Europa
enfrenta crise na academia e
quer mais cientistas da própria UE
O mito de que a fuga de cérebros é um problema apenas
dos países em desenvolvimento foi quebrado após
a conferência de Jean-Patrick Connerade, presidente da Euroscience
(associação formada por cientistas de 29 países
da Europa), durante a 57ª reunião anual da SBPC. Para
ele, a União Européia (UE) sofre com a evasão
de cientistas para outros países, principalmente para os
Estados Unidos, que já reúnem 400 mil pesquisadores
vindos dos países europeus. Connerade, que também
é professor de física da Universidade de Londres,
enfatizou a necessidade de medidas para "segurar" os
pesquisadores na Europa e ainda atrair mais jovens para a academia.
Connerade
acredita que uma das ações para atrair pesquisadores
é a criação de um "código de
recrutamento" que torne a Europa atrativa para os jovens
europeus e facilite a migração de cientistas dentro
da própria Europa. Para ele, os baixos valores das bolsas
e o futuro incerto dos cientistas são fatores que afastam
os jovens do meio acadêmico. "Os pesquisadores são
considerados estudantes. É preciso quebrar esse paradigma
e tratá-los como profissionais", afirma Connerade.
"Somos poucos pesquisadores e se não fizermos nada
para mudar essa situação, seremos menos ainda",
completa.
O
que Connerade considera "poucos" é um número
muito maior que o que compõe a comunidade científica
no Brasil. Enquanto a média de cientistas da Europa é
de 2,5 cientistas por mil habitantes, a média brasileira
não chega a 1 cientista por mil habitantes. A Suécia
mantém a maior média européia, com 5 cientistas
por mil habitantes.
Outro
desafio no sentido de recrutar os jovens - e uma das metas mais
difíceis - é aumentar o investimento do produto
interno bruto (PIB) europeu em C&T para 3%, esperando-se que
2% desse total seja investido pelo setor privado. A medida parece
eficaz quando vista a partir da experiência da Suécia
- que tem 5 cientistas por mil habitantes - e que investiu, em
2003, mais de 4% de seu PIB em C&T. No Brasil, o investimento
em ciência e tecnologia gira em torno de 1% do PIB nacional
e os esforços são para que se atinja os 2%.
Sobre
a participação do setor privado, Connerade enfatiza
que as universidades deveriam se concentrar no desenvolvimento
de pesquisa básica, deixando a pesquisa aplicada por conta
do setor privado, diferente do que acontece atualmente na maior
parte do mundo.
A
situação crítica da academia da Europa foi
reforçada por Rémy Lestienne, membro da Euroscience
e adido de C&T da Embaixada da França no Brasil. Lestienne
lamentou que a França esteja enfrentando um período
de insuficiência da pesquisa industrial e de redução
do orçamento para a pesquisa nas universidades e nos institutos
públicos. Por conta disso, no ano passado emergiu o movimento
salvemos a pesquisa". Uma de suas ações foi
a demissão coletiva dos diretores de laboratórios
públicos franceses em março de 2004. "É
preciso que a comunidade científica se movimente e lute
por melhores condições", disse Lestienne. O
movimento francês resultou na criação da Agência
Nacional de Pesquisa, além da promessa de investimento
de 1 bilhão de euros em C&T nos próximos 3 anos.
Jean-Patrick
Connerade e Rémy Lestienne participaram da conferência
Modelos europeus de governança de ciência e tecnologia,
que aconteceu no último dia 19.