Um evento como a Copa do Mundo é uma grande oportunidade
para as empresas garantirem bons negócios. Aliar algum
produto a um esporte tão tradicional, como o futebol,
é uma estratégia usada pelas maiores
corporações do mundo. Estima-se que 32
milhões de telespectadores assistiram à Copa da
Alemanha pela televisão, configurando um ótimo
canal de estímulo ao consumo. O clima de festa é
responsável pelo aquecimento de diversos setores da economia
como confecção, brinquedos, turismo,
eletrodomésticos, construção civil e
bebidas. Nesse cenário, o futebol deixa de ser somente lazer
e se torna um negócio, em que tem grande peso os interesses
das empresas.
O mundial de futebol na Alemanha foi o evento esportivo mais lucrativo
da história das copas. Calcula-se que a FIFA arrecadou US$
2,5 bilhões com patrocínios, produtos de
merchandising e ingressos. Desse total, US$ 1,7 bilhão
vieram da venda de direitos de transmissão à TVs.
Esse valor é 25% maior que o pago em direitos de
transmissão na última copa, no Japão,
que já tinha sido o maior da história. Nesse
quadro de investimentos, a Europa desembolsou 65% do valor, cerca de
US$ 1,1 bilhão. Em seguida está a
América do Sul e a Ásia. A Rede Globo, por
exemplo, pagou US$ 450 milhões pelo direito de
transmissão exclusiva das copas de 2002 e 2006 para o Brasil.
Marcelo Weishaupt Proni, pesquisador do Instituto de Economia da
Unicamp, autor do livro A metamorfose do
futebol (Campinas, SP. Unicamp 2000) discorre sobre
os aspectos que envolvem esse evento e fazem do futebol um
espetáculo, que ele chama de
“futebol-empresa”. “Procuro entender a
Copa do Mundo como um evento marcante no avanço da
complexidade da transformação do futebol como um
grande negócio”. Proni alerta que o
futebol-empresa faz parte de um mercado muito específico,
praticamente fechado. “A Fifa controla e estabelece as regras
do jogo que se estrutura a partir da competição
esportiva. Um mercado cuja capitalização e
rentabilidade é regulamentada pela própria
Fifa”, afirma.
Com esse poder de controlar as transações
financeiras bilionárias, as grandes
corporações transnacionais não perdem
tempo e tornam-se sócias da Fifa.
Para o período de 2007 a 2014, a Fifa já
estabeleceu seus parceiros comerciais e a garantia de que nos
próximos eventos esportivos terá o lucro
garantido. Esse período inclui a Copa Mundial Feminina
sub-20 da Fifa, a Copa Mundial de Beach Soccer, a Copa Mundial de
Clubes da Fifa, a Copa das Confederações (2009 e
2013) e as duas próximas Copas do Mundo, em 2010 na
África do Sul e 2014 na América do Sul.
África 2010. Lucros? Com certeza!
Faltando quase quatro anos para a Copa da África, alguns
contratos milionários já estão
garantidos. A informação disponível no
site da Fifa sobre o programa de patrocínio 2007-2014,
mostra as estratégias comerciais para os próximos
oito anos. A Federação classifica os futuros
parceiros em três categorias: são seis
sócios da Fifa, de seis a oito patrocinadores da Copa do
Mundo e de quatro a seis promotores nacionais. Os sócios
são os gigantes transnacionais como a Adidas (material
esportivo), Hyundai (indústria de automóveis),
Sony (indústria de eletro-eletrônicos), Coca-Cola
(alimentos), Visa International (mercado financeiro) e Emirates Airline
(aviação). As empresas que se enquadram na
categoria de sócio, desfrutam do maior nível de
associação, isso significa que possuem direitos
especiais sobre todos os eventos esportivos da Fifa.
As últimas copas do Mundo foram realizadas em
países com alto poder de consumo.
2006 Alemanha. 2002 Coréia e Japão. 1998
França. 1994 EUA
fonte: Fifa
Um dos sócios, a Visa International, deixou seu concorrente,
a Mastercard, para trás, ao fechar um contrato de US$ 200
milhões com a Fifa. Agora, além de ser o
cartão de crédito oficial da
federação até 2014, terá
preferência na publicidade nos estádios.
