Relatório
do Unicef denuncia vulnerabilidade na tríplice fronteira
No
dia 12 de dezembro, o Fundo das Nações para a Infância
(Unicef) lançou o relatório
"Situação das Crianças e dos Adolescentes
na Tríplice Fronteira - Argentina, Brasil e Paraguai: Desafios
e Recomendações", que analisa 62 municípios
da região, onde vivem cerca de 880 mil pessoas menores
de 19 anos e 220 mil menores de cinco, representando quase 45%
da população desta área. O estudo se propõe
a contribuir para uma melhor compreensão dos problemas
e violações de direitos que enfrentam essas crianças
e adolescentes da tríplice fronteira e apresentar ações
para o cumprimento dos direitos prescritos na Declaração
Universal de Direitos Humanos e na Convenção dos
Direitos da Criança, e assim, formar uma base sólida
para o estabelecimento de políticas públicas e para
a definição de ações concretas em
prol dessas crianças e adolescentes.
Por
mais que Brasil, Argentina e Paraguai tenham diferenças
tanto culturais quanto econômicas e sociais, ao se observar
as crianças e adolescentes na tríplice fronteira,
nota-se que, apesar dessas diferenças, muitas delas detêm
as mesmas "situações de violação
de direitos, alta vulnerabilidade, desproteção,
pobreza e desigualdade", declara o relatório. Desde
a promulgação da Convenção dos Direitos
da Criança, há quinze anos, os três países
tiveram avanços no que concerne aos direitos das crianças
e adolescentes. Todavia, segundo o estudo, ainda há muitos
desafios para que esses direitos sejam plenamente respeitados.
O
relatório afirma que as crises que atingem os países
estudados, principalmente a Argentina, contribuem para a exclusão
que assola as crianças e suas famílias, e que o
desemprego atinge não somente os adultos, mas também
os adolescentes em idade para ingressar no mercado de trabalho.
O subemprego é comum na região e a escassez de serviços
sociais, como educação e saúde, aumentam
ainda mais a vulnerabilidade na infância, o que de acordo
com o estudo, pode estar entre as causas do trabalho infantil.
Pobreza
O relatório mostra que as famílias pobres da região
"estão impedidas de exercer seus direitos fundamentais,
a um trabalho decente, alimentação adequada, boa
assistência de saúde, escola de qualidade e opções
diversificadas de lazer. A pobreza as impede de construir projetos
de vida e reduz consideravelmente as oportunidades de progressos
pessoais e familiares". O estudo conclui que a pobreza costuma
ter sexo e cor, atingindo sobretudo, mulheres e pessoas negras,
índias ou pardas. No que se refere à taxa de mortalidade
infantil (TMI), o relatório indica que entre crianças
indígenas e negras ela é maior do que a das crianças
brancas no Brasil. Conforme o Sistema de Informação
sobre Mortalidade e o Sistema Nacional de Nascidos Vivos, em 2002,
enquanto a TMI de crianças brancas era de 16,6 para cada
mil, a de crianças índias era de 25 e das crianças
negras de 22,3. É importante que os governos levem isto
em consideração ao elaborarem seus programas sociais
de combate à pobreza, ressalta o relatório.
Nos
municípios selecionados dos três países, os
indicadores de pobreza (Necessidades Básicas Insatisfeitas/NBI
ou Linha de Pobreza) indicam que de 12,3% a 57% da população
vive abaixo da linha da pobreza. Na Argentina, seis departamentos
têm indicadores de NBI maiores que a média provincial
que é 27,1%, segundo dados de 2001. No Brasil, 17 dos 35
municípios selecionados para o estudo têm uma proporção
de pobres maior que a estadual (23,7% no Paraná e 28,7%
no Mato Grosso do Sul). Já no Paraguai, são três
os municípios que têm uma proporção
de pobres maior que a estadual (29,12% em Alto Paraná,
48,7% em Caaguazú e 44,2% em Canindeyú).
Tráfico
de seres humanos
O tráfico de crianças e adolescentes na tríplice
fronteira está ligado sobremaneira à exploração
sexual de crianças e adolescentes. O estudo cita dois casos,
um ocorrido em 2003, em Foz do Iguaçu, onde a Polícia
Federal prendeu uma agenciadora internacional de meninas que levava
brasileiras para serem exploradas em Buenos Aires, e um outro
caso ocorrido um mês depois, em que o Conselho Tutelar de
Foz de Iguaçu resgatou duas meninas brasileiras num prostíbulo
de Los Cedrales, no Paraguai, com o apoio da Policia Nacional
paraguaia. O relatório do Unicef salienta que esses casos
refletem a gravidade do problema do tráfico na região
e, além disso, discorre sobre o fato de pouco serem os
casos denunciados e investigados, refletindo o alto grau de impunidade
para com os traficantes.
Através
de entrevistas de campo, foi apontada a existência de recrutadores
que vão até as localidades atraindo crianças
e adolescentes, com ofertas de trabalho que são, no final
das contas, redes de exploração sexual. O estudo
ressalta que o tráfico de seres humanos é uma das
mais graves violações dos direitos de crianças
e adolescentes; crianças traficadas estão expostas
a toda sorte de explorações e a uma série
de perigos e vulnerabilidades.
No
final do relatório, ressalta-se a necessidade da construção
de redes de proteção com o apoio dos governos e
sociedade civil e até de organismos internacionais, para
minimizar a vulnerabilidade das crianças nessa região
insegura e, desta forma, transformar a realidade e garantir a
proteção de todas as crianças e adolescentes
da tríplice fronteira. O relatório discorre também
sobre sua contribuição "para esta tarefa urgente
e necessária para promover a garantia, respeito e proteção
dos direitos das crianças e adolescentes na região".
E, além disso, evidencia que promovendo os direitos da
criança e do adolescente, surge uma oportunidade de se
fortalecer a cooperação e integração
entre os países com ações concretas no âmbito
do Mercosul.
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