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Centro de produção de materiais didáticos digitais: a experiência do Instituto UFC Virtual
Mauro C Pequeno e
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Artigo
Centro de produção de materiais didáticos digitais: a experiência do Instituto UFC Virtual
Por Mauro C Pequeno e
Henrique Sérgio L. Pequeno
10/09/2012
A utilização de metodologias e didáticas no ensino superior como as peculiares à educação semipresencial e o uso de tecnologias, potencialmente, estão mudando a cultura da educação em todas as partes do mundo. Trabalhar com tecnologia aplicada à educação requer da instituição o domínio técnico sobre as ferramentas, mas, sobretudo, maturidade para a utilização adequada que venha a efetivamente trazer bons resultados. Para se obter profundidade quanto ao entendimento sobre o potencial da tecnologia enquanto aplicação educacional, é importante que não só se experimente seu uso, mas que se possa chegar a condição de desenvolvimento personalizado de ferramentas quando necessário. Essa condição de domínio para a construção de artefatos tecnológicos, se destaca frente a uma postura limitada de usuário, mero configurador de aplicações pré-existentes. No nosso entender, essa autonomia é de suma importância para um uso desenvolto e vanguardista de tecnologias voltadas à educação.

Partindo do entendimento de que teríamos que desenvolver nosso próprio formato de Centro de Produção Multimídia que trabalha com cursos nas diversas modalidades de ensino, porém, com o uso de tecnologias para enriquecer e transformar as práticas educacionais, o Instituto Universidade Virtual (IUVI), da Universidade Federal do Ceará (UFC) se deparou com certos desafios, como: a) formação de equipes de trabalho; b) rrganização da produção; c) desenvolvimento de sistemas; e d) inovação.

Formação das equipes de trabalho

Iniciar um centro de produção de material didático digital requer a constituição de equipes para se trabalhar para este fim. A opção de se elaborar material didático que seja multimidiático, demanda da instituição a necessidade de criar um grupo de trabalho multidisciplinar. Dessa forma, a configuração de uma equipe abre espaço para profissionais de áreas como design, comunicação social, computação, educação dentre outros. Esses profissionais possuem uma formação disciplinar e o resultado do trabalho é um produto multidisciplinar, então nos deparamos com a necessidade de fazer com que esses profissionais trabalhem interdisciplinarmente. Assim, foi percebida a necessidade de que, em alguns momentos, fossem desconstruídas, um pouco, suas visões unidirecionais nos seus campos de saber, para que pudessem vislumbrar seu trabalho como parte de algo mais abrangente e plural. Foi de suma importância, nessa etapa, que tivéssemos momentos de reflexão sobre os trabalhos em conjunto e sobre a prática de cada um, analisando de que forma poderia se coadunar os esforços em equipe.

Na ausência de uma capacitação convencional, esses momentos de reflexão sobre a prática a ser desenvolvida foram essenciais para o início dos trabalhos. Em 2009, a partir de uma decisão estratégica de se propiciar uma formação diferenciada que viesse a atender não só ao IUVI mas, sobretudo, à sociedade, foi desenvolvido o curso de bacharelado em Sistemas e Mídias Digitais, que possui uma formação acadêmica pensada para o trabalho interdisciplinar. Atualmente, boa parte de nossos colaboradores são alunos deste curso.

Aliado ao bacharelado, temos também a oferta pontual de oficinas específicas para nivelamento rápido de novos membros das equipes.

Organização da produção

A adequada gestão dos recursos disponíveis para o trabalho em um centro de produção é um dos pontos cruciais para a obtenção de sucesso. Lidar com os atrasos no recebimento dos materiais por parte de professores conteudistas, fazer uma adequada distribuição das atividades, verificar em tempo real o estado das atividades, identificar a sobrecarga ou subutilização das equipes são questões rotineiras de um gestor de centro de produção. Para realizar esse acompanhamento, foi implementado um fluxo próprio para o desenvolvimento de atividades, feito de forma colaborativa e multidisciplinar por professores, equipe pedagógica (também denominada de equipe de transição didática, homônima ao processo), e equipe de produção técnica (programadores web e designers). A figura abaixo apresenta o fluxo de produção estabelecido.

Fluxo de produção

http://www.labjor.unicamp.br/comciencia/img/ead/ar_mauro/ar_mauro.jpg

Fase 0 (pré-fluxo): Esta fase é constituída por momentos de contextualização do professor conteudista tanto em relação ao processo de produção de material didático do IUVI, como pela apresentação dos potenciais de utilização de TICs na prática educacional específica do professor. Esses momentos podem ser compostos por seminários, formações e reuniões individuais ou em pequenos grupos de professores divididos por unidades curriculares. Ainda, nesta fase, são dadas as primeiras orientações ao professor sobre planejamento de um componente curricular que venha a utilizar as TICs em apoio à sua oferta nos cursos presenciais ou semipresenciais. Para preparar e facilitar o diálogo, foi desenvolvida uma capacitação específica para o professor conteudista ( com regime de 90horas/ano).

