UFSCar
traz projeto Common Sense do MIT ao Brasil
Imagine um
cenário em que seu computador pessoal conheça seus
hábitos e preferências a ponto de sugerir qual o
melhor presente de aniversário para um amigo, ou que saiba
quais assuntos você deve estudar mais. Não seria
muito prático? Para tornar esse cenário possível,
pesquisadores do mundo todo estão unidos no projeto Open
Mind Common Sense Multilingual, trabalhando um conceito que
começou no MediaLab do Instituto de Tecnologia de Massachussets
(MIT), nos Estados Unidos, e foi trazido ao Brasil pelo Laboratório
de Interação Avançada (LIA) da Universidade
Federal de São Carlos (UFSCar), para que uma versão
brasileira do projeto seja desenvolvida.
Embora muitos cientistas acreditem que senso comum e ciência
sejam incompatíveis, esses pesquisadores pretendem que
a partir do conhecimento do mundo, de fatos do dia a dia e de
valores culturais, os computadores possam se tornar mais amigáveis
e também mais úteis para o homem em seu cotidiano,
como por exemplo, no preparo de uma aula. Segundo Júnia
Coutinho Anacleto Silva, coordenadora do LIA, os computadores
de hoje não conseguem pensar coisas simples, tais como
as que uma criança de três anos é capaz de
pensar. E um dos fatores para isso é que eles não
possuem informações básicas sobre o mundo,
como a de que o céu é azul durante o dia e escuro
à noite.
A proposta é a de se formar um banco de dados com essas
informações a partir de contribuições
de voluntários pela Internet. Para isso, um site
foi disponibilizado pelo LIA, onde qualquer internauta pode colaborar
com o projeto, oferecendo seu conhecimento. Depois de se cadastrar
no site, a pessoa responde a perguntas simples, como “O
que se pode encontrar no supermercado?” ou, “Deslocar-se
é sinônimo de?”, e pode, então, passar
a fazer contribuições sempre que quiser.
As respostas passam pela aprovação dos pesquisadores,
que excluem palavrões, erros de grafia, e conjuntos de
caracteres sem sentido. Nessa fase, a verificação
das respostas está sendo feita manualmente pelo grupo.
Depois de aprovadas, as respostas fornecidas pelos usuários
são usadas para retroalimentar o sistema, ou seja, compor
novas frases que serão usadas para conseguir novos dados.
Em operação desde setembro de 2000, nos Estados
Unidos, foram coletados 750 mil fatos para a base de dados do
projeto. No Brasil, com um mês de operação,
o site já coletou 64 mil.
O que o laboratório brasileiro está se propondo
a fazer é observar as diferenças de senso comum
entre o Brasil e outros países, além das diferenças
entre as próprias regiões do país. “Nós
acreditamos que as diferenças culturais são muito
importantes, por isso é tão necessária a
participação de pessoas de diversos lugares do país”,
explica a pesquisadora. A coleta tornou-se uma corrida de quem
contribui mais. Há uma lista no site divulgando as cidades
e pessoas que mais contribuem e há participantes de todas
as faixas etárias. “O cadastrado mais novo tem oito
anos, e entre os mais velhos há um senhor de 64, que é
um dos participantes mais assíduos”, acrescenta.
“As aplicações dessa base de dados são
muitas”, explica Júnia Silva. O banco de dados pode
ajudar a comunicação entre pessoas de diferentes
culturas e idiomas de várias formas. Seria possível,
por exemplo, melhorar os sistemas de tradução simultânea
e a comunicação escrita, porque munido de conhecimento
de senso comum, o tradutor pode ir além de traduzir as
palavras, inserindo-as no contexto do usuário e fazendo
sugestões. “Ao fazer um convite por e-mail para uma
pessoa de uma outra cultura, o banco de dados pode contribuir
informando quais são as preferências e horários
no país do convidado”, exemplifica a professora da
UFSCar.
As aplicações invadem até mesmo funções
lúdicas. Uma delas é o Common Sense Disk Jockey
(CSDJ), um assistente de DJ que usa o banco de dados de senso
comum para ajudar a escolher a música mais adequada para
um público específico. Uma câmera conectada
ao aplicativo captura imagens do público. O CSDJ observa
essa imagem e a partir do banco de dados de senso comum busca
entender quem são as pessoas e como elas estão vestidas,
para fazer a sugestão de seleção musical
que melhor se aplicaria a esse público específico.
Além disso, o aplicativo também é capaz de
aprender, e pode trocar a seleção se a resposta
do público à música não for positiva.
O destaque no trabalho brasileiro é a coleta de informações
sobre saúde, que terão como finalidade montar um
curso de enfermagem a distância. O questionário aborda
questões sobre tratamento de doentes em domicílio,
como: “Estar saudável ajuda no cuidado da pessoa
doente porque...", ou "Para se tratar de uma pessoa
doente em casa é preciso...". Os pesquisadores afirmam
que com o acesso ao que é conhecimento comum sobre o tema,
pode-se apoiar os professores no ensino, adequando o conteúdo
ao conhecimento prévio dos alunos e possibilitando o uso
de uma linguagem mais comum entre professor e aluno, o que acarretaria
a otimização do tempo de preparação
e exposição do material. Júnia Silva afirma
que o banco poderá futuramente ser usado também
para o apoio direto aos alunos, para busca de informações
e montagem do conteúdo de acordo com o perfil de cada um.
Esses são exemplos de aplicações que podem
ser alcançadas em pouco tempo, entretanto há pesquisadores
que vislumbram um uso mais sofisticado desse banco de dados em
um futuro um pouco mais distante. O prospecto dos pesquisadores
de inteligência artificial é de que em 30 anos já
será possível comprar um computador que tenha uma
percepção do mundo parecida com a dos homens, ou
seja, computadores reflectivos, que não só saibam
somar e subtrair, mas também entendam o que é um
número. E, principalmente, que reflitam sobre o porquê
algum processo está errado, ao invés de simplesmente
substituir o método que originou o erro. Nesse momento
estaremos próximos de ter máquinas tão criativas
como os seres humanos.