Já entre os patrocinadores, o que mais se destaca
é a parceria com a empresa de alimentos Mc
Donald’s. Antes mesmo de acabar a Copa do Mundo na Alemanha,
a empresa norte-americana fechou contrato como patrocinadora da Copa do
Mundo da Fifa até 2014. A Fifa não divulgou o
valor do contrato, mas a empresa terá a exclusividade na
categoria de alimentos fast food, direito ao uso das marcas oficiais do
evento (tanto da copa do mundo como na Copa das
Confederações em 2009 e 2013), além do
marketing e dos painéis de publicidade nos
estádios.
Cada vez mais se nota a presença de grandes canais de
comunicação, instituições
financeiras, grandes empresas de material esportivo, alimentos etc,
nesses eventos. “A valorização desse
negócio nos últimos 20 anos, desde a copa de
1986, no México, cresceu muito, pois há uma
pressão cada vez maior para favorecer os interesses privados
e particulares para alterar as regras do jogo e abrir mais as chances
de valorização”, lembra Proni. Os
gastos com a construção de estádios de
futebol, com os transportes, modernização da
linha ferroviária, hotéis, restaurantes, entre
outras coisas, geram um impacto positivo do ponto de vista
econômico. “Essas obras ajudam a alavancar a
economia e criam empregos diretos e indiretos, alguns são
temporários mas outros permanecem”, afirma.
“No caso alemão, o turismo é uma grande
oportunidade de marketing para a promoção de
algumas cidades”, completa.
Vários estudos procuram mapear o impacto econômico
de uma copa do mundo. Um exemplo é a
dissertação de Anderson Gurgel Campos
“O futebol no campo econômico:
construção jornalística da Copa do
Mundo de 2002 como negócio”, da
Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC-SP). O autor trabalha com a idéia
de consumo e com a Copa do Mundo como um produto. “Elemento
fundamental na cadeia produtiva, o consumo é extremamente
importante no cenário atual do mundo dos
esportes”, afirma. Para ele, há uma
mudança de caminho brusco que explica a
relação entre o futebol e o consumo, que pode ser
mais bem entendido se observada a parceria do esporte com as empresas
de telecomunicações. “A
mudança de paradigma passa pela expansão do
esporte enquanto base de consumo, sobre a qual são
edificadas diversas estratégias para a venda de produtos,
inclusive a partir de ídolos”, pontua Campos.
Ídolos e mercadorias na vitrine
O uso dos ídolos esportivos é uma
estratégia de aumento da venda de produtos e
serviços. O Banco Santander Banespa, por exemplo, com a
intenção de passar a mensagem de
“melhor banco do mundo”, investiu cerca de US$ 100
milhões em propagandas ao reunir alguns dos melhores
jogadores do mundo como Kaká, Ronaldo, Ronaldinho
Gaúcho e Robinho em uma única peça
publicitária.
No artigo “A fabricação dos
ídolos esportivos” - publicado na Revista da
Associação Nacional de
Pós-Graduação e Pesquisa em
Educação (Anped) n° 23 -
de
Fátima Maria Pilotto, é discutido o poder que os
meios de comunicação tem de explorar a imagem dos
ídolos como mercadoria.
Ela explica que o processo de fabricação ocorre
em todas as instâncias da mídia e envolve a
publicação de artigos, fotografias, textos
publicitários, narração de jogos e
comentários de especialistas. De acordo com Pilotto,
não é apenas o talento que transforma um jogador
em ídolo, mas as publicações de
reportagens e notícias que falam não apenas de
seu desempenho em competições, mas de sua vida
particular como seus gostos, seus bens materiais, sua intimidade.
“Outras dimensões desses sujeitos são
igualmente postas em destaque para associá-las ao seu
talento e é tudo isto que interfere na sua
fabricação como ídolo”.
O uso dos ídolos pelo marketing é um grande
negócio. Transformar atletas em mercadorias se tornou uma
prática freqüente, amplamente divulgada pela
mídia. De acordo com Pilotto, os ídolos
esportivos se tornam verdadeiras vitrines que expõem algumas
mercadorias caras e raras. Em 1999, “foi publicado no
jornal uma fotografia de Ronaldinho fazendo um sinal de
ligação telefônica com uma das
mãos. Esse simples fato foi suficiente para o jornal
estimular a Embratel a contratá-lo como garoto propaganda
para 'fazer um 21'”, conclui Pilotto.
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