Para
especialista, Brasil é e vai continuar tecnologicamente
dependente
Parece que determinações e regras quanto à
posse de patentes de medicamentos fazem parte de uma realidade
distante do cotidiano brasileiro. Porém, se tornam mais
próximas quando se depara com o fato de que uma única
empresa é detentora da patente do único medicamento
que poderia reduzir a intensidade da ação da forma
humana da gripe aviária e ainda evitar infecções.
Em caso de uma grande epidemia, essa empresa poderia faturar bilhões
vendendo o produto. Isso se, realmente, conseguisse atender a
toda a demanda.
Refletindo sobre este tema, a pesquisadora da Fundação
Oswaldo Cruz (Fiocruz) do Ministério da Saúde, Claudia
Chamas, especialista em propriedade intelectual, afirma que o
Brasil está em situação deficitária
no que se refere ao desenvolvimento de inovações
que contemplem a área de saúde. “Como o Brasil
não detém tecnologia, precisa importar os produtos.
Dessa forma, a balança comercial do setor é extremamente
deficitária”, afirma. Dados do Ministério
da Saúde mostram que o déficit comercial brasileiro
no setor de fármacos e medicamentos é de aproximadamente
US$ 3,5 bilhões.
Para Claudia, falta ao país a adoção de políticas
públicas consistentes e de longo prazo que possam alavancar
o número de inovações na área de fármacos.
Ela acredita que, também por falta de políticas
públicas, o país seja ineficiente na atração
de investimentos privados para o setor. Como o país investe
pouco, a dependência tecnológica cresce à
medida que as inovações são mundialmente
geradas. Uma saída seria o Brasil estabelecer prioridades
dentro do setor de fármacos e medicamentos e investir maciçamente.
Mesmo considerando-se otimista, Cláudia diz não
observar indícios de que a situação de dependência
tecnológica no setor de fármacos irá se reverter
em curto prazo.
De acordo com a pesquisadora, um dos argumentos utilizados pelas
empresas para não investirem no Brasil era a falta de uma
legislação que protegesse as criações.
Com a entrada em vigor da Lei 9.279, de 1996, a Lei de Propriedade
Intelectual, os produtos farmacêuticos tornaram-se passíveis
de patenteamento. Mesmo com a lei, o volume de inovações
geradas pelo setor privado ainda é muito pequeno, avalia.
O outro lado
A consultora de propriedade intelectual, Leila Cabral, da InfoConnection,
acredita que o volume é pequeno porque os empresários
brasileiros estão “acordando” para a necessidade
de criar inovações para o setor de fármacos.
Ela argumenta que a legislação que protege os inventos
farmacêuticos tem menos de 10 anos, período considerado
curto para a elaboração de pesquisas e criação
de medicamentos no setor de saúde. “Para a inovação
em medicamentos precisamos de cinco a oito anos em média.
Para depósito da patente outros cinco”, contabiliza.
Leila acrescenta que o volume de investimentos
para inovação no setor de fármacos é
alto e de risco. Esses fatores seriam responsáveis pela
cautela dos empresários quanto à aplicação
de recursos de grande monta. Para ela, a decisão de investir
mais ou menos em inovações passa pela demanda pelos
produtos, nichos abertos de mercado e retorno financeiro alcançado
com determinado investimento.
País faz pesquisa, mas não
gera inovação
Quanto à pesquisa em si, Cláudia ressalta que o
Brasil tem capacidade instalada para realização
de trabalhos importantes na área de saúde. Atualmente
as maiores responsáveis por essas pesquisas no país
são as instituições públicas, apoiadas
com recursos governamentais. Mesmo assim, o número de pesquisas
é peque e, além disto, existe uma desconexão
entre as pesquisas realizadas e a utilização desses
conhecimentos, observa. Para ela, a solução desse
hiato entre o que as instituições de pesquisa criam
e aplicação dos conhecimentos gerados será
possível quando uma gestão tecnológica estratégica
for adotada.
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