Fase 1: Neste momento o professor produz o conteúdo e, em seguida, realiza a entrega do material original, parcial ou integral, que será utilizado para as aulas (agenda, aulas, material de apoio etc);

Fase 2: Os responsáveis pelo recebimento do conteúdo das aulas darão início à segunda fase, denominada homonimamente de “transição didática” (TD). O trabalho da equipe de TD consiste na apropriação do conteúdo das aulas em busca da assimilação da proposta idealizada pelo conteudista. Com o objetivo de auxiliar e promover a construção de uma aprendizagem significativa, cabe à equipe de TD sugerir a utilização e a criação de ferramentas capazes de tornar o conteúdo mais acessível e de fácil compreensão em um formato compatível com a metodologia em questão, sem perder a proposta didática original. Concluído o trabalho da equipe, as aulas são encaminhadas por email ao professor conteudista para sua apreciação .

O professor conteudista recebe as aulas com as sugestões dadas pela equipe de TD, as quais deverão ser minuciosamente revisadas pelo mesmo. Esta fase é denominada de “primeira revisão”. Este é o momento mais adequado para o professor discordar/concordar, acrescentar/excluir ou sugerir alterações no conteúdo. Enfim, verificar se as aulas estão em conformidade com a sua proposta de ensino. Feito a análise, o professor devolverá o material com suas considerações à equipe de TD para que a mesma análise a proposta acatando completa ou parcialmente as considerações apontadas em sua revisão – há um diálogo conciliatório entre as partes. Com o documento aprovado tanto pelo professor quanto pela equipe de TD, esta encaminha a proposta para a equipe de produção.

Fase 3: Esta fase denominada de “produção e formatação”, realizará um processo técnico de concretização da proposta elaborada para o formato web. São utilizados linguagem específica e documentos padronizados que facilitem a comunicação entre o professor, a equipe de TD e a formatação (equipes de produção e desenvolvimento). A equipe de produção dispõe de um conhecimento técnico de produção e edição de vídeo, design gráfico 2D/3D, programação computacional para jogos, dispositivos móveis e web, e é a responsável pela materialização da proposta elaborada pelo professor e pela equipe de TD. Ao final, há uma disponibilização do conteúdo, já publicado em formato web, para que a equipe da TD possa validar o estado atual da proposta.

Fase 4: Também denominada “revisão da TD”, esta fase é caracterizada pela conferência, por parte da equipe de TD, se a implementação técnica da proposta sugerida na segunda fase foi corretamente implementada. Dentre outros aspectos, o conteúdo formatado deve estar em sintonia com a agenda em relação à quantidade de aulas, títulos, tópicos, fóruns, portfólios e material de apoio. Se o material estiver em conformidade com a proposta, será dado prosseguimento ao processo. Se não, retorna à etapa anterior para as devidas correções.

Fase 5: Chamada de “segunda revisão do professor”, esta fase é o momento em que a aula é publicada em teste no AVA - SOLAR para apreciação do professor. Nessa ocasião, o professor confere, pela primeira vez, a aula na web. É então verificada a conformidade da aula com a sua proposta de ensino, considerando possíveis ajustes. Neste último caso, o professor preenche um documento denominado de “segunda revisão do professor”, no qual constam as alterações consideradas necessárias. Tal documento faz com que a aula retorne à fase 4, repetindo o processo, até que o professor dê autorização para a publicação.

Fase 6: Denominada “fase de publicação”,é quando é feita a configuração do curso e publicação do conteúdo no AVA – no caso da UFC, no ambiente SOLAR, mas que poderia ser em qualquer outro ambiente escolhido pela instituição – no espaço para aplicação do componente curricular com alunos e tutores.

Esta fase ocorre quando a ação demandar que a UFC seja responsável pela publicação. Quando a atividade negociada se restringir à produção de material didático por parte da UFC, as aulas são disponibilizadas em um repositório específico para que a instituição que fará a publicação possa acessar os arquivos.

Fase 7: Esta é a etapa em que o aluno obtém acesso ao curso no AVA. Assim como destacado na Fase 6, ela pode ou não existir dependendo da natureza da ação. Nos cursos em que a UFC é responsável também pela oferta, é feita então, nesta etapa, a alocação de professores, tutores e coordenadores nas turmas.

