os Santos, adquirida pelo rei, mediante indenização. Foram três os governadores gerais: Tomé de
Souza (1549 a 1553), Duarte da Costa (1553 a 1557) e Mem de Sá (1557 a 1572).
Após a morte deste último, o novo rei, Dom Sebastião, dividiu o Brasil em governo
do norte, com capital em Salvador, que administrava a região da Capitania da
Baía de Todos os Santos até a Capitania do Maranhão; e em governo do sul, com
sede no Rio de Janeiro, responsável pelos territórios da Capitania de Ilhéus
até a Capitania de Santana.
Mas ainda era necessário encontrar o ouro do Novo
Mundo, até porque a Espanha estava cada vez mais rica com os sucessivos ganhos
nas suas colônias a leste do meridiano de Tordesilhas. Pero de Magalhães de
Gândavo, historiador e cronista português do século XVI, é o autor da primeira
história do Brasil publicada em língua portuguesa. Em sua História da
província de Santa Cruz, de 1576, ele afirma: “Esta província de Santa Cruz, além de ser tão fértil como digo, e
abastada de todos os mantimentos necessários para a vida do homem, é certo ser
também muito rica, e haver nela muito ouro e pedraria, de que se têm grandes
esperanças.”
Com efeito, em 1561, algumas minas foram
encontradas na Serra do Jaraguá, em São Paulo de Piratininga. Mas eram pouco promissoras
em face das enormes dívidas de Portugal. Assim, e sempre na busca do valioso
minério, os portugueses expandiram seu território para sudeste e para oeste, conquistando
ou fundando novas aldeias e fortalezas.
Ouro em quantidade significativa só foi descoberto
em 1693, na região mais tarde chamada de Minas Gerais. O metal passou a ser
visto por toda parte, nas margens e em leitos de rios, em morros e até no chão.
Milhares de portugueses venderam tudo que possuíam, despovoando vilas
principalmente do norte de Portugal. Muitos dos que viviam de cultivos próximos
à costa brasileira também migraram para o interior. Tamanha movimentação atiçou
estrangeiros. Multiplicaram-se as invasões e as disputas de territórios. Muitos
morreram em busca de ouro.
O gigante envolvido em conflitos se divide
De 1500 até os dias de hoje, o Brasil cresceu e se
dividiu em províncias e depois em estados. Também não foram poucos os conflitos
e as disputas de terras. Destacam-se:
- Guerra dos Emboabas: de 1707 a
1709, opôs paulistas, descobridores de minas de ouro nas Minas Gerais, e
forasteiros portugueses, os emboabas, que se apoderaram de algumas das melhores
minas, pela força do dinheiro ou de armas; terminou com a derrota dos
paulistas.
- Guerra da Cisplatina: de 1825 a
1828, entre o Império do Brasil e as Províncias Unidas do Rio da Prata, pela
posse da Província Cisplatina, atual República Oriental do Uruguai. Foi o
primeiro de quatro conflitos armados internacionais pela supremacia do Brasil
na América do Sul. O segundo foi a Guerra do Rio da Prata, de agosto de 1851 a
fevereiro de 1852; o terceiro foi a Questão Uruguaia, em 1864; e o último, a
Guerra do Paraguai, também chamada Guerra da Tríplice Aliança, de dezembro de
1864 a março de 1870.
- Cabanagem: provavelmente a mais
sangrenta revolta social já ocorrida no Brasil, se estendeu de 1835 a 1840, em
Belém; os revoltosos lutavam contra a nomeação dos presidentes das províncias e
principalmente contra as péssimas condições de vida de grande parte da
população da província do Pará.
- Guerra dos Farrapos: estendeu-se de
20 de setembro de 1835 a 1° de março de 1845; de caráter republicano, resultou
na declaração de independência da província de São Pedro do Rio Grande do Sul
como estado republicano, dando origem à República Rio-Grandense.
- Sabinada: ocorrida em Salvador
entre novembro de 1837 e março de 1838, foi um levante da classe média baiana
contra o poder central e a supremacia dos senhores de engenho.
- Balaiada: insurreição que se
espalhou pelo Maranhão, de 1838 a 1841, foi marcada por saques principalmente
nas cidades de São Luís e Caxias.
- Revolta Praieira: iniciada em
Recife e Olinda, em 1848, espalhou-se, até 1850, por todo Pernambuco; de
caráter liberal, os rebeldes reivindicavam a instalação de uma Constituinte
para redigir uma nova Constituição e a nacionalização do comércio, entre outras
medidas;
- Revolução de 1932 ou Guerra Paulista:
movimento armado ocorrido no estado de São Paulo, entre 9 de julho e 4 de
outubro de 1932, que tinha por objetivo derrubar o governo provisório de
Getúlio Vargas.
Alguns territórios brasileiros foram conquistados,
outros foram comprados ou cedidos. Nomes como Alexandre de Gusmão, considerado
o avô dos diplomatas brasileiros, José Maria da Silva Paranhos Júnior, o Barão do
Rio Branco, e Ruy Barbosa contribuíram para a consolidação das nossas
fronteiras.
