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Resenhas
Neurociência para leigos
Pesquisador da UFRJ tenta desmistificar o conhecimento sobre o cérebro e os neurônios e mostrar como ele está presente em nosso dia a dia
Por Romina Cácia
10/12/2012

Divulgar ciência a leitores que desconhecem os jargões técnicos e não possuem conhecimento específico em neurociência e áreas afins, eis o desafio proposto pelo professor de medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)Roberto Lent, em seu livro Sobre neurônios, cérebros e pessoas (Editora Atheneu).Lent faz pesquisas sobre desenvolvimento e neuroplasticidade do sistema nervoso. Essa obra, lançada em 2011, reúne os textos publicados pelo autor na coluna “Bilhões de neurônios” da versão eletrônica da revista eletrônica Ciência Hoje entre 2006 e 2010.

Os textos estão organizados nos três eixos que dão título ao livro e referem-se aos principais objetos de estudo da neurociência. No primeiro deles, “Neurônios”, o autor tenta explicar como pesquisas que parecem não ter sentido algum podem na verdade esconder perguntas cruciais para a comunidade científica. Ao mostrar esse recorrente erro de avaliação pelos leigos – quando escutam falar, por exemplo, de uma pesquisa sobre se os canários machos cantam mais ou não na primavera –, ele convida o leitor a deixar um pouco de lado a visão de que cientistas são todos “desequilibrados” e a entender um pouco mais sobre seu trabalho.

Com o intuito de mostrar que a ciência é algo mais presente no nosso cotidiano do que poderíamos imaginar, Lent opta por começar cada capítulo desse eixo com comentários despretensiosos sobre seu próprio dia a dia, lembranças pessoais ou referências à filosofia. E, sem querer, aquele que decidiu avançar a leitura, curioso em saber um pouco mais sobre os embates de ideais da juventude de Lent na década de 1960, esbarra no pensamento de Friedrich Engels em sua Dialética da natureza e acaba tentandoentender sobre a neuroplasticidade homeostática dos neurônios.

Como isso acontece? Parte dessa “sedução” começa pelos títulos de cada capítulo. Lent deixou de lado o cientificismo e, para capturar o leitor, optou por expressões como “O cérebro fabrica maconha”; ‘Trair e coçar, é só começar'; “Nosso grande paradoxo”; entre outras. Quando necessário, Lent também usa termos conhecidos pelo público leigo para substituir denominações mais científicas, como tutano no lugar de medula óssea.

No segundo eixo do livro, “Cérebros”, Lent não deixa de lado os recursos anteriores, no entanto, é mais direto. O intuito aqui é explicar como uma inquietação qualquer sobre comportamentos rotineiros como, por exemplo, a linguagem gestual, a divagação ou o funcionamento do cérebro dos músicos produz questionamentos que levam a experimentos e conclusões – provisórias ou não.

O autor comenta igualmente acerca de temas delicados, como a religiosidade do ponto de vista da ciência, o debate sobre se o fóssil da mulher de Flores encontrado em 2003é de um ancestral humano e como a teoria da mente comprova que embora a organização cerebral seja a mesma em todos os indivíduos, a cultura modula seu funcionamento.

A discussão continua no terceiro eixo do livro, “Pessoas”, mostrando como pesquisas têm tentado explicar comportamentos humanos como o choro, o uso de drogas, a inspiração etc, ou avanços da neurociência como os neurorrobôs, além de comentar o uso da disciplina em decisões judiciais ou para explicar a noção de inteligência cultural.

Com capítulos curtos – entre três e seis páginas – e linguagem simples (dentro do possível), Roberto Lent consegue expor um pouco do mundo da neurociência e, portanto, alcança seu objetivo de divulgar esse campo do conhecimento entre leigos. No entanto, por mais que o texto seja leve, com bastante uso de imagens e de ricas referências à literatura, à filosofia e ao cinema; e que existam sugestões de leitura ao fim de cada capítulo, é preciso que o leitor já tenha tido contato –mesmo que mínimo –com o tema para um melhor aproveitamento do conteúdo. Entretanto, não se pode negar que é um convite sedutor para se aprofundar no conhecimento sobre neurociência, mesmo sem pretensões acadêmicas.

Sobre neurônios, cérebros e pessoas
Roberto Lent
Editora Atheneu, 2011
272 páginas