Sistemas de informação

A adoção de sistemas de informação permitiu o trabalho colaborativo das equipes e acompanhamento por parte dos gestores. A equipe de desenvolvimento de sistemas construiu uma ferramenta de gerência de projetos que registra todos os estágios definidos pelo fluxo de trabalho do IUVI. Assim, é possível acompanhar em tempo real o que cada um está desenvolvendo, informar ao professor sobre os marcos de revisão, redistribuir as equipes para a finalização de um conteúdo com maior urgência etc.

Outro sistema utilizado é o de controle de versões. A utilização de uma ferramenta opensource para essa finalidade dá segurança ao trabalho colaborativo das equipes e permite o registro histórico do desenvolvimento e recuperação de versões. Esse versionamento é importante, pois é comum que professores façam revisões sobre o conteúdo originalmente produzido por um colega.

Todo o material produzido e armazenado no repositório de mídias é interligado a um sistema web que permite a busca e recuperação de conteúdos produzidos. Esse acervo tem sido utilizado pelas equipes de produção propiciando o reuso de recursos já produzidos, amentando assim a produtividade do trabalho.

Desenvolvimento de sistemas

Para a criação e, principalmente, evolução de sistemas como AVA’s, integração de sistemas educacionais a sistemas de controle acadêmico, estruturação de segurança da informação da instituição, construção de sistemas de apoio à gestão de equipes etc, é de suma importância a existência de um grupo multidisciplinar que conte com pessoas das áreas de usabilidade, análise e modelagem de software, programação, testes e design de interface.

Atualmente estão sendo desenvolvidos, concomitantemente, uma plêiade de sistemas por essa equipe.

Inovação

Como descrito ao longo deste artigo, estabelecer uma estrutura fluída de produção exige dos gestores, em um primeiro momento, esforços no sentido de bem especificar o escopo das etapas de trabalho, criar dispositivos de controle e contingenciamento, elaborar uma cristalina especificação de papéis etc. Por outro lado, uma vez superado esses desafios, fatalmente esse gestor chegará à conclusão de que há um processo de robotização de sua equipe, algo completamente negativo a um processo que deve ser plenamente criativo e em constante estado de aperfeiçoamento. Mas como fazer com que a equipe de produção venha a atender aos prazos e demandas, cada vez maiores, e ainda assim conseguir refletir sobre sua prática e sobre o estado da arte de tecnologias e metodologias de conteúdos educacionais?

No IUVI, a saída para este dilema foi a criação de estruturas paralelas à produção, as Células. As Células são grupos de pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias e metodologias, que promovem a criação de novas formas hipermodais de conteúdo. As células são coordenadas por professores do IUVI e contam com a participação de bolsistas e alunos voluntários de cursos como Sistemas e Mídias Digitais. Atualmente existem 6 células, que são: animação, jogos sérios, comunicação, audiovisual, usabilidade e EDM (educational data mining). Os objetos resultantes das células comumente são incorporados aos conteúdos produzidos pelo Centro de Produção.

O futuro

O IUVI está trabalhando para que possa disponibilizar em um intervalo de, no máximo, um ano um conjunto de sistemas integrados que permitirão a IES produzirem material didático multiplataforma e de forma natural à prática docente. A suíte de software a ser apresentada contemplará os diversos dispositivos (tablets, PCs, smartphones), permitindo a produção de conteúdos para esses dispositivos e o compartilhamento de conteúdos em repositórios multimídia. Todos esses sistemas serão integrados e permitirão a produção diversificada e que transcenda o atual cenário restrito de um centro de produção, fazendo com que toda uma comunidade acadêmica passe a produzir conteúdo didático multimídia.

Outro desafio de trabalho onde se quer avançar é sobre a personalização de conteúdo. Conseguir imprimir nos conteúdos um determinado nível de personalização ao aluno, levando em consideração, ainda que minimamente, sua base de conhecimento e seu contexto social, será um grande avanço para termos materiais que venham a trazer maiores benefícios a esses alunos.

Mauro Pequeno é mestre em ciência da computação e doutor em engenharia. Atualmente é professor associado II da Universidade Federal do Ceará (UFC) e diretor do Instituto Universidade Virtual, consultor ad hoc do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Henrique Sérgio Lima Pequeno é doutorando em ciências da computação, mestre em engenharia de teleinformática com objeto de estudo na área de TV digital. Atualmente é professor assistente da UFC e coordena o Setor de Tecnologias Digitais do Instituto UFC Virtual. Coordenador Adjunto dos cursos semipresenciais da UFC.