Material biodegradável
é feito a partir de plastificante e polímeros naturais
Uma
das alternativas para o acúmulo de lixo plástico,
que ocupa aproximadamente 20% do volume dos aterros sanitários,
é a produção de materiais biodegradáveis.
No Brasil, o uso deles ainda não se difundiu, pelo alto
custo da matéria-prima e pela dificuldade de se chegar
a um plástico resistente e flexível. Mas o pesquisador
da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), Rodrigo Baltieri, enfrentou o
desafio de misturar o amido, produto barato e comum no Brasil,
com o polihidroxibutirato (PHB), um polímero biodegradável
produzido por fermentação de bactérias.
A
blenda plástica desenvolvida pode ser usada na fabricação
de produtos termoformados, injetados, como vasinhos e tubetes
utilizados na agricultura. Mas ainda não há muita
aplicabilidade industrial, analisa a pesquisadora da FEQ Lucia
Innocentini-Mei. O PHB e o amido são substâncias
quimicamente diferentes e a dificuldade foi compatibilizar o sistema
para que ficasse homogêneo. “Era como se estivéssemos
misturando água e óleo”, exemplifica. Outra
barreira para a pesquisa foi a falta de referência para
que o estudo caminhasse. “No início do trabalho,
não encontramos artigos sobre o assunto”, relata.
Baltieri
conseguiu misturar 30% de amido ao PHB sem modificar as propriedades
físicas e mecânicas. O segredo do processo químico
está na dosagem e na escolha dos aditivos. O pesquisador
também se preocupou com os possíveis danos ambientais
causados em todas as etapas do processo; assim, o plástico
biodegradável, além de se decompor com mais facilidade
que os convencionais (derivados do petróleo), também
deve produzir compostos que não prejudiquem o meio ambiente
e o homem.
Ele
ainda explica que a redução de custo varia de acordo
com a quantidade de amido adicionado na formulação.
Não se obteve uma estimativa de preço do plástico,
porque esse não foi objetivo de sua tese defendida em novembro.
Mas espera-se que o produto final se torne mais acessível
ao bolso do consumidor, já que o amido é uma matéria
prima de custo relativamente baixo e existe em abundância.
O
pesquisador de biotecnologia do Instituto de Pesquisas Tecnológicas
(IPT), José Pradella, acredita que existe a tendência
de os polímeros biodegradáveis, como o PHB produzido
no Brasil, ficarem mais acessíveis na medida em que houver
aumento da produção. Apesar de o quilo dos biodegradáveis
valerem mais que o dobro dos convencionais (US$ 4 contra US$ 1,5,
aproximadamente), o pesquisador prevê que em médio
espaço de tempo o preço ficará competitivo.
Além
de ser feito a partir de recursos renováveis, em um período
de seis meses a um ano esses produtos devem ser transformados
em gás carbônico e água, fechando o ciclo
do carbono, enquanto uma garrafa de PET (politereftalato de etileno)
leva aproximadamente cem anos para se degradar. Isso significa
que materiais de fontes renováveis são naturalmente
decompostos pelos microorganismos do solo – se descartados
em ambiente natural e com ajuda de calor e umidade –, ao
contrário da maioria dos produtos sintéticos derivados
do petróleo, que permanecem no ambiente por muito mais
tempo.
Na
opinião de Pradella, a utilização desses
polímeros será mais eficiente nas áreas que
utilizam utensílios de descarte rápido, como frascos
de xampu, detergente, fertilizantes, inseticidas e fraldas descartáveis.
Além disso, os plásticos biodegradáveis possuem
compatibilidade com tecidos humanos, estendendo o seu emprego
na medicina, como no caso dos dispositivos de liberação
controlada de princípios ativos de medicamentos, por exemplo.
Professora
da FEQ/Unicamp e representante brasileira do Centro Internacional
para a Ciência e a Alta Tecnologia, (ICS/UNIDO, na sigla
em inglês), instituição que debate os problemas
sobre biodegradáveis e transfere tecnologia de primeiro
mundo para paises emergentes como o Brasil, Lúcia Innocentini-Mei
pretende fazer na FEQ testes com materiais para certificar se
eles são biodegradáveis, de fato. Embora considere
que o Brasil tenha grande chance de produzir a matéria-prima
biodegradável em grande escala e que os plásticos
biodegradáveis cumpram um papel ambiental importante, a
pesquisadora da FEQ afirma que eles não deverão
substituir os plásticos existentes no mercado. Isso porque
“eles dão emprego para muita gente por meio da reciclagem,
um processo exemplar, conhecido além de nossas fronteiras,
além de amenizar o problema social das camadas menos favorecidas”,
argumenta.
Indústria
Os polímeros biodegradáveis são raridade
nas casas dos brasileiros, mas o país já exporta
de 50 a 60 toneladas por ano de PHB para Europa, Japão
e Estados Unidos. Com a fermentação da cana-de-açúcar,
o IPT, a Copersucar e a Universidade de São Paulo (USP)
desenvolveram uma planta piloto de produção, a empresa
PHB Industrial. O plástico produzido ali serve de material
para embalagens, tubetes de reflorestamento (saquinho plástico
que envolve mudas de plantas) e diversas outras aplicações
baseadas na injeção.
Segundo
a empresa, a previsão é ampliar o projeto para uma
planta industrial com uma capacidade de duas mil toneladas em
2008. E há perspectiva de um aumento significativo na demanda
por plásticos biodegradáveis em todo mundo, principalmente
nos países europeus, Japão e Estados Unidos. A procura
por materiais biodegradáveis nesses países se intensifica
pelas leis que limitam o uso de plásticos comuns para embalagens
de alimentos.
O
PHB é obtido a partir de bactéria que usa o açúcar
(sacarose) para transformá-lo em plástico. Segundo
Pradella, pode-se também desenvolver polímeros a
partir de óleos vegetais (soja, milho) e outras materiais
como resíduos de esgoto e soro de leite.
Legislação
brasileira
A falta de leis que regulamentem o uso de biodegradáveis
é um dos motivos pelos quais não houve a expansão
da indústria nessa área, acredita Mei. O deputado
estadual do Rio Grande do Sul, Giovani Cherini (PDT), apresentou
um projeto de lei que propõe a substituição
e proibição de embalagens plásticas de alimentos,
bebidas e cosméticos à base de polietileno (componente
do saco de supermercado) ou polipropileno (PP, material de embalagens
de xampu). Redigido em maio de 2004, “o projeto está
engavetado, pelo receio de não haver produtos para substituir
o plástico convencional”, explica Cherini.
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