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Maior projeto de raios cósmicos do mundo completa 10 anos

Tanque de detecção de raios cósmicos que compõe o Observatório Auger na Argentina. Foto: Divulgação

O Observatório Pierre Auger celebra seus 10 anos neste mês, reunindo cientistas de todo o mundo em sua sede, em Malargüe, na Argentina. O evento é parte das comemorações do ano mundial da física. Em agosto foram apresentados os primeiros resultados do projeto, o maior estudo voltado para os raios cósmicos do mundo, em um consórcio que envolve 15 países, incluindo o Brasil. São muitos os motivos para celebração, dentre eles: evidências de que as novas técnicas proporcionam a coleta de dados valiosos, o estabelecimento de parcerias com empresas e a formação de recursos humanos na área. Mas há, também, razões para cautela: só se esperam para daqui a alguns anos as respostas para questões como a existência ou não do corte GZK (Greisen-Zatsepin-Kuzmin) ou a localização do Big Bang no espaço e no tempo.

A rede de detectores que compõem o Observatório Pierre Auger só deve estar completa em 2006, mas já ultrapassou a capacidade do equivalente japonês, o Akeno Giant Air Shower Array (AGASA, sigla em inglês para Rede Gigante de Chuveiro Atmosférico de Akeno). É o maior detector que jamais operou na história da física de radiação cósmica, afirma Carlos Escobar, coordenador brasileiro do projeto. Quando estiver concluído, o Auger contará com 24 telescópios de luz fluorescente e outros 1600 detectores (tanques), cobrindo uma área de 3 mil quilômetros hoje há 18 telescópios e 800 detectores em funcionamento. Em breve, o Observatório deverá esclarecer um dos maiores enigmas da física contemporânea: a natureza, a origem e o espectro dos raios cósmicos de altas energias (a partir de 1019 eV - eletro volts), questões que por sua vez remetem à origem do universo, como a idade e o local em que teria ocorrido o Big Bang explosão com a qual teria nascido o universo entre 13 e 15 bilhões de anos atrás.

Descobertos no início do século passado, os raios cósmicos chegam de todas as regiões do céu, numa freqüência que diminui conforme aumenta a energia. Ao colidirem com átomos da atmosfera, como o oxigênio e o nitrogênio, geram novas partículas. Muitas delas voltam a colidir com outros átomos do ar, levando à formação de outras partículas, fenômeno conhecido como chuveiro atmosférico (veja animação). Mas o que mais intriga os físicos é o fato de que, mesmo depois de uma longa jornada cósmica, essas partículas atingem a superfície terrestre com energia equivalente à de uma bola de tênis impulsionada pela raquete do tenista. Eles também não sabem ainda se raios com energia superior a 5 x 1019 eV chegam à Terra ou são absorvidos no caminho. Este número representa o corte Greisen-Zatsepin-Kuzmin (GZK), cuja existência os pesquisadores do Auger esperam confirmar ou refutar com os dados obtidos. “Em médio prazo, deveremos esclarecer se existe ou não o famoso corte GZK, determinar a existência ou ausência de fontes localizadas responsáveis pelos raios cósmicos de energias muito elevadas e quiçá teremos as primeiras indicações da composição desses raios cósmicos”, acredita o coordenador da colaboração brasileira.

O Brasil se destaca na história dos raios cósmicos de altas energias, campo que deflagrou as pesquisas em física no país. Entre as descobertas brasileiras mais importantes está o méson-pi, a primeira partícula subatômica, descoberta em 1947 pelo físico César Lattes, que modificou a compreensão da estrutura da matéria — antes comprovadamente formada apenas por prótons, nêutrons e elétrons. Por meio do Auger, o coordenador da colaboração brasileira acredita que haverá um rejuvenescimento da física de raios cósmicos. “O projeto retoma essa tradição e a amplia, trazendo para ela físicos que trabalham em aceleradores e em física nuclear; novas instituições [como é o caso do IAG-Usp, UFBA, UEFS e UESB]; aumentando o número de pós-graduandos”.

Universidade-Empresa
Outro aspecto positivo que o Projeto Auger tem levantado é a relação universidade-empresa, fortalecendo a cultura de parceria entre a academia e o setor produtivo. Escobar lembra que, desde o início, por iniciativa do Brasil, fixou-se que um mínimo de 80% do total de recursos que um país coloca no projeto deve ser gasto no próprio país, beneficiando o sistema produtivo local. Isto tem sido obedecido, conta, e a interação com as indústrias tem trazido benefícios para estas que tem que fornecer produtos sujeitos a um controle de qualidade muito mais estrito que o exigido por clientes habituais”. Até agora, o país contou com a participação de fábricas de lentes, em Indaiatuba (SP), e de tanques, em São Paulo (SP) e Carazinho (RS), que compõem a infraestrutura do Observatório Auger. Da mesma forma, a iniciativa tem favorecido a Argentina e o México.

Uma outra unidade do Observatório Pierre Auger, cuja sede ficará no Colorado, EUA, como foi decidido recentemente, deve estar concluída até 2012, caso os esforços para financiá-lo se concretizem. O Auger do Norte pretende aplicar o conhecimento acumulado sobre essas partículas, aprimorando a coleta de dados, ampliando a cobertura do céu e dando mais elementos para a descoberta de uma possível nova física. “Até que esteja clara a questão científica da necessidade de um sítio Norte, o que deverá vir após alguns anos de coleta de dados com o Observatório Sul, não deveríamos nos empenhar tanto na construção do sítio norte”, afirma Escobar.

O principal desafio para a colaboração brasileira, após o término da construção do Observatório, será garantir recursos suficientes para manter a infraestrutura montada e a equipe de pesquisadores. Até este momento o país contribuiu com aproximadamente US$ 3,5 milhões, dos cerca de US$ 50 milhões já investidos, vindos do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Atualizado em 18/11/05
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