Evento
ressalta incertezas sobre
mudanças climáticas
A necessidade de evidenciar à sociedade, especialmente
aos tomadores de decisão, as incertezas inerentes aos modelos
de previsão de mudanças climáticas foi um
dos assuntos da “II Conferência Regional sobre Mudanças
Globais: América do Sul”, realizada entre 6 e 10
de novembro, em São Paulo. O evento reuniu pesquisadores
de vários países para apresentar o panorama atual
das pesquisas sobre mudanças climáticas no continente
sul-americano e discutir uma agenda de investigações
futuras.
Entre
os participantes da conferência, Walter Baethgen, do Instituto
de Pesquisa para Previsão Climática, dos Estados
Unidos, foi um dos que mais defendeu a importância de se
destacar na interação entre geradores e usuários
dos modelos não só os cenários futuros previstos,
mas também o grau de incerteza associado a cada um deles.
“Um problema sério de comunicação científica
é que os resultados das pesquisas são apresentados
de modo extremamente simplificado”, criticou Baethgen. “Isto
é um risco muito grande, pois os usuários dos modelos,
incluindo tomadores de decisão e os próprios cientistas,
os entendem como cenários verdadeiros”, advertiu.
O pesquisador lembrou que as incertezas podem ser tão grandes
que, em alguns casos, diferentes modelos aplicados para uma mesma
região podem apresentar previsões completamente
opostas em relação, por exemplo, a aumentos ou diminuições
de temperatura e chuva.
A
existência de tanta incerteza, no entanto, não significa
que os modelos não sejam úteis. “A modelagem
é a única forma para poder fazer previsões
de como poderá ser o clima no futuro”, ressalvou
José Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE). As incertezas das previsões têm várias
origens: compreensão ainda limitada da dinâmica atmosférica
e de sua relação com as dinâmicas hidrológica
e dos ecossistemas, a partir das quais são baseadas as
equações matemáticas para funcionamento dos
modelos; imprecisões e lacunas no registro dos dados climáticos
do passado (histórico e geológico), que servem como
ponto de partida para as projeções sobre o clima
futuro; e o próprio caráter probabilístico
das análises estatísticas a que os dados são
submetidos.
No
caso dos modelos que buscam avaliar os impactos das mudanças
climáticas em determinado setor (como agricultura, saúde
ou ecossistemas naturais), a maior dificuldade refere-se às
projeções de como será o cenário socioeconômico
futuro, que é determinante para se tentar prever, por exemplo,
os níveis de emissão de gases de efeito estufa e
mudanças no uso das terras. “Isto faz com que os
modelos tenham um grande grau de imprecisão, pela própria
natureza das incertezas sobre as tendências de crescimento
da economia mundial”, apontou o pesquisador Weber Amaral,
da Universidade de São Paulo (USP).
Segundo
Baethgen, todas essas limitações não podem
ser ignoradas quando os resultados das previsões de mudanças
climáticas e seus impactos são apresentados aos
tomadores de decisão para subsidiar suas ações
de planejamento. “Se realmente um dos objetivos do trabalho
científico é ter algum impacto social, os resultados
devem ser expressos de maneira bem inteligível e destacando
sempre a medida da incerteza associada, que é a característica
mais importante de qualquer pesquisa em mudança climática”,
destacou o pesquisador norte-americano. Essa também foi
a opinião de Marengo. “Temos que qualificar as incertezas
e inseri-las na informação, indicando qual o grau
de confiabilidade da previsão climática fornecida
pelo modelo”, defendeu.
De
acordo com o pesquisador do INPE, essa preocupação
está presente no projeto “Cenários Climáticos
Regionalizados de Mudanças Climáticas para América
do Sul” (CREAS), por ele coordenado. Segundo Marengo, o
projeto leva em conta que as previsões atualmente disponíveis
são pouco precisas, e o objetivo é usar modelos
que forneçam aos tomadores de decisão cenários
futuros mais detalhados – acompanhados de suas respectivas
incertezas – sobre mudanças climáticas e seus
impactos para diferentes regiões do continente sul-americano.
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