Estudo
mostra que batalha entre software livre
e proprietário está
só começando
O resultado da pesquisa Impacto do Software Livre e de Código Aberto
(SL/CA) na Indústria de Software do Brasil, apresentada no auditório
do Ministério da Ciência e Tecnologia, em Brasília, no último
dia 27, confirmou o que já se suspeitava: o embate entre o software livre
e software proprietário vai ser uma briga das boas, e está apenas
começando. O estudo - o maior do gênero já realizado em todo
o mundo - reuniu a Associação para Promoção da Excelência
do Software Brasileiro (Softex) e o Departamento de Política Científica
e Tecnológica da Unicamp (DPCT) da Unicamp. O objetivo foi levantar as
formas de organização, técnica e econômica, do modelo
software livre e de código aberto no Brasil - um modelo que desperta o
interesse de empresas e usuários individuais e desponta como um negócio
das grandes corporações multinacionais.
O
estudo, apresentado pelo coordenador geral da Softex Giancarlo Stefanuto, e pelo
coordenador científico, Sergio Salles Filho do DPCT, mostra que o software
livre não representa uma ruptura tecnológica, e sim de uma quebra
dos modelos tradicionais de propriedade intelectual e aprendizagem tecnológica,
uma nova forma de desenvolver e licenciar softwares. Além disso, o trabalho
desfez alguns mitos que circulam a respeito do perfil das pessoas e empresas atuantes
em software livre. Ao contrário do que se pensa, não se trata de
garotos hakers tentando contestar o monopólio de grandes corporações
multinacionais. Os chamados "desenvolvedores individuais" agem por razões
de capacitação (aprendizado) e de empregabilidade (efeito vitrine)
e são as empresas e os usuários comuns, com necessidades específicas,
que se mobilizam nessa área, impulsionados por questões técnicas
(maior flexibilidade, qualidade esegurança) e econômicas (redução
de custos).
"O
principal impacto do SL/CA está em segmentos nos quais a propriedade do
código é crucial e que apresentam baixa especificidade de uso",
diz Ana Maria Carneiro, pesquisadora da Softex. Ou seja, produtos de amplo mercado,
como sistemas operacionais, bancos de dados e componentes genéricos são
justamente aqueles cujos modelos de negócios são mais afetados.
De outro lado, as oportunidades abertas pelo SL/CA são efetivas para quem
lida com serviços (de baixo ou alto valor) e software embarcado. "Na
verdade, os embarcados, por sua alta especificidade e baixos requisitos de apropriabilidade
(manutenção do código fonte fechado) são uma das maiores
oportunidades para empresas nacionais e também para estrangeiras",
conclui Carneiro.
Sem
fazer apologia do SL/CA, a pesquisa aponta ameaças e também oportunidades,
lançando luzes sobre a discussão que diz respeito a um mercado de
softwares, onde o Brasil ocupa o sétimo lugar no ranking mundial, com vendas
que chegaram em 2001 a U$7,7 bilhões. Segundo a pesquisa, "software
livre é hoje um negócio de alguns bilhões de dólares.
Mesmo organizações que surgiram na onda libertária provocada
pelo Linux, hoje, transformaram-se em grandes empresas, com atuação
global".
Software
livre e obrigatório
Um passo ousado e polêmico, que irá
acirrar a briga com a Microsoft, foi dado recentemente, através do decreto,
que tramita na Casa Civil obrigando os órgãos do governo brasileiro
a adotarem softwares livres - como o Linux - na administração pública,
se bem o Palácio do Planalto opere na Plataforma Windows 2000, e a maioria
dos ministérios ainda use versões de Windows. Quebra de um paradigma?
De jeito nenhum. Basta dizer que nos Estados Unidos, pátria de Bill Gates,
os principais órgãos públicos operam com softwares livres,
inclusive a Casa Branca, o local de trabalho do presidente George W. Bush.
Ninguém
dúvida, e a Pesquisa mostrou isso, que o governo é um setor de aplicação
preferencial na adoção e difusão de SL/CA, seguido da área
de saúde e da educação. Outra área promissora são
as Tecnologias de Informação e Comunicação: a Agência
Reuters e o Google rodam Linux; oito em cada dez servidores de mensagens eletrônicas
rodam o software livre BIND; até a National Security Agency, certamente
o negócio mais secreto do mundo, trabalha com programas abertos. Exemplos
não faltam para alimentar a polêmica.
De
acordo com o relatório, "o SL/CA, ao nascer de uma contestação
aos mercados proprietários mais poderosos da indústria (Unix, Windows,
Office), revelou todo seu apelo político, institucional e emocional".
Esse apelo chamou a atenção dos que viam uma oportunidade de derrubar
o maior e mais conhecido Golias da indústria de software. Nunca na história
do capitalismo o mercado suportou por tanto tempo e de maneira tão ampla
o pagamento de uma taxa de monopólio (virtual) a uma única empresa
(Microsoft).
Stefanuto,
da Softex, considera o relatório um marco. "Temos trabalhado para
construir uma base de capacidades e, conseqüentemente, de resultados que
possam ser úteis ao governo, às empresas e à sociedade brasileira",
finaliza.
Entenda
o software livre
Softwares são linhas de programação,
que instruem o hardware sobre a maneira como ele deve executar uma tarefa. Cada
programa tem o seu código-fonte. No software proprietário, esse
código é fechado para o usuário. Isso quer dizer que o programa
não pode ser "editado". Já o código-fonte de um
software livre pode ser alterado, inspecionado publicamente, e, portanto, exposto
a severas avaliações, permitindo assim uma correção
rápida das falhas e um aumento da eficiência e da segurança. Outra
característica interessante dos softwares de código aberto é
a possibilidade de se fazer modificações de acordo com as necessidades
individuais de cada usuário, gerando versões personalizadas, capazes
de atender perfeitamente demandas específicas. Isso explica o fato de muitas
pessoas e empresas colaborarem para a criação de um software próprio,
uma conquista dificílima de alcançar individualmente, seja pela
complexidade, seja pelo custo. A economia de escala e de escopo é outro
fator que torna essa forma de organização extremamente interessante. |
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