Aterro
sanitário sai na frente no mercado de créditos de
carbono
No
dia 15 de setembro, a Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F)
e o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio
lançaram na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro o Banco
de Projetos, para organizar negociações futuras
de crédito de carbono no Mercado Brasileiro de Redução
de Emissões. Iniciativas como essa já existem em
bolsas como a de Joanesburgo, na África do Sul, mas é
inédita na América Latina. A bolsa carioca ainda
precisa submeter a regulamentação das operações
à Comissão de Valores Mobiliários do Banco
Central para negociar créditos de carbono no pregão,
mas os investidores internacionais já podem manifestar
interesse de compra entre os projetos de redução
de gases do efeito estufa. O primeiro a entrar no Banco de Projetos
é o do aterro sanitário Anaconda, situado em Santa
Isabel, na região metropolitana de São Paulo.
Com
pouco mais de cinco anos em operação, o aterro sanitário
Anaconda tem uma área total de 42 alqueires, dos quais
20 são usados como depósito de lixo, que recebe
em média 419 toneladas de dejetos por dia. A decomposição
do lixo depositado produz um biogás que tem o metano (CH4)
em sua composição. “Nos moldes do Protocolo
de Quioto, o metano é considerado 21 vezes mais nocivo
que o carbono, no que se refere ao efeito estufa”, afirma
o engenheiro Nino Sergio Bottini, diretor técnico da Araúna
Participações e Investimentos, empresa voltada para
o meio ambiente. A Araúna é responsável pela
concepção do Projeto de Gás do Aterro Anaconda,
validado pela Det Norske Veritas, instituição
norueguesa credenciada pela Califirnonian Climate Action Registry,
dos Estados Unidos e pela UK Emissions Trading Scheme,
do Reino Unido.
De
acordo com o Inventário Nacional de Emissões de
Gás de Efeito Estufa realizado pela Companhia de Tecnologia
de Saneamento Ambiental (Cetesb) antes da concepção
do projeto Anaconda, o Brasil tem mais de seis mil depósitos
de lixo, que recebem acima de 60 mil toneladas de lixo por dia.
Esse levantamento aponta que 84% das emissões de metano
no país resultam de lixo expostos em depósitos sem
controle e 76% do lixo produzido no Brasil vai para depósitos
que não realizam captura de gás nem controle ou
tratamento de águas subterrâneas próximas
aos depósitos.
A
atual legislação brasileira, embora não obrigue
a queima do biogás, exige o uso de drenos de gás
nos aterros sanitários. “São tubos providos
de orifícios que vão do fundo do aterro até
sua superfície, de forma que parte do biogás gerado
(aproximadamente 20%) seja drenado do interior do aterro para
a superfície”, explica Bottini. “O biogás
drenado é liberado na atmosfera, e para evitar os odores
e algum risco de explosão, queima-se o biogás na
boca dos drenos”, completa. O projeto Anaconda, programado
para iniciar em janeiro de 2006, prevê investimentos nos
sistemas de captura de gás que irão enclausurar
as bocas dos drenos e dirigir o biogás para um incinerador
através de uma rede de tubos, após a sua sucção
por meio de compressores.
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Drenos
do aterro Anaconda. Crédito: divulgação. |
Esse
processo tem por objetivo otimizar a decomposição
do lixo e elevar a eficiência na queima do metano, o que
contribuirá para aumentar o tempo de vida útil do
aterro, que geralmente é de no máximo 20 anos. A
primeira etapa do projeto tem duração de sete anos,
mas já está prevista uma renovação
pelo dobro do tempo, e a Araúna estima que a durabilidade
do local se estenda até 2030. “O projeto Anaconda
espera, no mínimo, queimar o equivalente a 840.804 toneladas
de CO2 equivalentes (tCO2e) até 2012”, avalia o diretor
técnico da empresa. A tCO2e é a medida métrica
usada para comparar as emissões de vários gases
do efeito estufa, com base no potencial de aquecimento global
de cada um. O dióxido de carbono equivalente (CO2e) é
o resultado da multiplicação das toneladas emitidas
de gás do efeito estufa pelo seu potencial de aquecimento
global.
O
mercado de carbono
O artigo 12 do Protocolo de Quioto, que passou a vigorar em fevereiro
deste ano, propõe como Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
que cada tonelada de CO2 equivalente (tCO2e) que deixar de ser
emitida ou for retirada da atmosfera por um país em desenvolvimento,
como o Brasil, poderá ser negociada no mercado mundial
através da venda de Reduções Certificadas
de Emissões (RCEs), validadas por uma Entidade Operacional
Designada reconhecida pela ONU. Essas RCEs poderão ser
adquiridas por empresas de países desenvolvidos que não
conseguirem ou não desejarem reduzir suas emissões
de gases de efeito estufa, mas apenas uma parcela dos compromissos
de redução pode ser abatida pelo uso desses certificados.
A
estimativa da cotação média das RCEs é
de US$ 5 por tonelada de CO2 equivalente, o que proporcionaria
à Araúna uma arrecadação de cerca
de US$ 4,2 milhões nos primeiros sete anos do projeto Anaconda,
ou o equivalente a mais de R$ 1,3 milhão por ano até
2012. Mas para o Mercado Brasileiro de Redução de
Emissões, esse valor ainda é especulativo. “Quanto
será arrecadado é função de uma condição
de mercado que ainda não temos como avaliar com razoável
precisão”, diz Bottini. O projeto prevê a doação
de 2% do valor arrecadado com a venda de RCEs para atividades
das comunidades próximas ao aterro. “Os projetos
que beneficiarão as comunidades serão discutidos
com o poder público e as associações locais,
de forma a atender parte de suas reais necessidades”, conclui.
Estados
Unidos
Apesar de o governo de George W. Bush ter se negado a assinar
o Protocolo de Quioto, alegando que as metas impostas de redução
de emissões de gases do efeito estufa comprometeriam a
economia do país, um movimento
encabeçado por prefeitos de grandes cidades dos Estados
Unidos atua na mobilização para o cumprimento e
até mesmo a superação dessas metas. Mesmo
não sendo um consenso entre os pesquisadores, trabalha-se
com a hipótese de que os atuais acidentes naturais sofridos
pelo país (os furacões Katrina e Rita) sejam decorrentes,
em parte, das mudanças climáticas causadas pelo
efeito estufa.