Atendimento
integrado em acidente cerebrovascular ainda não é
padrão no Brasil
Com uma palestra sobre os avanços e necessidades no tratamento
do acidente vascular cerebral (AVC), ministrada por Ayrton Massaro,
professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp),
em dezembro, o Departamento de Neurologia da Unicamp deu início
a uma seqüência de ações para impulsionar
a implantação de um programa de atendimento integrado
a pacientes com AVC na cidade de Campinas (SP). Desde 2001, quando
publicou o primeiro consenso brasileiro do tratamento da fase
aguda do acidente vascular cerebral, a Sociedade Brasileira de
Doenças Cerebrovasculares recomenda que o paciente seja
transportado imediatamente para o local mais apropriado para a
investigação e que todos os centros hospitalares
habituados ao atendimento de pacientes com essa doença
desenvolvam unidades de tratamento do AVC.
Embora
algumas cidades já tenham implantado um sistema que integre
atendimento pré-hospitalar com os centros especializados,
a proposta está bem longe de ser o padrão nas emergências
do Brasil. São Paulo possui apenas um centro de referência,
no Hospital Albert Einstein, inaugurado em agosto de 2004. Porto
Alegre é a região mais adiantada, com seis centros
de atendimento ao AVC. “Poucos são os lugares que
fazem o atendimento integrado. Muitas são as complicações”,
comenta Massaro.
“Estamos
iniciando uma seqüência de ações para
que, futuramente, a gente possa olhar para o paciente com AVC
com uma perspectiva mais favorável, sabendo que existe
tratamento para a causa e quais medidas devem ser tomadas para
que essa situação possa ser efetivamente modificada”,
diz Li Li Min, do Departamento de Neurologia da Unicamp.
Atendimento
integrado
A idéia é que o atendimento ao paciente com AVC
decorrente de isquemia aguda seja semelhante ao atendimento do
infarto agudo do miocárdio, com a indicação
do tratamento em centros especializados, em unidades de terapia
intensiva neurológica, ou mesmo em unidades específicas
para o tratamento do Acidente vascular cerebrovascular. A eficiência
do tratamento dos pacientes com AVC agudo depende diretamente
do conhecimento dos seus sinais e sintomas pela população,
da agilidade dos serviços de emergência, incluindo
os serviços de atendimento pré-hospitalar e das
equipes clínicas, que deverão estar conscientizadas
quanto à necessidade da rápida identificação
e tratamento desses pacientes.
O
tempo entre o início dos sintomas e a avaliação
clínica inicial pode interferir na conduta terapêutica
adotada posteriormente pelo neurologista aos pacientes com AVC
isquêmico agudo. O erro na interpretação dos
sinais e sintomas pode impedir o diagnóstico, levando,
conseqüentemente, a um tratamento inadequado. O diagnóstico
diferencial entre o AVC isquêmico e o hemorrágico
é outra etapa fundamental para definir o tratamento na
fase aguda e deve ser confirmado o mais rápido possível
pela tomografia computadorizada de crânio. Os exames complementares,
realizados paralelamente à avaliação clínica,
permitem direcionar o tratamento.
De
acordo com Ayrton Massaro, o programa integrado engloba o reconhecimento
da doença, suporte clínico inicial, diagnóstico
e decisão quanto ao tratamento. “Mas tudo isso deve
ser feito em menos de três horas”. O caráter
de urgência no atendimento ao paciente passou a ter muito
mais importância com a descoberta do medicamento rtPA (fibrinolítico
ou trombolítico), que, se utilizado em pacientes com AVC
isquêmico em até três horas, reverte o processo
em até 30%, impedindo a necrose do tecido cerebral por
falta de oxigênio e nutrientes. “O tempo no atendimento
é fundamental. O emergencista tem que estar treinado e
capacitado para reconhecer o AVC e agir rápido”,
afirma o médico.
O
AVC isquêmico caracteriza-se pela obstrução
de uma das artérias do cérebro, privando a região
de oxigênio e de nutrientes trazidos pelo sangue. O fibrinolítico
ou trombolítico dissolve essa obstrução e
faz o sangue voltar a circular e alimentar o tecido cerebral,
evitando a necrose. A maioria dos pacientes não recebe
o medicamento porque não chega ao hospital no tempo adequado.
Daí a necessidade de integrar ao serviço de atendimento
pré-hospitalar o transporte para o hospital.
No
entanto, Massaro observa que é preciso realizar um estudo
sobre as necessidades de cada região da cidade antes de
criar as unidades de atendimento. Um estudo realizado recentemente
sobre a mortalidade do AVC em São Paulo constatou que quanto
mais rica a região, menor é a taxa de mortalidade.
A zona leste de São Paulo é a região que
apresenta maior mortalidade. “A cidade precisa integrar
o resgate, com unidades bem localizadas para acesso mais fácil
à população. A gente tem que saber o que
é bom para os nossos próprios pacientes”.