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Cientistas brasileiros discordam de avaliação internacional de anfíbios ameaçados de extinção

Pesquisadores da União Mundial para a Natureza (UICN) apontaram o Brasil como detentor de 110 espécies de anfíbios ameaçadas de extinção, mas especialistas brasileiros reivindicam a inclusão de somente 24. A discrepância se deve em parte à adição, na lista internacional, de espécies que contam com pouca informação científica. “Muitos dos animais que eles dizem estarem ameaçados são, na nossa experiência, muito comuns”, afirma Célio Haddad, do departamento de Zoologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro. A controvérsia foi publicada na edição de hoje da revista científica Science.

Um levantamento oficial das espécies ameaçadas no Brasil foi promovido pelo Ministério do Meio Ambiente e coordenado pela Fundação Biodiversitas, o que resultou na Lista da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. Sugestões de 18 especialistas foram analisadas por um grupo coordenado por Haddad. Ao invés de utilizar essa lista, a Avaliação Global de Anfíbios (GAA, sigla em inglês) promoveu outro encontro de especialistas brasileiros, chegando a uma outra relação de animais ameaçados que difere da lista nacional. A partir deste levantamento, outras alterações foram feitas para garantir a coerência de critérios entre os bancos de dados das diferentes regiões e que resultariam na análise publicada por Simon Stuart e colaboradores no final de 2004 na Science (306, no 5702).

Segundo os critérios da UICN, quando uma espécie tem distribuição circunscrita ou não é encontrada por um longo período, ela pode ser classificada como ameaçada. Na Mata Atlântica é comum acreditar que os anfíbios estão intrinsecamente ameaçados, visto que foram coletados em áreas restritas e 92% do bioma já foi destruído. No entanto, Haddad diz que a maior diversidade biológica se concentra em áreas mais acidentadas, menos adequadas à ocupação humana. Além disso, a adaptação dos anfíbios a microclimas específicos não significa que sua distribuição seja restrita, pois uma espécie pode ocorrer em diversas áreas, desde que se procure no ambiente adequado.

A preocupação específica com extinção de anfíbios é justificada, uma vez que esses animais são considerados indicadores biológicos de áreas a serem preservadas. No Brasil eles causam preocupação, pois sua diversidade é alta, sobretudo na Mata Atlântica, onde há altos índices de endemismo (espécies restritas ao bioma).

Rãzinha-da-praia incluída na lista de anfíbios ameaçados de extinção apesar de ser abundante no Brasil. Foto: Célio Haddad

Stuart explica que há duas perspectivas possíveis ao definir-se espécies ameaçadas: uma baseada em evidência e outra em precaução. A primeira estratégia, que só inclui na lista espécies para a qual se tenha informações claras sobre seu estado de conservação, corre o risco de omitir espécies que poderiam extinguir-se antes que se detecte seu declínio. Por outro lado, a precaução pode levar ao exagero. Segundo o especialista, a UICN prefere adotar uma atitude “de precaução, porém realista”.

Embora essa postura seja cautelosa e pode incitar à proteção dessas espécies, os especialistas brasileiros discordam dela. Haddad alerta que a inclusão de espécies em “listas vermelhas” não pode ser feita às cegas, pois sua aparente escassez reflete, principalmente, falta de estudo em campo. Um exemplo é a rãzinha-da-praia (Physalaemus atlanticus), na lista de anfíbios ameaçados, mas que é bastante comum ao longo da costa da região Sudeste (de Santos até Parati), tanto em áreas preservadas como alteradas. A espécie só foi descrita em 2004 e o pouco conhecimento científico acabou, de acordo com Haddad, refletindo uma condição irreal de conservação.

De acordo com o especialista brasileiro, a inclusão em listas vermelhas, até agora, não resultou na maior proteção de sapos, rãs e pererecas no país. Novas áreas de proteção não foram criadas na Mata Atlântica apesar do rápido declínio de espécies alardeado pela UICN, e em poucos casos o financiamento de pesquisas é designado ao estudo de animais ameaçados. Um desses casos é o de Cínthia Brasileiro, pesquisadora da Unicamp, que obteve financiamento pela Fundação Biodiversitas para seu estudo da perereca-de-alcatrazes (Scinax alcatraz), que só existe na ilha de Alcatrazes e corre risco de extinção.

Leia mais:
-
Comentário em inglês de Simon Stuart e colaboradores na última edição da Science.

- Disappearing Jewels: The Status of New World Amphibians. Relatório de grupo ligado à UICN sobre o estado de conservação dos anfíbios do novo mundo (em inglês)

Atualizado em 23/09/05
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