Graças à ação diplomática de Alexandre de Gusmão, os
atuais estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso,
bem como a imensa zona compreendida entre o Alto-Paraguai, o rio Guaporé, o rio
Madeira, o rio Tapajós e o rio Tocantins, regiões na época desabitadas, foram
cedidos a Portugal pela Espanha, por meio do Tratado de Madrid, assinado em 13
de janeiro de 1750. Em troca, Portugal cedeu à Espanha a Colônia do Sacramento
e abriu mão de suas pretensões no estuário do Rio da Prata. Como consequência,
também houve a revogação do Tratado de Tordesilhas, a consagração do princípio
do uti possidetis (quem tem a posse tem o domínio), a posse para
Portugal de grande parte da atual área da Amazônia brasileira e a definição do rio Uruguai como
fronteira oeste do Brasil com a Argentina.
Em 1900, e com a participação do Barão do Rio
Branco, a Comissão de Arbitragem em Genebra, na Suíça, concedeu a posse de
terras que estavam sendo disputadas com a França. Essas terras foram
incorporadas ao estado do Pará com o nome de Araguari e, por razões estratégicas
e de desenvolvimento econômico, foram desmembradas em 13 de setembro de 1943,
constituindo o território federal do Amapá.
Três anos depois, por meio do Tratado de Petrópolis, de 17 de novembro de 1903,
e do Barão do Rio Branco, o Brasil adquiriu da Bolívia, por 2 milhões de libras
esterlinas, terras do atual estado do Acre,
fazendo também pequenas concessões de terras no estado do Mato Grosso e comprometendo-se
a construir uma ferrovia ligando os dois países, a Madeira-Mamoré.
As áreas dos atuais estados de Roraima, Rondônia e Paraná também foram objeto de disputas, nem sempre favoráveis ao Brasil. Em 1904, por
exemplo, houve uma disputa territorial com a Inglaterra e, por meio da arbitragem
do rei italiano Vítor Manuel II, o Brasil perdeu a maior parte das terras da
região do Pirara, pequeno afluente do rio Maú, em Roraima, incorporadas à
Guiana Inglesa. Com a promulgação da Constituição brasileira de 1988, o Acre, o
Amapá, Rondônia e Roraima foram elevados à categoria de estado.
Por razões políticas e econômicas, ocorreram também
divisões dos estados do Mato Grosso e de Goiás, criando-se o Mato Grosso do Sul e o Tocantins (veja box abaixo). Um trabalho realizado pelo
Núcleo de Estudos sobre Cooperação e Conflitos Internacionais, da Universidade
Federal de Ouro Preto (UFOP), ilustra essas sucessivas
mudanças. Ainda que dividido em 26 estados e um distrito federal, podendo
chegar a um desmembramento mais expressivo, dependendo dos projetos que
tramitam no Congresso, cinco séculos depois, o Brasil é bem maior do que quando
Cabral aqui chegou.
Um exemplo de divisão para crescer "A criação do estado do Tocantins concretizou um projeto de autonomia que expressava as necessidades de desenvolvimento econômico e de organização político-administrativas de seu território, representando as falas de gerações que, desde o século XIX, lutavam para ter um território desmembrado de Goiás”, afirma Eliseu Pereira de Brito, professor da Universidade Federal do Tocantins. Com efeito, em 1821, a Comarca do Norte, criada em 1809, proclamou a sua autonomia político-administrativa, instaurando um governo independente da Comarca do Sul e que durou até 1824. Segundo Brito, a forma do pagamento dos tributos, para evitar o contrabando do ouro, foi a causa dessa iniciativa, pois onerava o norte em detrimento do sul de Goiás. Esse processo desencadeou uma crise que já durava mais de 50 anos. Eliseu de Brito afirma que o ouro foi uma fonte de atraso do norte de Goiás, porque no auge de sua mineração, a navegação foi interrompida e isolou a região. “Quem iniciou o movimento de luta pró Tocantins foram os curraleiros e não os mineradores do ouro”, conta. A região era isolada e mergulhada em crise. Por isso, um crescimento ainda que pequeno é representativo para o estado. Segundo ele, a divisão também beneficiou Goiás, pois as dívidas internas e externas do estado foram assumidas pela União, que, sem a região pobre, teve sua renda per capita aumentada. “Para o Tocantins, com os investimentos federais, houve um aumento significativo da sua renda per capita”, explica. Cabe destacar que desde 1953, o norte goiano faz parte da Amazônia Legal. Usufrui de recursos do Banco da Amazônia (Basa) e é alvo de programas específicos de desenvolvimento, sob coordenação da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Assim, mesmo com a divisão de Goiás, o estado do Tocantins continuou pertencendo à Amazônia Legal e não compromete a repartição do Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste (FCO), que é dividido entre o Distrito Federal e os estados de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. |
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