Como o movimento “Maker� pode se aliar às impressoras 3-D e ferramentas de programação para fomentar o fortalecimento dos empreendedores modernos.
Marina Gomes
10/05/2013
H� pouco mais de 60 anos, o mecânico Fred Hauser projetou em uma oficina em sua casa, nas horas livres, um mecanismo de irrigação automático para jardins. Foram anos entre a invenção e a chegada do produto efetivamente às prateleiras. “Ele precisava despertar o interesse de um fabricante que se dispusesse a pagar pelo licenciamento da invenção, o que, além de difícil, acarreta para o inventor a perda do controle sobre a invenção. São os proprietários dos meios de produção que decidem o que produzir�, descreve sobre esse episódio Chris Anderson, autor do livro Makers � a nova revolução industrial.
Neto de Hauser, Anderson herdou a vontade de inventar � mas, como aponta o ex-editor da prestigiada revista Wired, que fundou a empresa 3D Robotics para fabricar aeromodelos autônomos, o caminho entre a ideia e o produto tornou-se muito mais simples, ágil e independente do que na época de seu av�. Agora, ele mesmo pode controlar a produção.
Declaradamente parcial, o autor, entusiasta das novas tecnologias, expõe o que ele chama de uma nova revolução industrial, fruto dos últimos 10 anos de descobertas de outras formas de criar e compartilhar pela internet. Cada vez mais, os chamados “Makers� criam produtos e serviços usando ferramentas digitais e fabricam em oficinas caseiras, de forma a atender, principalmente, nichos específicos ignorados pela indústria de massa.
“Hoje a fabricação digital desktop efetivamente introduziu um tipo de ‘produção artesanal mecanizada� com que Piore e Sabel ( Michael Piore e Charles Sabel, teóricos do pós-fordismo) s� poderiam ter sonhado na época. Em vez de retornar às máquinas de costura e às oficinas locais, que as grandes fábricas expulsaram do mercado 100 anos atrás, o Movimento Maker se baseia na fabricação digital de alta tecnologia e possibilita que pessoas comuns explorem � vontade a capacidade das grandes fábricas de fazerem o que quiserem. � a combinação perfeita de inventar no âmbito local e produzir no âmbito global, atendendo a mercados de nicho definidos pelo gosto, não pela geografia. E a característica inequívoca desses novos produtores � que não farão os mesmos produtos padronizados que definiram a era da produção em massa. Ao contrário, começam com produtos personalizados e a partir da� descobrem outros consumidores que compartilham seus interesses, paixões e necessidades singulares�, aposta o autor.
O ponto central dessa revolução � traçado pela chegada das impressoras 3-D com preços mais acessíveis � população. Para um adepto do DIY (da sigla para do it yourself, ou faça voc� mesmo), o caminho da liberdade começa nessas máquinas, cujos preços hoje nos Estados Unidos começam em US$ 1000. Mas não � tão simples assim.
Empoderar não apenas o consumidor como criar uma nova legião de pequenos e médios empreendedores � o vislumbre de Anderson para o futuro. Para isso, são necessárias quatro ferramentas desktop: escaneador 3-D, máquina CNC (controle numérico computadorizado), cortadora a laser e impressora 3-D.
A impressão comercial 3-D ainda trabalha com poucos tipos de material (metal ou plástico), mas a tendência � de aumentar a variedade em médio prazo. Polpa de madeira e nanotubos de carbono não são um sonho distante, e algumas impressoras 3-D podem imprimir at� circuitos elétricos. De órgãos a coberturas de bolos e armas, a gama de possibilidades � infinita � como bem aponta um capítulo intitulado “As ferramentas da transformação. As impressoras 3-D estão avançando rumo ao sonho dos alquimistas: fazer tudo�.
Financiar, aprimorar e compartilhar
Construir algo, de fato, � apenas parte de um processo cíclico cujo cerne est� no compartilhamento, uma das obsessões de Anderson desde o lançamento de seus dois livros anteriores A cauda longa (The long tail) e Free: the future of a radical price.
“Projetos compartilhados na web viram fonte de inspiração para outros e se transformam em oportunidades de colaboração. Os Makers individuais, assim conectados em âmbito global, se convertem em movimento social. Milhões de adeptos do FVM faça voc� mesmo, que at� então trabalhavam sozinhos, passam a trabalhar juntos�.
Reunir a sua volta uma comunidade amante dos mesmos interesses contribui para o aprimoramento do produto, e neste ponto � difícil discordar de Anderson. Porém, nota-se uma visão romântica do autor ao creditar uma competição como sadia com referência aos piratas que apenas copiam as ideias do grupo.
Defendendo amplamente a licença de código aberto, ele decreta que um dos principais elementos de uma comunidade bem sucedida � conteúdo com amplo apelo, não s� fóruns de discussão, mas também postagens em blogs, compartilhamentos de fotos e de vídeos, além de feeds de notícias.
� exatamente nessa comunidade compartilhada que ele toca em terreno espinhoso ao afirmar que nada precisa surgir do zero, pois as inovações do modelo permitem uma perfeita aplicação a partir de uma realidade j� existente, escaneando objetos e inserindo modificações desejadas. “Não � preciso inventar algo a partir do nada para ter uma ideia original. Em vez disso, voc� pode participar do aprimoramento colaborativo de ideias ou projetos existentes. A barreira de entrada na participação � mais baixa porque � mais fácil modificar arquivos digitais que cri�-los do zero�. Assim, faz todo o sentido listar, entre os objetos necessários às fábricas caseiras, um scanner 3-D, que copia a base existente em átomos e a transforma em bits. A pergunta que fica, porém, �: quais seriam os limites entre inovação e um simples aprimoramento? Ele não aponta claramente.
Outro item de fundamental importância proporcionado pela rede � o financiamento coletivo em sites no qual os empreendedores divulgam seus planos de negócios. Ele exemplifica com o Kickstarter, um dos mais proeminentes sites de crowdfunding, ou o capital de risco para o Movimento Maker. Assim como as ferramentas de produção, foram democratizadas também as formas de financiamento, formando nova classe de investidores, aqueles que investem em conceitos.
Apostas
Se a empolgação de Anderson contagia e faz com que o leitor vibre com as infinitas possibilidades abertas pela tecnologia a favor do empreendedorismo, por outro lado também � o ponto fraco do livro, e causa certa inquietação por não apontar críticas e desvantagens do sistema. Ao mesmo tempo em que cita como a indústria automobilística d� seus passos para que “novos bits dêem nova vida a velhos átomos� e se reinventam indústrias que parecem engessadas h� anos, parece fechar os olhos para as preocupações reais sobre quem j� est� também utilizando as impressoras 3-D caseiras para outros fins. Recentemente foi fabricado o primeiro protótipo de armas.
Retomando seu pensamento sobre a “Cauda Longa�, utiliza muitos exemplos de mercado de nicho � como um trabalhador normal que descobriu outros amantes de aquários de águas-vivas e se tornou empresário � e deixa de lado questões primordiais sobre o que se espera de uma revolução, que altere significantemente aspectos mais grandiosos do cotidiano.
De fato, vivencia-se um momento único de velocidade nas mudanças do ciclo de produção e da sociedade, e o livro de Anderson � sem dúvida uma aposta, que tende muito mais para acertos.
Makers � a nova revolução industria Chris Anderson Elsevier � Campus 2012 284 páginas