Atraso
na regulamentação gera protesto de cientistas e mobilização de
movimentos sociais
Os ministros de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende,
e da Agricultura, Roberto Rodrigues, se reuniram no final de julho
para tratar da articulação que fariam para a aprovação
do decreto de regulamentação da Lei de Biossegurança
(11.105/05) junto à ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil,
onde está parado o processo. Apesar de Rezende e Rodrigues
esperarem a regulamentação para antes da próxima
safra, em setembro, a assessoria da Casa Civil informa que não
há previsão para a aprovação. Enquanto
isso, cientistas ligados à biotecnologia protestam pelo
atraso e os movimentos sociais tentam sugerir alterações
na lei para que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
(CTNBio) seja impedida de promover a biotecnologia e atue apenas
em biossegurança.
Em
manifesto enviado à ministra Dilma Rousseff, movimentos
sociais ligados à Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos,
como a Federação de Órgãos para Assistência
Social e Educacional (Fase) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST), reivindicam que na elaboração do
decreto regulamentador da Lei de Biossegurança sejam definidas
regras que impeçam a CTNBio de agir como promotora da biotecnologia
e que o Ibama, a Anvisa e o Conselho Nacional de Biossegurança
não se pautem exclusivamente pelas decisões da CTNBio.
Eles reivindicam, ainda, transparência e divulgação
dos pareceres, das atas de reunião e dos votos de cada
membro da comissão e pedem que seja proibido que os integrantes
da CTNBio incluam especialistas que participem ou tenham participado
de projeto de desenvolvimento de organismos geneticamente modificados
(OGM), seja no meio acadêmico, em empresas públicas
ou privadas.
O
ponto central da regulamentação a ser elaborada
pela Casa Civil, e que está indefinido desde a aprovação
da Lei 11.505 em março deste ano, é justamente o
funcionamento da CTNBio. Em nota oficial emitida em maio, o coordenador
geral da CTNBio, Jairon do Nascimento, comunicou que as atividades
da comissão (reuniões mensais, emissão de
pareceres técnicos, análises de pleitos relacionados
com atividades envolvendo OGM entre outras) estariam suspensas
até a data da publicação do decreto regulamentador.
Enquanto isso, o artigo 6º da Lei 11.505 proíbe desde
março o plantio e a comercialização de OGM
e derivados sem o parecer técnico favorável da CTNBio.
Pesquisadores interessados nessa área de pesquisa protestam
pela demora na aprovação do decreto.
"A
lentidão com que se arrasta a regulamentação
da Lei nº 11.105 não permite a retomada da normalidade
dos setores acadêmico e produtivo, colocando o Brasil em
situação de grande instabilidade, que, a curto e
médio prazo, se refletirá em grande dependência
tecnológica e perda de competitividade, além, é
claro, de não permitir dar respostas aos graves problemas
de saúde da população brasileira, que, hoje,
vê na pesquisa com células-tronco a grande esperança
de melhor qualidade de vida", atacou a presidente da Associação
Nacional de Biossegurança (Anbio), Leila Oda, em artigo
publicado no Jornal da Ciência. A falta de regulamentação,
porém, não impede a pesquisa com células-tronco,
como sugere Oda, e afeta apenas o plantio e a comercialização
de organismos geneticamente modificados e seus derivados.
"Com
a aprovação da Lei de Biossegurança, passamos
a poder trabalhar com embriões humanos congelados há
mais de 3 anos, o que permite que possamos estabelecer as primeiras
linhagens de células-tronco embrionárias no Brasil.
Isto será importante para termos autonomia nas pesquisas
com estas células e não dependermos de grupos estrangeiros",
disse à ComCiência a geneticista Lygia Pereira,
do Instituto de Biociências da USP. "Como isso é
um fato recente, agora aguardamos pareceres do comitê de
ética em pesquisa com seres humanos para podermos iniciar
estes trabalhos. Mas a parte mais difícil, que era a lei,
está resolvida", completou.
Além
de os projetos envolvendo células-tronco embrionárias
terem que ser submetidos à apreciação e aprovação
dos comitês de ética de cada instituição
de pesquisa, a Lei 11.105/05 também estipula a obrigatoriedade
do consentimento dos genitores dos embriões, que têm
de ser considerados inviáveis para fertilização
in vitro. A lei proíbe a comercialização
de células-tronco embrionárias e a considera crime
do mesmo tipo do previsto no artigo 15 da Lei 9.434/97, que proíbe
a compra ou venda de tecidos, órgãos ou partes do
corpo humano, e prevê multa e pena de reclusão de
três a oito anos.