Índios
do Parque Nacional do Xingu aprendem produção de
própolis
Equipe se prepara para manipular abelhas.
Foto: Bruno Albarello
Durante
a última semana de outubro, índios Juruna e Caiapó
da aldeia Piaraçu, no Parque Nacional do Xingu, em Mato
Grosso, aprenderam técnicas de produção de
própolis, um medicamento natural produzido por abelhas.
O curso foi organizado pela ONG Amazon Rainforest Foundation
Japan (ARFJ), que trabalha em parceria com as administrações
regionais da Fundação Nacional do Índio (Funai)
e levou para o Xingu os especialistas em própolis Mendelson
Guerreiro de Lima e Hisashi Zaitsu. Paulo Pinagé, representante
da ARFJ no Brasil, afirma que em até dois anos a ONG pretende
exportar mel, própolis e derivados produzidos pelos índios
para o Japão, primeiramente, e outros países.
Caixas para criação de abelhas.
Foto: Mendelson de Lima
A
produção de mel na aldeia foi instituída
há cerca de um ano pela Funai, que forneceu 15 caixas para
abrigar colmeias e construiu uma casa com equipamento para extrair,
manipular e armazenar o mel. No entanto, Pinagé lamenta
que esse projeto tenha sido estabelecido sem apoio técnico,
o que resultou em uma produtividade baixa e de pouca qualidade.
Além disso, o representante da ARFJ diz que as instalações
fornecidas pela Funai não atendem a padrões sanitários
e terão que ser refeitas. O objetivo da ONG é renovar
o equipamento e implantar uma assessoria técnica continuada
de forma a melhorar técnicas de manejo e incrementar a
produtividade. A assessoria continuada possibilitará a
produção de mel com alto padrão de qualidade
e assepsia, para então exportá-lo. Mendelson de
Lima, professor de apicultura do Centro Universitário da
Fundação de Ensino Octávio Bastos (Unifeob),
em São João da Boa Vista (SP), pretende receber
representantes da tribo nos apiários da universidade para
demonstrar suas técnicas de produção de mel
e própolis de forma mais aprofundada.
Própolis
A iniciativa de aprender a produzir e manipular própolis
partiu de Akan Juruna, responsável pelo manejo das abelhas
e pela produção de mel na aldeia. Segundo ele, seu
filho curou-se de graves queimaduras nas pernas graças
à aplicação de pomada do medicamento produzido
pelas abelhas, após três meses de tratamento infrutífero
em um hospital de Brasília. O apicultor Lima explica que
a própolis tem propriedades antimicrobianas, antitumorais,
anticáries, analgésicas, antifúngicas e antiprotozoárias,
entre outras. Os extratos e pomadas à base de própolis
produzidos durante o curso foram imediatamente postos à
disposição da comunidade em sua farmácia.
Além
do aspecto medicinal da própolis, a implantação
de projetos de apicultura tem grande importância em introduzir
práticas de uso sustentável da floresta. Prática
que atende as prioridades do líder indígena Megaron
Txucarramãe, que dirige a Administração Executiva
Regional de Colider, braço da Funai na região, que
visa o desenvolvimento de atividades que evitem o desmatamento.
Durante a sua estadia na aldeia Piaraçu, Lima presenciou
a derrubada de uma árvore para que uma colmeia fosse coletada
para o apiário. Ele, então, ensinou Akan Juruna
a técnica para se dividir uma colônia e formar duas,
mostrando não ser necessário derrubar árvores
para retirar abelhas da natureza. “Se eles aprenderam isso,
minha viagem já terá valido a pena”, comemora.
Abelhas
nativas
As abelhas utilizadas no projeto são conhecidas como abelhas
africanizadas, de nome científico Apis mellifera.
Elas ocorrem naturalmente em todo o território brasileiro,
mas são na verdade um híbrido entre abelhas de origem
européia e africana. Outros projetos de manejo e produção
de mel em andamento envolvem abelhas nativas sem ferrão
da família Melliponinae, por isso são chamados
“meliponários”.
O
geneticista especialista em abelhas Warwick Kerr, do Instituto
Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), está envolvido
em projetos de implantação de meliponários
em áreas rurais de Minas Gerais e da Amazônia. Em
palestra durante o 51º Congresso Brasileiro de Genética,
em setembro deste ano, Kerr afirmou que tais iniciativas são
essenciais como medida de conservação para as espécies
de abelhas nativas, já que a criação de abelhas
em cativeiro minimiza a destruição de colônias
para coleta do mel. O pesquisador afirma que as abelhas têm
uma função crucial no ecossistema, pois são
específicas quanto às plantas que visitam. Por esse
motivo, a extinção de espécies pode causar
deficiências na polinização e, portanto, na
reprodução de espécies vegetais.
As
abelhas sem ferrão produzem mel em menor quantidade do
que as abelhas africanizadas, mas o produto é muito saboroso
e com excelentes propriedades de preservação. Por
isso, a produção dos meliponários atende,
sobretudo, ao consumo próprio, mas quando vendida, atinge
preços vantajosos. Segundo Kerr, os meliponários
implantados por seu projeto são mantidos, principalmente,
por mulheres e crianças. A coleta do mel nessas comunidades
é um trabalho coletivo, que aumenta a socialização
e incentiva a troca de informações.