Falta
disciplina no uso de medicamento contra acne
A
isotretinoína é o composto ativo de medicamentos
para o tratamento de casos graves de acne. O seu uso pelas mulheres
requer medidas contraceptivas, pois a substância é
teratogênica, ou seja, pode causar má formação
fetal. No Brasil o tratamento depende de receita especial e assinatura
de termo de responsabilidade, no qual está explicito o
risco de má formação fetal e a necessidade
de uso de dois métodos contraceptivos. Mesmo assim, desde
que foi autorizado para venda na década de 1990, mais de
250 bebês nasceram com deformações na face,
orelhas, coração e sistema nervoso, devido ao uso
do medicamento. De 1998 a 2003, só no estado de São
Paulo foram registrados 145 casos de efeitos colaterais, 14 deles
relacionados à gravidez. A falta de disciplina durante
o tratamento também existe nos países de primeiro
mundo.
Estudo
publicado em outubro no periódico Wiley Interscience
mostrou que os programas de contracepção nos Estados
Unidos e recomendados pela agência reguladora de alimentos
e medicamentos Food and Drug Administration (FDA) não são
seguidos por todas as pacientes. Coordenado pela pesquisadora
Julia Robertson, do departamento de Saúde de Utah, em Salt
Lake City, o estudo envolveu 34 das 109 mulheres que procuraram
o serviço de informações em teratologia (OTIS,
Organization of Teratology Information Service), entre 2002 e
2004, alegando gravidez durante o tratamento.
A
maioria dessas mulheres (76%) disse não ter realizado dois
testes de gravidez antes de iniciar o tratamento, 35% dela não
fizeram teste mensal de gravidez, e pouco mais da metade assinou
o termo de ciência quanto aos riscos a que submeteriam o
feto, em caso de gravidez – recomendações
básicas da FDA. Além disso, a maioria apresentava
casos de acne leve, sem necessidade real de uso desse remédio.
Segundo a pesquisadora, a baixa participação das
mulheres na pesquisa já era esperada, porque estudos anteriores
mostraram que 72% das mulheres que têm exposição
fetal à isotretinoína preferem interromper a gravidez
e não se dispõe a participar de qualquer pesquisa.
A
partir de 2006, a venda do medicamento ficará mais rigorosa
nos Estados Unidos. Com a implantação do programa
Ipledge, anunciado no fim de outubro pela FDA, será criado
um banco de dados para registrar fabricantes, médicos e
pacientes, além de uma linha telefônica para dar
mais segurança ao tratamento.
No
Brasil, o medicamento só é vendido nas farmácias
autorizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa). A substância está na lista do Programa
de Dispensação em Caráter Excepcional, que
engloba remédios para mais de 100 problemas crônicos,
como osteoporose, asma, insuficiência renal e hepatite.
Em clínicas particulares, seis meses de tratamento chegam
a custar quase R$ 2,5 mil. Em 2004, o Ministério da Saúde
financiou para a rede pública mais de três milhões
de cápsulas de isotretinoína, a um custo de R$ 7,5
milhões. Para 2005, esse valor foi estimado em R$ 10 milhões.
Para se conseguir o tratamento pelo SUS, a burocracia é
maior, dependendo da disponibilidade de verba e, em alguns casos,
exige-se até aprovação judicial.
A
Anvisa, não tem controle dos medicamentos que foram efetivamente
utilizados, nem da utilização de métodos
contraceptivos pelas mulheres que se submetem a essa terapêutica.
O governo federal distribui anticoncepcionais, o que, em tese,
possibilita a contracepção das pacientes de baixa
renda. Para o dermatologista e pesquisador da Universidade Federal
de Juiz de Fora, em Minas Gerais, Aloisio Gamonal, os casos de
gravidez durante o tratamento acontecem em sua maioria porque
os usuários permitem que suas parceiras, colegas e irmãs
façam uso do medicamento, sem a orientação
adequada. “Os médicos também não enfatizam
com rigor os problemas [colaterais]”, diz.
Mais
de três milhões de jovens sofrem com a acne no Brasil.
Porém, medicamentos à base de isotretinoína
só devem ser utilizado em casos graves. Homens e mulheres
devem estar conscientes de que o tratamento pode causar depressão,
problemas no fígado, incômodos digestivos, reincidência
de acne, ressecamento labial e das mucosas nasal e ocular, queda
de cabelo, sangramento nasal, dores de cabeça, além
de aumento do colesterol e triglicérides. Todos esses efeitos
colaterais desaparecem com o fim do tratamento.