Modelos
em gesso otimizam o estudo de biologia para deficientes visuais
Mitocôndria,
retículo endoplasmático, complexo de Golgi e membrana em estrutura
de sanduíche são algumas das estruturas celulares que muitos já
ouviram falar, outros lembram de seus formatos e alguns ainda conseguem descrever
suas funções. Aprender as inúmeras funções
e nomenclaturas da biologia com auxílio de desenhos, fotos e esquemas,
pode ser ainda mais complicado quando não se pode enxergar. Mas a partir
do segundo semestre, estudantes de biologia com deficiência visual contarão
com modelos de gesso que lhes proporcionarão uma outra percepção
das mesmas estruturas, na forma tridimensional. Ao todo são 70 modelos
sobre morfologia (citologia, anatomia, histologia e embriologia) desenvolvidos
pela equipe de Maria das Graças Ribeiro, da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG). Em julho serão lançados kits compostos pelas peças,
manual com orientação teórica, descrição das
peças e sugestões de uso, além de um CD que funcionará
como uma espécie de guia para que os usuários possam melhor usufruir
da atividade.
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Deficientes
visuais, auxiliados por monitora, examinampeças sobre estrutrura celular.
Foto: Foca Lisboa |
As
peças foram patenteadas pela UFMG com a preocupação de disponibilizá-las
para outras instituições. Segundo Ribeiro, o material despertou
o interesse de profissionais estrangeiros durante a Expo Interativa - feira de
museus e centros de ciência que ocorreu no mês de abril no Rio de
Janeiro – que ficaram surpresos com a alta qualidade técnica e científica.
O elogio não vem por acaso. Os modelos foram projetados por uma equipe
composta por quatro fisioterapeutas, uma artista plástica e uma equipe
de professores universitários, do ensino médio e fundamental.
Entre
as peças de gesso encontram-se vários órgãos da anatomia
humana, a estrutura celular, as várias fases de desenvolvimento de um embrião
e também de uma célula em divisão, um espermatozóide
fecundando o ovário.Depois de prontas, as peças passaram por quatro
fases de avaliação das quais participaram mais de cem deficientes
visuais, a Superintendência de Ensino da Secretaria de Estado da Educação,
mais de dois mil alunos dos ensinos público e privado de Belo Horizonte
(MG), além de professores de diversas instituições, que verificaram
sua eficiência no aprendizado de crianças e jovens.
O
projeto chamado A célula ao alcance da mão compõe
o acervo do Museu
de Ciências Morfológicas do ICB e foi iniciado em 1989, a partir
de uma demanda do aluno Luiz Edmundo, deficiente visual e hoje fisioterapeuta
do Hospital das Clínicas da UFMG, que fazia a disciplina de citologia do
curso de fisioterapia da UFMG. Ribeiro, responsável pelo ensino, buscou
materiais didáticos para complementar o ensino do estudante, sem sucesso,
e decidiu investir na criação do que foi o primórdio da Coleção
Didática de morfologia hoje disponível. "Materiais didáticos
especialmente voltados para deficientes visuais ainda são escassos”,
lamenta Ribeiro. De acordo com ela, a justificativa dada pelas editoras e fabricantes
de materiais didáticos quando procuradas naquela época, era de que
o público era restrito e economicamente inviável. “Acredito
que em 3 ou 5 anos teremos mais materiais disponíveis, pois hoje existem
vários projetos em andamento e o governo federal tem liberado mais recursos
e incentivado a confecção de materiais deste tipo”, conclui.
Atualmente,
a maior parte dos materiais didáticos para deficientes visuais é
formada por textos em braile ou áudio. Muito pouco ainda foi desenvolvido
para otimizar o aprendizado de ciências, como é o caso dos modelos
de biologia e de esforços do Instituto Benjamin Constant, do Rio de Janeiro.
A instituição possui alguns objetos tridimensionais, geralmente
criados por seus professores, voltados principalmente para a matemática
e geografia, e outros para a física e a química.
O
aprendizado da biologia, por exemplo, é fundamentalmente feito com o auxílio
de materiais visuais bidimensionais como desenhos ou fotografias em livros, ou
seja, até para os alunos que possuem visão precisam de um pouco
de imaginação para mergulhar no mundo microscópio das células
ou no interior dos órgãos do corpo humano. Isso quer dizer que o
material patenteado da UFMG será de grande valia não apenas para
os cegos, justificando a presença de cores nos modelos de gesso que terão
seu uso expandido.
A
partir do próximo semestre, a Coleção Didática será
disponibilizada para escolas, museus e centros de ciência e cultura. Embora
ainda os kits ainda não tenham um preço estimado, Maria das Graças
Ribeiro afirma que já recebeu mais de 300 pedidos no Brasil. “Queremos
sensibilizar as empresas para que façam doações do material
para escolas carentes”, explica a coordenadora do projeto. Todos os modelos
comercializados são coloridos, justamente para atender a todos os estudantes
de biologia e não apenas os com deficiência visual. Esta empreitada
recebeu o apoio do Ministério da Ciência e Tecnologia.